A Veja “estimula o reacionarismo ressentido, paranoico e feroz”

Atualizado em 10 de novembro de 2014 às 15:45
Sílvia (esq) e a revista para a qual não quis falar
Sílvia (esq) e a revista para a qual não quis falar

Algum tempo atrás, meu amigo Sérgio Berezovski, então diretor da 4 Rodas, me contou uma história.

A revista procurara o jornalista Flávio Gomes para ouvi-lo numa determinada reportagem.

Flávio, polidamente, avisou que não falaria com uma empresa cujo carro-chefe é a Veja. Deixou claro não ter nada, especificamente, contra a 4 Rodas.

Nesta semana, um episódio da mesma natureza – mas que ganhou ampla repercussão na internet – mostrou a deterioração da imagem da Veja como uma publicação séria.

A socióloga Sílvia Viana, procurada para uma reportagem sobre o BBB 14, produziu uma resposta que a posteridade vai poder usar como medida do repúdio despertado pela Veja depois que se transformou num panfleto de baixo jornalismo, nos últimos dez anos.

Disse Sílvia a quem pedira a entrevista:

“Respondo seu e-mail pelo respeito que tenho por sua profissão, bem como pela compreensão das condições precárias às quais o trabalho do jornalista está submetido. Contudo, considero a ‘Veja’ uma revista muito mais que tendenciosa, considero-a torpe. Trata-se de uma publicação que estimula o reacionarismo ressentido, paranoico e feroz que temos visto se alastrar pela sociedade; uma revista que aplaude o estado de exceção permanente, cada vez mais escancarado em nossa “democracia”; uma revista que mente, distorce, inverte, omite, acusa, julga, condena e pune quem não compartilha de suas infâmias – e faz tudo isso descaradamente; por fim, uma revista que desestimula o próprio pensamento ao ignorar a argumentação, baseando suas suposições delirantes em meras ofensas.

Sendo assim, qualquer forma de participação nessa publicação significa a eliminação do debate (nesse caso, nem se poderia falar em empobrecimento do debate, pois na ‘Veja’ a linguagem nasce morta) – e isso ainda que a revista respeitasse a integridade das palavras de seus entrevistados e opositores, coisa que não faz, exceto quando tais palavras já tem a forma do vírus.

Dito isso, minha resposta é: Preferiria não.”

Clap, clap, clap. De pé.

Tal sentimento está amplamente espalhado pela sociedade. Descontados fanáticos conservadores, ou simplesmente analfabetos políticos cujos heróis são Diogo Mainardi ou Reinaldo Azevedo, a Veja é objeto de uma mistura de desprezo e ódio.

O mérito da resposta de Sílvia é expressar um sentimento comum a tantos e tantos brasileiros.

Em meus tempos de Abril, fazíamos às vezes um exercício. Se determinada revista fosse uma pessoa, qual seria?

A Veja, hoje, por esse sistema, seria uma mistura de Olavo de Carvalho e Marco Feliciano.

Olavo de Carvalho ocupou, por seus discípulos, a revista. E Marco Feliciano é alma gêmea de OC: conforme demos na seção Essencial, o pastor fez na Câmara dos Deputados, esta semana, uma defesa apaixonada do astrólogo que hoje é um ídolo dos reacionários do Brasil.

A Veja teria já problemas extraordinários de sobrevivência caso fizesse bom jornalismo. Revista, na era digital, é um objeto de obsolescência espectral.

São cada vez menos os leitores e os anunciantes.

Fazendo o que faz, uma panfletagem abjeta, a Veja apenas apressará sua marcha rumo ao cemitério. E deixará não memórias agradáveis, mas a sensação de alívio por o horror que ela representa ter enfim acabado.

Quem chorará a morte de uma revista que, para usar as palavras de Sílvia Viana, “mente, distorce, inverte, omite, acusa, julga, condena e pune quem não compartilha de suas infâmias”?