“A oposição não deveria apostar no ‘quanto pior, melhor'”, diz senadora que saiu do PSDB

Atualizado em 20 de junho de 2015 às 10:38
Lúcia Vânia, ex-PSDB
Lúcia Vânia, ex-PSDB

Publicado na RBA.

 

A senadora Lúcia Vânia (GO) não é mais do PSDB. Na quarta-feira (17) ela discursou no Senado e afirmou que deixa a legenda porque não acredita “em uma oposição movida a ódio”. Identificada com setores históricos do partido, principalmente com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em cujo governo foi titular da Secretaria Nacional de Assistência Social, ela disse, em entrevista à RBA, que votou a favor do ajuste fiscal proposto pelo governo Dilma Rousseff.

“Ficou uma situação muito difícil, porque toda a vida a gente votou favoravelmente à Lei de Responsabilidade Fiscal, a gente sempre entendeu que não adianta ficar apostando no quanto pior, melhor”, afirma.

Segundo ela, no PSDB atual, “se você adota uma postura mais sensata, é tida como uma pessoa que está traindo o partido, que não está respondendo o que a sociedade quer, e eu não vou me submeter a isso”.

A senadora ainda não decidiu para qual partido irá. Embora prefira não citar nomes ou quais lideranças do PSDB entende representarem a ala “movida a ódio”, Lúcia Vânia diz que “quem acompanha o Congresso percebe perfeitamente pessoas que ficam apostando no impasse”. Para ela, “a sociedade está se tornando extremamente agressiva” e cabe às lideranças trabalharem para evitar a radicalização. “Acho que cabe a um líder saber separar as coisas. Saber dar uma mensagem em que você apazigue a sociedade, e não que você radicalize ela.”

A sra. está deixando o PSDB e fez um discurso em que afirma não acreditar em uma oposição movida a ódio. Como identifica esse ódio dentro do partido?

O PSDB é uma parte. Eu falei uma parte da oposição. Não é todo o PSDB. O que eu sinto é o seguinte: na votação do ajuste, ficou uma situação muito difícil, porque toda a vida a gente votou favoravelmente à Lei de Responsabilidade Fiscal. A gente sempre entendeu que não adianta ficar apostando no “quanto pior, melhor”, e arrastando esse problema que a gente está enfrentando. Já fiz isso quando da votação do ajuste. Fiz um discurso também mostrando que não é que eu estava votando com o governo, eu estava votando pelo país, porque, na verdade, não adianta ficar nessa coisa de impeachment, não tendo o amparo legal para buscar o impeachment, e fazendo o povo sangrar. Na verdade, a inflação aumenta, as demissões vêm, e a gente não acha uma alternativa.

A sra. votou pelo ajuste fiscal, então?

Sim, votei pelo ajuste. Porque era aquela dúvida, o PSDB fica assim: se votar pelo ajuste, está votando com o governo. Então, foi uma situação extremamente desconfortável porque não acredito naquele embate que se travou depois da eleição, PT x PSDB. Parte do PSDB está utilizando o mesmo instrumento que o PT usou contra nós.

A sra. poderia identificar quem representa essa parcela do PSDB?

Não gostaria de ficar nominando pessoas, uma vez que eu procurei, no meu discurso, não nominar ninguém. Quem acompanha o Congresso percebe perfeitamente pessoas que ficam apostando nesse impasse, e esse impasse não chega, porque não tem amparo legal, e eu sou de um estado que sofre muito com essas coisas. É um estado que precisa de investimento, é um estado que precisa de desenvolvimento, porque nós estamos em uma fase difícil. Não é só o estado de Goiás. Todos os estados estão em uma fase difícil. E a sociedade, na minha visão, está se tornando extremamente agressiva e, se nós, no Parlamento, não achamos alternativas, a sociedade vai ficando nessa situação, e a gente vai dando lugar para essas pessoas radicais assumirem posições de poder. O que a sociedade hoje quer é o pior. Como a gente não tem instrumento para botar um fim nisso, a gente tem que buscar, pelo menos, resolver.

O PSDB hoje parece dividido, para 2018, entre uma postura mais conciliadora do governador paulista, Geraldo Alckmin, e outra mais radical do senador Aécio Neves. A sra. acha que o partido caminharia para qual dessas duas vertentes hoje?

A oposição, – pode ser que eu esteja equivocada –, mas, na minha visão, vai ter lugar aquela pessoa que for capaz de liderar um movimento de recuperação do país. Acho que é essa a liderança que precisa neste momento.

Mas parece que quem está fazendo um discurso mais radical e do ódio, como a sra. diz, é Aécio Neves. Alckmin tem tido até um relacionamento polido com a presidenta Dilma..

Eu acho que a posição do Aécio é uma posição muito de uma pessoa que disputou a eleição num processo muito radical. Talvez, não seja do perfil dele ser radical. Acho que há ali todo um envolvimento, talvez até mesmo uma cobrança, para que ele seja mais radical. Agora, só acho que nós temos que ter um entendimento de que essa cobrança não nos leva a nada. Essa cobrança da sociedade, de radicalizar. De parte da sociedade. As pessoas que são mais participativas, mais atuantes, querem uma radicalização. Então, acho que cabe a um líder saber separar as coisas. Saber dar uma mensagem em que você apazigue a sociedade, e não que você radicalize ela. Nós não queremos transformar o país em uma Venezuela.

A sra. teria mais tendência a apoiar uma postura mais próxima do Alckmin, na medida em que ele é mais conciliador, então?

Na verdade, eu venho do governo Fernando Henrique. Eu fui secretária nacional no governo dele, com todo um trabalho na área social. Então, e até coloco isso no meu discurso, é natural que eu me ressinta, dentro do partido, dessa situação.

A sra. é uma pessoa mais ligada ao PSDB histórico, social-democrata, do que de um partido descompromissado com esse passado…

Eu sou mais ligada às pessoas que ajudaram a fundar o partido. Estava no partido havia mais de 20 anos. Eu tenho uma ligação maior com as pessoas que estiveram desde o início, que participaram do governo Fernando Henrique. Tenho uma grande identificação com o José Serra, ajudei a coordenar a campanha do Alckmin. Então, naturalmente eu tenho uma identificação grande com esse segmento. Tenho uma identificação enorme com o presidente Fernando Henrique, tanto que a minha saída, para mim, foi muito dolorida, está sendo muito dolorida, e dura.

A sra. já sabe para que partido vai?

Eu vou para um partido de oposição ao governo, mas eu quero escolher um partido que me dê liberdade de opinar ou, pelo menos, de colocar o meu pensamento. Estava muito difícil. Está muito difícil dentro do PSDB, do jeito que está, porque, se você adota uma postura mais sensata, é tida como uma pessoa que está traindo o partido, que não está respondendo o que a sociedade quer, e eu não vou me submeter a isso, porque isso me violenta. Eu vejo o sofrimento das pessoas, eu trabalho na área social, e sei que nós não temos o direito de ficar prologando isso. Nós temos que achar uma alternativa para sair, o mais rápido possível, dessa situação.