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Janot “criminalizou, sim, a política” e foi “desleal, incorreto e injusto”, diz advogado de Joesley

 

Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, mandou a seguinte nota:

A defesa de Joesley Batista está absolutamente perplexa com a entrevista concedida hoje no importante jornal Correio Braziliense pelo doutor Rodrigo Janot. Na entrevista, claramente fora do tom adequado a alguém que ocupou cargo tão importante, o doutor Rodrigo Janot ataca, violentamente, a pessoa de Joesley de maneira desleal e desproporcional, mais uma vez.

É importante ressaltar que Joesley tratou o seu processo de delação com a Procuradoria Geral da República, um ato de extrema importância e gravidade, confiando na boa fé do agente público e chefe do MPF. O dr Janot considerou que a delação da JBS seria a mais efetiva e a mais completa dentre tantas outras, tanto que aos diretores foi concedida uma inédita imunidade plena. Foi a única delação, das dezenas levadas a efeito, que resultou em imunidade absoluta. Durante essas tratativas, evidentemente, os delatores julgavam estar tratando com o Estado, representado pelo douto Procurador Geral da República.

Ocorre que as críticas ao doutor Procurador, após a divulgação dos termos e da imunidade concedida, foram bastante graves e ácidas por parte de toda a imprensa brasileira, onde se destacou, sobretudo, a impossibilidade da concessão de tamanho benefício. Do ponto de vista da defesa, doutor Rodrigo Janot, de forma desleal, incorreta e injusta, subitamente decidiu rescindir o acordo de colaboração premiada e denunciar os delatores, com a consequente retirada da imunidade concedida, que talvez fosse o que mais o incomodava o PGR.

Essa entrevista apenas demonstra e reforça a forma melancólica com que o ex-PGR despede-se do cargo máximo do Ministério Público, ressaltando detalhes internos, expondo de forma estranha e bastante ruim para a sociedade brasileira como o Ministério Público está claramente dividido. O Procurador, que até três meses atrás, sentia-se um herói nacional, agora tem que reconhecer que sequer foi convidado para a posse da atual Procuradora Geral da República. Essa exposição do Ministério Público é extremamente negativa, pois gera insegurança para todos aqueles que confiam e esperam que o órgão continue a ser independente e, absolutamente, imparcial.

Joesley não quer tecer maiores comentário sobre a agressividade do doutor Rodrigo Janot, no entanto queremos ressaltar o que é, no momento, para nós o mais importante: os delatores estavam ainda no prazo para entregar toda e qualquer documentação relativa à colaboração, autorizados pelo próprio Ministro Fachin, e cumpriram absolutamente tudo o que lhes cabia cumprir e, a partir daí, com a homologação da delação, o delator tem o direito subjetivo de ver aquilo que lhe foi prometido ser, efetivamente, cumprido.

Destaco que não fui advogado e nem participei da colaboração da JBS, mas ressalto que essa discussão é fundamental para estabilidade do instituto da delação, visto que se trata de um instituto novo no processo penal, que merece todo tipo de reflexão e as devidas críticas e apontamentos. Afirmo que sou favorável ao instituto, mas sou um crítico dos excessos cometidos na sua aplicação. Esse triste episódio ressalta isso de forma muito intensa.

Na verdade, estamos vivendo a desmoralização da colaboração premiada e criando instabilidade para todos aqueles que foram delatores. Eu sou um crítico ferrenho dos excessos há muito tempo, e agora estou trabalhando para, em primeiro lugar, conseguir a liberdade dos colaboradores da JBS e, posteriormente, para fazer valer os seus direitos, com a convicção de que se eles cumpriram aquilo que acordaram (e efetivamente cumpriram) com o Ministério Público, eles não podem ter o acordo rescindido por ato de vontade e autoritarismo do ex-PGR, tão somente devido às críticas quanto à imunidade que lhes foi dada.

Também é importante ressaltar que o Dr. Janot criminalizou, sim, a política. Sobretudo ao dividir, para dar um exemplo, a investigação em quatro grandes inquéritos que miravam como alvos grandes partidos da República, como PMDB da Câmara, PMDB do Senado, PP e PT. Agindo dessa forma, ele se referiu abertamente aos mencionados partidos, historicamente importantes e reconhecidos como pilares da redemocratização e do sistema republicano representativo brasileiro, como se fossem uma organização criminosa, sem se preocupar com o óbvio: descrever os tais crimes cometidos e explicitar a necessária individualização da suposta conduta dos parlamentares ali indevidamente atacados.

Essa criminalização da política é absolutamente nociva ao Estado Democrático de Direito. Logo, a Procuradoria Geral da República, com a importância que tem – inclusive porque é competência exclusiva do PGR apresentar a denúncia, visto que o Supremo Tribunal Federal não age sem provocação (e veja-se que, nesse ponto, o procurador é mais importante que um Ministro do Supremo, porque cabe a ele decidir quando arquivar e quando denunciar) – pode muito, mas não pode tudo.

A verdade é que Poder algum pode tudo, tal equilíbrio é da essência do sistema tripartido e da lógica de freios e contrapesos que rege a república. Assim, não pode o Ministério Público simplesmente chamar um partido de organização criminosa e irresponsavelmente lançar tais aleivosias à imprensa como verdade. O MP tem o direito de denunciar quem ele julgar que tem que denunciar, mas com o devido respeito aos partidos políticos que são a base da democracia representativa.

Infelizmente, é preocupante o grau de desestabilização do ex-procurador, que demonstra, inclusive, o seu rompimento, talvez pessoal, e a ruptura de seu grupo com o atual grupo que assume a procuradoria. E cabe a nós, advogados e cidadãos, com muita tranquilidade, aguardar que o MP volte a ter a transparência, a dedicação e a seriedade que sempre foi a marca do grande Ministério Público da época do min. Sepúlveda Pertence, por exemplo. Queremos ressaltar a dificuldade de lidar com esse grau de animosidade e esperamos que o Ministério Público Federal honre a sua tradição, honre seus compromissos, em nome da segurança jurídica e da perpetuação do estado democrático de direito.