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Temer diz que ter recebido Joesley é “inadmissível no cargo”: “Duvido que o Rocha Loures vá me denunciar”

 

Michel Temer deu entrevista à revista amiga Istoé, mais conhecida como Quantoé:

Por que o senhor quer ficar no cargo de presidente da República?

Em primeiro lugar, para defender-me no aspecto moral. Tenho extraordinário orgulho de exercer o cargo de presidente da República. Mas não é só por exercê-lo. É por exercê-lo transformando o Brasil. Em um ano, conseguimos fazer aquilo que vários governos anteriores não conseguiram. Quem tem interesse eleitoral não praticaria essas medidas. Por outro ângulo, eu tenho necessidade de revelar a minha moral hígida e intacta porque, convenhamos, esse noticiário todo preocupa as pessoas, amigos meus, gente que me conhece, família, não é? “Puxa, será que o Temer fez isso?”. Coloca em dúvida. Não quero que fique em dúvida. Por isso, o aspecto moral é que me mantém, é um dos meus principais suportes para me manter aqui. Por isso não renuncio. Vou aguardar com muita tranquilidade a decisão do processo eleitoral.

O que se comenta é que a Procuradoria-Geral da República deve denunciar o senhor…

Veja que coisa grave o que você está dizendo. O inquérito não tem absolutamente nada ainda. Não tem perícia, não tem interrogatório e você já sabe que ele vai denunciar.

Se a Procuradoria da República oferecer a denúncia, a Câmara precisa aprová-la por dois terços dos votos. Caso isso aconteça, o senhor ficaria até 180 dias afastado da Presidência.

É mais uma frente, mas vamos esperar que ela chegue, né? Não posso fazer nenhum comentário agora.

Se o senhor perder o apoio do PSDB e da base, mesmo assim, pretende ficar no cargo?

Vou esperar perder o apoio primeiro, né, para depois examinar. Não estou perdendo o apoio. O que eu vejo é muito achismo. E achismo no sentido de que o governo paralisou, o País não vai para frente. Meu Deus do céu, na semana seguinte, a Reforma Trabalhista foi lida, com todos aqueles acidentes, no Senado Federal. Foi discutida. Está tendo sequência. Na semana passada, houve um fato inusitado legislativamente. Foram aprovadas sete medidas provisórias.  É interessante, o Brasil ganhou até mais agilidade.

Mas o PSDB, um aliado de peso, e alguns partidos do centrão, ameaçam, sim, sair. Isso não pode afetar a governabilidade?

O Congresso continua a legislar. Então vamos ver lá para frente. Por que é que eu vou dizer “ah, tenho que sair porque o Congresso está legislando demais, porque estou tomando muitas medidas administrativas”? Não tenho que me preocupar com o que vai acontecer no futuro. O futuro vai dizer.

Em que a situação da ex-presidente Dilma Rousseff, às vésperas do impeachment, difere da sua?

No impeachment da ex-presidente havia milhões de pessoas nas ruas. Esse é um ponto importante, não é? Segundo ponto: não havia mais apoio do Congresso Nacional. No meu caso, não. O Congresso está comigo. A oposição que se faz não é quanto ao conteúdo das reformas, mas uma oposição política. A situação é completamente diferente.

O senhor acha que há um complô de forças para tentar tirá-lo da Presidência?

Olha, fica difícil dizer, mas não fica difícil supor. É interessante como há uma conjunção de urdidura. Houve um esquema preparado para chegar a isso e de que maneira? Do tipo: traga alguém graúdo para poder valer a delação. Então o sujeito sai de gravadorzinho na mão procurando quem é que ele vai gravar e depois há todo um processo. Você veja: há um inquérito, que não se quer inquirir, em que se quer fazer a denúncia independentemente do inquérito, com prazos muito exíguos, como 24 horas para apresentar os quesitos para a perícia, isso num sábado à partir das 20h para vigorar até o domingo, às 20h, fora do expediente forense. Então eu olho isso e tenho o direito de supor que seja uma tentativa de derrubar governo.
 
O senhor acha que o procurador geral, Rodrigo Janot, está sendo arbitrário no seu caso?
 
Olha, eu prefiro não comentar. E acho que isso já dá uma boa resposta, não é verdade?

Se o senhor pudesse ficar cara a cara com o empresário Joesley Batista hoje, o que o senhor diria para ele?

Eu prefiro não mencionar na entrevista (risos).

O novo ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse que consultaria o senhor sobre uma eventual substituição do diretor geral da Polícia Federal, Leandro Daiello. Qual será sua orientação?

Primeiro, vou verificar qual é a perspectiva que ele, Torquato, tem em relação aos vários órgãos que existem lá no Ministério, incluindo a Polícia Federal. Quando ele me trouxer os argumentos eu vou examiná-los, mas a decisão é dele, avalizada por mim, sem dúvida nenhuma.

Temer e Rocha Loures
Mas existe a necessidade de mudar o diretor da PF?
Pode ser que o novo ministro levante os dados todos que ele julgue convenientes e venha conversar comigo sobre isso. Fui secretário da Segurança Pública em São Paulo, duas vezes, e eu tinha que ter pessoas da minha confiança em certos cargos, então eu mudava delegado-geral, mudava o comando da Polícia Militar quando necessário. A mudança do diretor da PF vai depender do novo ministro.

