A melhor notícia das eleições é o enterro da era Sarney no Maranhão

Atualizado em 4 de novembro de 2014 às 12:53
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Se há uma grande, alvissareira notícia nestas eleições é o enterro simbólico de José Sarney e sua turma no Maranhão. Flávio Dino, do PC do B, teve 63,54% dos votos, contra 33,68% do sarneyzista Lobão Filho, do PMDB.

Em 48 anos de comando do clã no MA, seu legado é uma tragédia: o menor IDH do Brasil, miséria, taxa de analfabetismo em torno de 40% e uma rebelião num complexo penitenciário que caberia num filme B de terror.

Houve um governador de oposição desde 1966. Foi Jackson Lago, eleito em 2006. Em 2009, seu mandato foi cassado pelo TSE para Roseana Sarney assumir.

Nestas cinco décadas, a família deu o próprio nome e o de aliados a tudo: municípios, escolas, pontes, rodovias, fóruns, avenidas, hospitais, viadutos. Como gafanhotos, deixaram o estado à míngua. (Recentemente, um amigo pegou um Land Rover para fazer uma viagem pelo interior do Nordeste. No Maranhão, contou que crianças levantavam um cartaz escrito “fome” na beira da estrada).

Lobão Filho chegou a deblaterar que tinha “195 prefeitos dos 217”, o dobro de tempo de televisão e que era “muito mais preparado”. Com tudo isso, foi derrotado principalmente pelos defeitos do velho padrinho.

Não houve economia de golpes baixos. Em seu jornal, José Sarney escreveu que Dino “insultava e vilipendiava” o Maranhão. “Tudo hipocrisia e desejo de que sejamos Venezuela. O Maranhão comunista é a mudança que desejam”, apelou.

Também apareceu um vídeo em que um detento do presídio de Pedrinhas acusava Dino de ser mandante de um assalto. O assaltante confirmaria, mais tarde, que recebera uma promessa de ganhar dinheiro e proteção em troca da armação.

Flávio Dino é advogado e professor e atuou no movimento estudantil. Tem 46 anos. Em 2010, havia perdido o governo para Roseana Sarney. É o primeiro governador eleito pelo PC do B. Após o resultado, declarou que sua vitória é “grandiosa pelos que aqui não estão, como quilombolas, quebradoras de coco, jovens, conselheiros tutelares, pelas pessoas que vi no Maranhão sem ter o que calçar, sem ter o que comer, em casas de taipas”.

É um eco de um discurso parecido. Em 1966, Glauber Rocha filmou o jovem José Sarney num comício. Sarney acabara de se eleger para o governo combatendo os coroneis. “O Maranhão não quer a miséria, a fome, o analfabetismo e as mais altas taxas de moralidade infantil, de tuberculose, de malária”, gritava, já com o bigodão insofismável.

De certa forma, ele foi um visionário: descreveu ali as condições de sua terra com meio século de antecipação, devastada por ele mesmo.

Flávio Dino não fará milagre, mas o fato de ter começado a enterrar um câncer que destrói o Maranhão desde os anos 60 é um bom começo.