Julgamento de Lula: o carrasco quase sempre entra em cena com uma máscara – a da justiça. Por Miguel Enriquez

Atualizado em 22 de janeiro de 2018 às 18:35

POR MIGUEL ENRIQUEZ

Para Mino Carta

Paulo Henrique Amorim aventou há dias na TV Afiada a possibilidade da insônia de um desembargador na encruzilhada do direito e do arbítrio.

Não é para menos.

Os três desembargadores tomarão uma decisão que tentará influir no futuro do Brasil.

Ou coonestarão o golpe de 2016, prenhe de golpes já ocorridos e por ocorrer, prolongando e aprofundando a anomia e insegurança jurídica, ou ajudarão a devolver o país a quem de direito, ao titular da soberania, ao eleitor, e restituir a integridade do direito violado por Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e outros.

É tarde demais para remeter à leitura dos clássicos, assimilados ou não, vividos ou não. Quem não fez o seu tema de casa no curso de graduação e nos anos posteriores, dificilmente recuperará o tempo perdido.

Limito-me, pois, a traduzir alguns aforismos do grande escritor polonês Stanisław Jerzy Lec (1909-1966). Ao lado de Filologia Polonesa, Lec (pronuncia-se “Léts”) estudou Direito de 1927 a 1933.

Sua familiaridade com o universo jurídico reflete-se nas “ideias despenteadas”, denominação modesta dada aos aforismos publicados a partir de 1955, que tornaram-no mundialmente famoso.

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Quem não possui consciência precisa compensar isso com falta de consciência.

Podemos fechar os olhos perante a realidade, mas não perante a memória.

O salto moral é muito mais perigoso do que o salto mortal.

Como avaliar com maior justiça um Estado? É simples: a partir do seu Judiciário.

Quem pisoteia o direito raras vezes anda bem das pernas.

Sua consciência estava limpa. Nunca fazia uso dela.

Compensa a falta de talento com falta de caráter.

Saiam do caminho da justiça! Ela é cega!

Foi um excelente guardião da lei. Zelou tão bem por ela que ninguém pôde fruí-la.

Eis um Código Processual de novo estilo: os culpados estão sentados atrás dos bastidores.

O processo foi conduzido de forma muito humana. A solicitude diante do réu foi tamanha, que o acusador até assumiu a apresentação da sua confissão de culpa.

Os moradores do andar de cima também têm suas atribulações. Quando elas se manifestam, eles costumam dizer: “O céu abaixo de nós está ficando nublado.”

O carrasco quase sempre entra em cena com uma máscara – a da justiça.

Toma cuidado! Na busca de vestígios, deixas rastros.

Um Estado é avaliado segundo a sua jurisprudência.

Tema para uma tese de doutorado: Tendências evolutivas humanitárias nos métodos de assassinato de adversários políticos.

Todos são iguais perante o direito, mas não perante os que sobre ele decidem.

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Desejo aos competentes julgadores de 24 de janeiro um bom sono. O sono dos justos.