As lições do guru do novo protesto pacífico

Atualizado em 18 de junho de 2013 às 14:53

Gene Sharp tem muito a dizer aos manifestantes sobre como lidar com uma força maior do que a sua.

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Alguns meses atrás, fui surpreendido com uma experiência de vida inédita. Meu filho, de 7 anos de idade, estava sofrendo bullying na escola. A primeira reação foi de espanto em saber que este tipo de coisa está começando cada vez mais cedo. A segunda reação foi de raiva, de vontade de vingar o meu filho. O desejo que começava a nascer era o do revide. Algo como: “Filho, feche a mão, mire o nariz do cara e dê-lhe um soco com toda a sua força”. Embora minha atitude, depois de alguns dias de reflexão, não tenho sido esta, entendi com mais exatidão o sentimento que brota de injustiças que nos afetam diretamente.

Cá entre nós, de injustiças nós brasileiros entendemos muito bem. Os levantes que agora surgem são que o resultado dos nós nas gargantas e dos embrulhos nos estômagos que todo brasileiro sente (uns mais que outros).

Há algum tempo tive acesso ao trabalho de Gene Sharp através do livro “Da Ditadura à Democracia – Uma Estrutura Conceitual para a Libertação”. Gene Sharp é fundador do Instituto Albert Einstein, uma organização não governamental que se dedica ao estudo e a divulgação de ações não violentas de combate a regimes totalitários. Seus pensamentos e ensinamentos têm sido utilizados em quase todo o mundo por movimentos revolucionários democráticos, incluindo todos aqueles ligados a primavera árabe.

Usado quase como uma bíblia ou manual de conduta, o livro de Sharp traz 198 métodos de ação não violenta, de discursos públicos a orações e de declarações públicas a simulacros de funerais.

Gene Sharp estudou com cuidado e detalhes todas as principais pessoas e ações mundiais e históricas onde a não violência organizada conseguiu de forma brilhante os objetivos que perseguiam na destruição das ditaduras. Entre elas Mandela, Luther King e Gandhi.

Diz ele: “Uma das minhas grandes preocupações por muitos anos, foi como as pessoas podem evitar e destruir ditaduras. Isso foi alimentado, em parte devido à crença que os seres humanos não devem ser dominados e destruídos por tais regimes. Essa crença foi reforçada por leituras sobre a importância da liberdade humana, sobre a natureza das ditaduras (desde Aristóteles até analistas do totalitarismo), e as histórias de ditaduras (especialmente os sistemas nazista e stalinista)”.

O que mais me chamou a atenção no trabalho de Sharp foi a demonstração de coragem (acima do normal) que pessoas assumiram para lutar contra as tiranias. De fora, temos a impressão de que é necessária muita coragem para enfrentar policiais e soldados, atirando pedras, resistindo a gases e cachorros, pontapés e sprays de pimenta, mas Sharp mostra que coragem maior vem daqueles dispostos a vencer pela não violência.

Segundo Sharp, a violência não é a melhor alternativa por vários motivos, mas o maior deles é que o seu inimigo sabe melhor que você como utilizá-la:

“Independentemente do mérito da opção de violência, no entanto, uma coisa é certa. Ao depositar a confiança nos meios violentos, escolhe-se exatamente o tipo de luta em que os opressores, quase sempre têm a superioridade. Os ditadores estão equipados para aplicar violência esmagadora. Não importa quão longa ou brevemente esses democratas possam continuar, eventualmente, as duras realidades militares tornam-se inevitáveis. Os ditadores têm quase sempre superioridade em equipamento militar, munições, transportes, e tamanho das forças militares. Apesar da bravura, os democratas não são (quase sempre) páreo para eles.”

Optar pela violência é como abandonar nossos valores e nos rendermos ao lado negro da força. Não é fácil se manter íntegro quando tudo à sua volta demonstra o contrário. Luther King e Gandhi também tiveram desertores em suas causas, aqueles que preferiram o combate, a luta armada, o revide ao invés de optar pelos atos não violentos. Contudo, o que a história nos mostra é que só aqueles que se mantiveram íntegros e corajosos é que alcançaram a vitória. Dos soldados armados, mesmo que com objetivos justos, não ouvimos falar, eles foram derrotados.

Então, qual a melhor saída? Sem dúvida, petições online e ativismos virtuais por si só não conseguirão resultados efetivos. É necessário, sim, sair às ruas, empunhar bandeiras e mudar estilos de vida. Organização e planejamento para ações nacionais e coordenadas. Pensadores, artistas e religiosos unidos em propósitos específicos e acima de tudo os métodos corretos do lado da verdade e da honestidade.

Depois que a sede de vingança passa, o conselho se transforma: “Filho, você precisa ser mais corajoso que eles. Resista, mas não revide. O final vai mostrar quem ganhou. Se você nunca desistir, você nunca vai perder”.

É urgente a ação e disso não temos dúvidas, mas o sucesso depende da forma. Do contrário, nos transformamos naquilo que mais odiamos e terminamos por lutar contra nós mesmos.

Gene Sharp
Gene Sharp