Ao invés da mesmice de todo ano, Roberto Carlos deveria dividir com o público a superação de sua deficiência. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 23 de dezembro de 2017 às 9:09
Roberto e Ísis Valverde em mais um especial de fim de ano

Na vida só há três certezas: a morte, os impostos e o especial de fim de ano de Roberto Carlos.

A Globo exibiu na noite desta sexta-feira (22) o 43º programa em que o rei faz tudo igual, alterando apenas perfumarias como o título.

Desta vez a coisa se chamava “Esse cara sou eu”. Em uma hora e meia de show, ele distribuiu aquele conforto às famílias que não têm nada melhor a fazer.

Para dar um ar de modernidade, recebe no palco alguns “jovens” artistas. Desta vez eram Tiago Iorc, Simone e Simaria e a compositora panamenha Erika Ender, uma das autoras do insuportável hit “Despacito”, que ganhou uma versão emprenhada de dormonid de RC.

Roberto, ídolo inconteste, vai morrer se repetindo e sem prestar o maior serviço que um senhor de idade, cuja fonte criativa já secou, poderia prestar: assumir sua deficiência.

Aos 6 anos, perdeu parte da perna direita, abaixo do joelho, num acidente de trem em Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo.

Ele contou a história na linda “O Divã”, de 1972: “Relembro bem a festa, o apito/E na multidão, um grito”. O refrão é dolorido: “Essas recordações me matam”.

Desde então, calou-se e fez o possível para esconder sua condição. Em 2013, no meio da polêmica sobre a censura à sua excelente biografia, falou à Globo que ia narrar o caso em um livro que nunca viu a luz do dia.

“Ninguém pode contar melhor sobre esse episódio do que eu”, alegou. “Isso aí só eu sei”.

Roberto vive com esse segredo de polichinelo no armário. Seus assessores, medrosos e puxa sacos, têm que fingir que isso não existe.

Assumir a amputação e mostrar como ele a superou (ao menos fisicamente): eis a grandiosidade e a surpresa que Roberto teria a oferecer hoje a seu público. Essa atitude faria diferença e o colocaria numa agenda da modernidade.

Mas ele prefere dar a seus velhos fãs, a cada dezembro, 90 minutos de tédio, mediocridade e mesmice.