Maior jornal em francês da Bélgica diz que imparcialidade de Moro “já foi posta em dúvida”
O Le Soir, da Bélgica, o maior jornal em francês do país, dedicou uma matéria à condenação de Lula por Sergio Moro:
Para milhões de brasileiros cansados de uma classe política podre até os ossos, ele é um herói da luta contra a corrupção, e eles o aclamam como a uma estrela.
Mas, para aqueles que ainda apoiam a esquerda, ele é um homem de direita instrumentalizando a justiça para erradicar o Partido dos Trabalhadores do espectro político. A maneira como ele condenou nesta quarta-feira em primeira instância o ex-presidente Lula a quase 10 anos de prisão reforça essa dupla estatura.
Sergio Moro, 44 anos, endossa de qualquer modo com brilhantismo o papel do “pequeno juiz” sem medo, ousando atacar os ricos e os poderosos. Juiz de primeira instância em Curitiba, capital do estado do Paraná, especialista em investigações financeiras, ele trabalha há três anos sobre um caso de lavagem de dinheiro nessa cidade, que o levou a monitorar um posto de gasolina gerido por um certo Alberto Yousseff, campeão de operações de câmbio ilegais.
“Se eu falo, a República cai”
Puxando este fio, ele caiu sobre o rolo gigante de um caso envolvendo a Petrobras, as maiores empresas brasileiras de construção e de obras públicas e de políticos de todos os lados, corrompidos por essas empresas.
Nome genérico do processo: “Lava Jato”, o nome do posto de gasolina de Yousseff.
Preso em março de 2014, o referido Yousseff teria, segundo o New York Times, declarado aos investigadores, antes de fazer sua confissão: “Pessoal, se eu falo, a República vai cair.” Bem observado.
Desde então, de fato, o juiz Moro tem feito uma limpeza radical no mundo empresarial e político: através de atos de instrução conduzidos às pressas, ele já obteve múltiplas condenações de políticos, de altos executivos da Petrobras ou de donos de grandes construtoras. E revelou quase 10 bilhões de euros em desvios de fundos.
A Itália dos anos 90
Formado nos Estados Unidos, particularmente em Harvard, Sérgio Moro estudou de perto o desenrolar da operação Mani Pulite (Mãos Limpas), que atacou a corrupção dos políticos na Itália nos anos 90. Segundo ele, o Brasil de hoje está no mesmo estado de decadência em que estava então a Itália, onde os políticos achavam normal receber “presentes” das empresas envolvidas nas contratações públicas.
“É um magistrado tecnicamente preparado, com uma capacidade de trabalho extraordinária e experiência de processo à grande escala”, estima o presidente da Associação dos juízes federais Antonio Bochenek.
Mas qual é o método desse juiz? Para quebrar os mais durões, ele usa sem moderação a lei que permite a um acusado que fala de se beneficiar de uma redução de pena. Sua segunda arma é a prisão preventiva. Colocados na “geladeira”, isolados, os acusados decidem em geral contar tudo o que sabem para salvar a pele. E tanto melhor se eles apontarem para alguns figurões…
Mas ele não tem somente amigos. “Moro instituiu a prisão preventiva como regra, quando em qualquer país civilizado isto é uma exceção”, criticou no El País Antonio Carlos de Almeida, o advogado de vários acusados.
Moro não dá entrevistas à imprensa, mas seguidamente recorre, quando isto lhe convém, a vazamentos para algumas grande empresas de mídias. E enquanto todos os partidos brasileiros estão implicados nesse caso, o juiz parece sobretudo perseguir o PT.
Mesmo que Sergio Moro negue orientar politicamente suas investigações, sua imparcialidade já foi posta em dúvida.
*Tradução de Míria Santos