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Dilma: “O Angorá tem bronca de mim porque não o deixei roubar. Chamei o Temer e disse: ‘Ele não fica'”

Dilma Roussell deu uma longa entrevista ao Valor. Alguns trechos:

  • Não parece contaminada pela tristeza que dá nome ao bairro, na zona sul de Porto Alegre, em que mora para estar mais perto da filha: “Meu outro apartamento é maior, mas fica num lugar mais coxístico”. A prefeitura da capital e o governo do Estado são ocupadas por dois entusiastas do impeachment (o tucano Nelson Marchezan Jr. e o pemedebista José Ivo Sartori), mas a ex-presidente diz não enfrentar hostilidades na rua. As pessoas a abordam no supermercado e alguns pedem para tirar foto. “Só não paro quando estou de bicicleta. Digo ‘Se querem tirar foto, a gente engrena junto’.” Ciclistas do “pedal das gurias”, quando a acompanham até o fim do percurso, arrancam uma foto sem selim.
  • Sente falta do poder? “Posso até sentir, mas não agora. Sempre fui uma pessoa que se acostuma com a vida. Tinha uma vida lá, com um ritmo e uma função. Era obviamente interessante, sempre vai ser. Instigante, importante, né? Aqui tenho outra vida. Gosto muito de ler, de ver filme. Escuto ópera.”

  • Só estendeu uma das mãos à palmatória, mas, dado o vigor com o qual defendeu a política de desonerações ao longo de seu governo e até agora, não parece pouco. Naquele momento, ainda resiste a espalmar a outra mão à palmatória da Lava-Jato: “Agora, o que eu tenho certeza que o meu governo jamais fez foi compactuar com a corrupção. Entro num tema que acho sério, que é o sincericídio do ministro por um mês, do Planejamento, o senador [Romero] Jucá, quando disse que tinha que estancar a sangria e usou palavras, assim, pornográficas para descrever as relações políticas no Brasil”.

  • A ênfase em “meu governo” não parece solta na frase. Foi na gestão Dilma que Graça Foster assumiu a presidência da Petrobras, afastou os diretores suspeitos e cerceou os contratos por eles geridos, decisão que começou a corroer a base de apoio ao governo no Congresso montada pelo antecessor: “Se não achasse importante o combate à corrupção, não teria sancionado a lei da delação premiada, não teria respeitado a Polícia Federal, não teria respeitado o Ministério Público, nem nomeado ministros [do Supremo Tribunal Federal] que tivessem uma inequívoca biografia”.

  • Dilma não fulaniza: “Tinha gente que dizia pra mim: ‘Tem que fazer aliança com Eduardo Cunha’, mas o rompimento, olhando de hoje, era inexorável. Não existe acordo com Eduardo Cunha. Existe submissão. As 19, ou 15 ou 38 perguntas ao Temer, o pacote de [José] Yunes, o que você acha que é, querida? Você está falando de um gângster inteligente. Devia ajoelhar e aceitar as condições?”.

  • A recusa a um acordo não lhe custou o mandato? “Custaria mais para o país. Muito mais”. Não está custando agora, pelo conjunto da obra do governo Michel Temer? “Acontece o seguinte, minha querida, custaria eu fazer, né? Você vai me desculpar mas eu não vou assaltar o país. Eduardo Cunha e eles assaltam o país. Assaltam. Do verbo assaltar. Além de outras coisas, né? Ele tem uma postura, em relação a direitos, coletivos e individuais, extremamente sectária.”

  • Nesse momento, Dilma relativiza a frase categórica sobre a extensão da faxina de seu governo: “Saber demais não significa que você é capaz de impedir algumas coisas. Por exemplo, o gato angorá [Moreira Franco] tem uma bronca danada de mim porque eu não o deixei roubar, querida. É literal isso: eu não deixei o gato angorá roubar na Secretaria de Aviação Civil. Chamei o Temer e disse: ‘Ele não fica. Não fica!’. Porque algumas coisas são absurdas, outras não consegui impedir. Porque para isso eu tinha de ter um nível de ruptura mais aberto, e eu não tinha prova, não tinha certeza, entendeu? Não acho que é relevante fazer fofoca, conversinha. Posso contar mil coisas do Padilha e do Temer, então? Porque o Temer é isso que está aí, querida. Não adianta toda a mídia falar que ele é habilidoso. Temer é um cara frágil. Extremamente frágil. Fraco. Medroso. Completamente medroso. Padilha não é. A hora em que ele [Temer] começa assim [em pé, mostra as mãos em sentido contrário, com os dedos apertados em forma de gancho]. É um cara que não enfrenta nada!”.