Uma mudança agora não poderia ser mal interpretada?

Só seria mal interpretada se você dissesse assim: só existe uma pessoa na Polícia Federal capaz de comandá-la. Mas isso desmerece a instituição e tenho certeza que o próprio diretor não pensa dessa maneira.

O senhor teme uma delação do seu ex-assessor Rodrigo Loures?

Não creio. Acho que ele é uma pessoa decente. Eu duvido que ele faça uma delação. E duvido que ele vá me denunciar. Primeiro, porque não seria verdade. Segundo, conhecendo-o, acho difícil que ele faça isso. Agora, nunca posso prever o que pode acontecer se eventualmente ele tiver um problema maior, e se as pessoas disserem para ele, como chegaram para o outro menino, o grampeador (Joesley): “Olha, você terá vantagens tais e tais se você disser isso e aquilo”. Aí não posso garantir.

Pelo que conhece dele, o senhor esperaria que ele andasse por aí com uma mala com R$ 500 mil em dinheiro vivo de um empresário?

Confesso que não. É até surpreendente. Não sei a que atribuir isso, se atribuo à ingenuidade suprema, porque o sujeito pegou uma mala numa pizzaria.

O senhor se sentiu traído?

Não me senti traído porque não tenho nada a ver com isso.

Tem ligação com o seu partido?

Não creio.

Então seria uma atitude isolada?

Isolada.

Como explicar os R$ 500 mil por 20 anos ao seu ex-assessor?

A conversa que ele (Joesley) teve (com Loures) não sei dizer qual era. Queriam seduzi-lo para fazer o seguinte: como não saiu o negócio do Cade, tempos depois, ele foi lá entregar um dinheiro, acho que uma antecipação ao Rodrigo. Para quê? Para flagrar, filmar. Mas é porque a coisa do Cade não estava saindo. Como realmente não saiu. Você propor um inquérito contra um presidente da República, ancorado numa gravação que, desde o primeiro momento, foi impugnada pelas nossas perícias mostrando a imprestabilidade dessa prova, isso não pode servir de fundamento desse inquérito.

Por quê?

Não foi um inquérito contra um cidadão comum. Foi contra uma instituição, que é a Presidência da República. Aliás, tão logo foi proposto o inquérito, o Brasil teve um prejuízo de R$ 219 bilhões. Note o prejuízo que ele (Joesley) causou e que terá de ressarcir um dia.

Estar incluído no mesmo inquérito que o senhor é bom para o Loures. Mas não fica ruim para o senhor?

Não fica porque eu vou provar, como tenho provado seguidamente, que não tem absolutamente nada de participação minha nesses episódios.

O empresário Joesley Batista relatou ao senhor uma série de crimes. Por que, como autoridade máxima do Brasil, o sr. não tomou uma atitude?

Não achei que seria uma gravidade tão imensa. Já ouvi tanta coisa na vida. Várias pessoas vêm me falar coisas. E meu estilo não é agressivo. “Olha, você está preso”. Isso eu não faço.
Se depois de tudo o que aconteceu, uma pessoa disser uma coisa tão chocante quanto a que falou o Joesley, o senhor pretende mudar de atitude?
Eu vou examinar. Se eu conhecer a personalidade do indivíduo que está me falando as coisas, tomarei providências de acordo com o conhecimento que eu tenho da sua personalidade. Farei dessa maneira.

A delação do empresário Joesley foi divulgada no momento mais apropriado ao delator. Quando ele já tinha deixado o Brasil com a família, o que tem levantado várias teorias da conspiração. O senhor acha que todo esse roteiro já estava escrito ou foi uma boa coincidência à família Batista?

Acho que estava escrito porque até no plano econômico ele soube utilizar esse fato. Mencionamos aquela hipótese de US$ 1 bilhão, mais a venda das ações de sua empresa. Você percebe que era uma coisa que estava bem articulada. Não foi algo espontâneo, de um momento para o outro. Foi uma coisa pensada e levada adiante em razão do pensamento que antes se delineou por causa disso.

O senhor voltará a receber o ex-deputado Eduardo Cunha quando ele sair da cadeia?

Não sei, mas acho que não teria dificuldade se for procurado. Eu converso com tanta gente. Mas aí vão dizer que o presidente não pode conversar com certas pessoas. Isso não existe. Eu fui vítima do meu jeito de ser no tocante a receber as pessoas. Hoje eu começo a achar que, por exemplo, foi uma falha ter recebido o procurador-geral duas ou três vezes no Jaburu sem agenda. Como ter recebido inúmeros jornalistas e empresários fora da agenda. Foi uma falta de liturgia que, até digo, é inadmissível no cargo.

Com a saída de Osmar Serraglio do Ministério da Justiça, o Rodrigo Rocha Loures perdeu o foro privilegiado. O senhor pretende garantir o foro a ele?

Não pretendo. Isso não é verdade. Aliás, processualmente, ele está vinculado a mim e não perde o foro por causa disso.

(…)