Delcídio jogou a pá de cal na carreira do moralista Aécio Neves. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 16 de março de 2016 às 9:43
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O diabo está nos detalhes. Há um trecho da delação bomba de Delcídio do Amaral em que ele fala que a CPMI dos Correios foi feita “com base em dados maquiados”.

Relata que outros parlamentares sabiam da empulhação, entre eles Carlos Sampaio, o probo, e Aécio Neves. Acrescenta o petista: o tema foi tratado com o então governador Aécio em Minas Gerais. Após a reunião, Aécio “franqueou o avião do governo para que o declarante viajasse para o Rio de Janeiro”.

A viagem de Delcídio está na relação de vôos oficiais de Aécio entre 2003 e 2010. Ela foi obtida pelo DCM e utilizada em algumas matérias.

As aeronaves bancadas com o dinheiro do contribuinte mineiro foram emprestadas também para gente como Roberto Civita, Fernando Henrique Cardoso, José Dirceu, todas as lideranças do PSDB, e um certo Roberto Marinho (que Roberto Irineu Marinho, dono da Globo, declarou não ser ele num email enviado a nós por sua advogada).

A família inteira também passeou, inclusive o primo Quedo, acusado de comprar um juiz num caso de tráfico de drogas.

Em matéria de tráfico de influência, Aécio foi campeão. A delação de Delcídio e a lista de passeios de helicóptero e turboélice são pedaços do cipoal de interesses, alguns mais escusos que outros, que Aécio representou em sua vida pública.

 

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As revelações de Delcídio agravaram a crise no governo Dilma e no PT — mas deixaram a nu, definitivamente, a grande esperança branca da oposição, o incansável tribuno, o político que não aceitou a derrota desde outubro de 2014 e que desde então veio fazendo uma pregação moralista, barata, deletéria e demagógica.

O desespero vinha daí, então? Se levasse, Aécio poderia conter as investigações? Seu inconformismo com Dilma passa pelo fato de que ela nada fez para poupar o sujeito que foi metade do fenômeno “Lulécio”, quando dividiu os votos dos mineiros com Lula?

Não foi por falta de blindagem. O conluio em Furnas, descrito por Delcídio, é conhecido pelo menos desde 2006. Há duas semanas, o DCM lançou um documentário sobre o esquema de caixa 2 que quase foi abafado de todas as maneiras imagináveis.

Aécio conseguiu emplacar na Veja uma “reportagem” afirmando que a famosa lista era uma falsificação, alegação baseada num laudo encomendado.

O Jornal Nacional nunca deu a Furnas um décimo da atenção que dedica hoje a qualquer coisa relativa ao “sítio de Lula” e ao “triplex de Lula”. O esforço para desmoralizar o documento veio não só da imprensa, mas do Ministério Público e da Polícia Federal.

A Istoé, para ficar num exemplo recente, publicou apenas as partes relativas a Lula e Dilma em suas capas sobre Delcídio. Ocorre que ficou impossível segurar as denúncias, apesar de toda a boa vontade do pessoal. Os malfeitos de Aécio acabaram vazando pelo conjunto da obra. A internet quebrou o monopólio da informação.

O colega Delcídio atirou aos cães a carreira do bastião da moralidade. Confirmou a delação do doleiro Alberto Youssef, que também afirmara que Aécio recebia propina da estatal mineira.

Delcídio aponta que Dimas Toledo, ex-presidente da empresa, “operacionalizava pagamentos e um dos beneficiários dos valores ilícitos sem dúvida foi Aécio Neves”. Dimas possuiria “vínculo muito forte” com Aécio e sua indicação para o cargo teria partido do tucano, junto ao PP, durante a gestão de FHC.

Em 2005, Lula lhe teria perguntado sobre Dimas Toledo. “Eu assumi e o Janene [presidente do PP, já falecido] veio pedir pelo Dimas. Depois veio o Aécio e pediu por ele. Agora o PT, que era contra, está a favor. Pelo jeito ele está roubando muito”, contou Lula, segundo Delcídio.

Andrea Neves, irmã e braços direito e esquerdo de Aécio, era “uma das grandes mentoras intelectuais dele e estava por trás do governo”.

Declarou também que ouviu de José Janene que Aécio era “beneficiário de uma fundação sediada em um paraíso fiscal, da qual ele seria dono ou controlador de fato”. A sede seria em Liechtenstein, a operação financeira teria sido estruturada por um doleiro do Rio e tudo estaria no nome da mãe de Aécio ou do próprio.

A farsa de Aécio já tinha dado sinais de que tinha sido desmontada quando ele foi hostilizado nos protestos de 13 de março. A massa ignara que ajudou a insuflar com discursos raivosos sobre corrupção o rejeitou de maneira humilhante.

Não se sabe o que virá a ocorrer no Brasil a partir daqui. Temos um capítulo por dia. Mas Aécio Neves se transformou num elemento radiativo com o qual pouca gente vai querer contato. O sonho de 2018 foi para a lata do lixo.

Abaixo, o documentário do DCM sobre a Lista de Furnas.