Manifestantes são terroristas? Sim, de acordo com um projeto de lei que tramita no Congresso

Atualizado em 27 de outubro de 2014 às 11:45
Terroristas
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O Brasil está se preparando com “braço forte” para a Copa.

Se seu amigo, filho, primo ou tio aderir a algum tipo de manifestação durante o evento e acabar preso, ele pode não apenas passar uma noite na delegacia, mas ser considerado “terrorista” e pegar até 30 anos de prisão.

Pelo menos segundo o projeto de lei (728/2011) de autoria do senador Marcelo Crivella, ministro da Pesca e Agricultura,  que tramita no Congresso. “O projeto descreve uma verdadeira criminalização dos movimentos sociais, pois é um tipo penal cheio de expressões abertas, o que permite a acusação e ao juiz dar o sentido que quiserem”, diz Iuri Delellis Camillo, advogado criminalista do escritório Camillo Filho, Carvalho e Ibañez e membro da Comissão de Criminal Compliance do Instituto dos Advogados de São Paulo.

Camillo se refere ao artigo quarto do projeto de lei, que define terrorismo: “Provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa à integridade física ou privação da liberdade de pessoa, por motivo ideológico, religioso, político ou de preconceito racial, étnico ou xenófobo”. “O que seria ‘terror ou pânico generalizado’? Ficará ao livre arbítrio da acusação”, argumenta Camillo. Segundo ele, “se está havendo um protesto pacífico e a polícia chega e começa aquela cena de guerra, todos os ali presentes podem ser considerados terroristas. E a pena mínima para o crime é de 15 anos, ou seja, manifestantes serão presos sem direito a qualquer benefício (pois terrorismo é crime hediondo) e também sem a possibilidade de qualquer medida diversa de prisão (pois a pena mínima é muito alta)”.

O projeto, que inclui vários outros itens, como “ataque a delegação” e “violação de sistema de informática” está sendo proposto especificamente para a Copa do Mundo, com a intenção de reforçar a segurança do evento. “Os crimes dessa nova lei já são previstos em legislações anteriores”, diz Camillo, apontando a intenção de enfatizar medidas específicas para a Copa.

A exceção está justamente na definição criminal de terrorismo, que existe em leis da época da ditadura e estão obsoletas. ” O crime de terrorismo é algo muito sério, que já está em discussão há muito tempo e será incluído na reforma do código penal. Um projeto de lei temporária não é a maneira correta para tentar criar esse crime, e até expõe o Brasil à uma situação vexatória: aqui só existe terrorismo se for feito durante a Copa”, diz Camillo.

Para ele, o projeto, mais do que uma forte repressão às possíveis manifestações durante a Copa, é uma forma de atender às exigências da Fifa, preocupada apenas com o sucesso do evento que promove. “É um projeto que ameaça a soberania nacional para atender os interesses de uma instituição, uma empresa. Se ainda fosse para atender os interesses da comunidade internacional, o que é necessário às vezes, seria até compreensível”.

Três comissões do Senado já deram parecer a favor do arquivamento, apontando, inclusive, erros técnicos grosseiros. Mas o que mais poderá surgir daqui pra frente?