E se a Veja der o tom no ensino nas escolas da Abril?

Atualizado em 14 de julho de 2013 às 10:55

A divisão de Educação da Abril tem um problema estratégico.

A família Civita na abertura da Abril Educação ao mercado de ações, em 2011
A família Civita na abertura da Abril Educação ao mercado de ações, em 2011

Um leitor do Diário recentemente fez o seguinte comentário: “Jamais deixaria um filho meu estudar numa escola da Abril.”

Ele lera a notícia de mais uma compra de escola pela Abril, num movimento estratégico vital para a empresa. Com os negócios minguando aceleradamente nas revistas que fizeram sua fortuna, a Abril desloca-se para a área de educação.

O ponto do leitor: ele não queria que seus filhos fossem alcançados pela visão de mundo da Veja – não apenas conservadora mas distorcida e frequentemente cínica.

Na preocupação do leitor está um ponto que pode acabar atrapalhando o futuro da Abril na educação. Não são poucos os pais que definitivamente não gostariam que seus filhos fossem ‘educados’ indiretamente pela Veja.

É compreensível.

Imagine que seu filho vá ter uma aula sobre os protestos, com vistas ao vestibular.

A Veja elegeu, como símbolo das manifestações, Maycon Freitas, um extremista que diz em sua página no Facebook que ‘bandido bom é bandido morto’ e que rejeita agressivamente qualquer coisa parecida com direitos humanos.

Freitas recebeu as Páginas Amarelas, e foi apresentado como a “voz que emergiu das ruas”.

Ele evidentemente tinha pegado carona na capacidade mobilizadora do MPL, mas segundo a Veja ele comandou multidões nos protestos do Rio.

Para ver a realidade, basta checar o que aconteceu quando o MPL saiu de cena e Freitas fez convocações frenéticas para uma “Marcha das Famílias contra o Comunismo”.

Compareceram 36 pessoas, segundo cálculos confiáveis.

Parece anedótico, mas que pai gostaria que seu filho corresse o risco de aprender a realidade dos protestos segundo a Veja?

Numa escola da Abril, esta é uma possibilidade real.

Lembremos que até alguns anos atrás, antes de girar freneticamente para a direita, a Veja era uma leitura quase obrigatória para jovens interessados em atualidades para as provas de vestibular.

O mundo paralelo da Veja está no papel e na internet.

Também a respeito dos protestos, o site publicou textos que poucos pais gostariam que chegassem às crianças.

Dois deles merecem destaque.

Num, o professor Marco Antônio Villa dizia que os garotos do MPL eram “sociologicamente irrelevantes”. Num artigo com 16 pontos sobre os protestos, então em seu início, Villa errou simplesmente todos.

Mesmo assim, ele permanece errando no site da Veja – e nos programas da Globonews — sem que isso pareça trazer qualquer problema para ele, num caso notável de impunidade por razões ideológicas.

Num outro texto do site da Veja, o ex-publicitário Neil Ferreira conclamava a polícia a “passar fogo” nos manifestantes. Terror se combate com terror, escreveu Neil.

A força da Veja na Abril é enorme. Não é fantasiosa, assim, a hipótese de que o conteúdo da revista acabe contaminando o ensino nas escolas da Abril.

Imagine que Reinaldo Azevedo seja convidado a falar sobre política. Ou que algum de seus livros seja recomendado aos alunos.

(O site da Veja mereceria um teste da nova geração dos Civitas, aliás: o envio — mediante um pseudônimo, claro –de um comentário que não bata com a opinião dos blogueiros.  Não apenas são censurados como o autor é instado a ir para a ‘esgotosfera’. Isso mesmo quando o comentário é civilizado e não comete senão o pecado de não dizer amém.)

Estrategicamente, a Abril tem um problema em sua divisão de educação, dada a imagem fortemente negativa da Veja.

Ou a casa trabalha intensamente para melhorar essa imagem, e para isso é necessário um jornalismo na Veja que impeça absurdos como a transformação de fanfarrões como Maycon Freitas em heróis, ou as ambições na área da educação dificilmente serão preenchidas.

Talvez este problema já tenha sido captado na Abril.

Se não foi, é porque as coisas estão realmente complicadas.