“Como em 64, Temer tenta emplacar a ideia de legitimidade democrática”, diz o brasilianista James Green. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 20 de junho de 2016 às 19:09
James Green
James Green

 

O brasilianista James Green vê um paralelo entre o golpe de 1964 e o de 2016. Mais de um, na verdade.

Green não está saltando de para quedas na bagunça nacional. Foi professor da Universidade do Estado da Califórnia e hoje leciona história da América Latina na Universidade Brown, em Rhode Island.

Nos anos 70 e início dos 80, trabalhou no Brasil dando aulas de inglês. Acabou se engajando também na militância LGBT. Escreveu dois livros sobre a ditadura militar e “Além do Carnaval: a homossexualidade masculina no Brasil do século XX”.

Participou do relatório final da Comissão Nacional da Verdade e está terminando uma biografia do guerrilheiro Herbert Daniel, último exilado a ser anistiado, morto em 1992 de complicações decorrentes da AIDS.

Na semana passada, esteve com Dilma num almoço em Campinas na casa do físico Rogério Cézar de Cerqueira Leite. “Ela tinha muito carinho por Daniel, com quem militou na clandestinidade”, afirma.

James Green falou ao programa do DCM na TVT sobre a batalha inglória da gestão temerista em busca de emplacar no exterior a tese de legitimidade democrática, tal como os militares o fizeram.

“A gente sabe que os Estados Unidos vão ficar contentes com esse governo por causa do programa neoliberal que será ser implantado”, disse.

“Formalmente, Obama tomou uma posição neutra. Mas o representante interino dos EUA na OEA, Michael Fitzpatrick, declarou claramente que não era golpe, que era um processo democrático o impeachment. Quando vi isso, fiquei revoltado e escrevi uma carta aberta a ele, que circulou bastante”.

A narrativa que Temer e cúmplices querem fazer pegar, para Green, é a mesma de 64. Na época, “formalmente, houve um processo democrático, ou seja, João Goulart supostamente abandonou a presidência. Tudo certinho, pela Constituição. Na verdade, sabemos que Jango evitou uma guerra civil”.

“Ao longo dos anos, os militares vieram com esse discurso da legalidade para justificar sua presença”, lembra. “Só em 1966 vários senadores americanos resolveram questionar que tipo de regime havia aqui, ditadura ou democracia. Castelo Branco vai e publicamente diz: ‘O Brasil não é uma ditadura militar’. Foi manchete da Folha de S.Paulo”.

Para James Green, o interino está usando a mesma estratégia.

“Ele está querendo desvender a ideia de que é um golpe orientando os diplomatas e os cônsules no sentido de esclarecer que é um processo legítimo e democrático”.