“Não fui representar Jesus”, diz ao DCM a travesti que enlouqueceu Feliciano na Parada Gay

Atualizado em 9 de junho de 2015 às 14:04
Viviany em performance na parada gay de São Paulo.
Viviany Beleboni em performance na parada gay de São Paulo.

 

“Alô”, ela respondeu. Pedi para falar com Viviany e notei o medo num instante de silêncio antes de responder que era ela. Me apresentei. Um alívio parecia tomá-la.

Viviany Beleboni, 26 anos, é uma travesti e faz questão de ser identificada assim. Usou esta palavra algumas vezes durante a conversa que tivemos por telefone.

Foi ela quem fez, presa numa cruz, uma performance na parada LGBT de São Paulo no último domingo, 7 de julho.

“Foi um protesto. Fui representar as travestis que são crucificadas todos os dias. Não fui representar Jesus Cristo”.

Viviany conta que optou pela performance por conta do aumento dos crimes contra travestis e transexuais no último ano. “Uma amiga minha levou 4 tiros há poucos dias”.

Criação própria, a performance chocou alguns religiosos mais afoitos. O deputado-pastor Marco Feliciano chegou a falar em “cristofobia” nas redes sociais.

Feliciano não compreende reciprocidade e não entende que quem quer respeito tem que respeitar. Ele acha normal dizer que o homossexualidade é doença, mas acha inadmissível que alguém faça uma performance usando uma cruz.

 

feliciano-facebook

 

No texto postado nas redes sociais, Feliciano diz ser contra usar a imagem de Jesus num beijo gay. E por que não poderia? Quem disse que não pode? Ele? E ele tem exclusividade sobre a imagem de Jesus? Quem deu? Jesus?

Nem sobre a compreensão de Jesus de Nazaré “cristãos” como ele têm exclusividade. Os fundamentalistas são os que deturparam a mensagem de seu messias.

Feliciano começou o fuzuê em cima de Viviany, incluindo imagens de outros países e de outras manifestações. Viralizou. Até o momento, mais de 400 mil compartilhamentos.

Como resultado, uma onda de gritaria que culminou numa ameaça de morte esta manhã. “A primeira coisa que fiz hoje de manhã foi receber um telefonema me ameaçando de morte. Depois desliguei o telefone”.

A modelo ainda lida com as reações que sua performance provocou. “São covardes. Te desejam câncer, que sua família morra. Diziam que eu tinha que ter sido eletrocutada, que ter caído e quebrado o pescoço. E dizem que são religiosos”.

 

Viviany, quando não é crucificada
Viviany quando não é crucificada

 

Viviany é ativista da causa gay há muito tempo, mas se sentiu desprovida de apoio por parte dos homossexuais. “[Gays] chegaram a me falar que sou porca, que manchei a parada”, diz. “Me senti desrespeitada pelos gays, mas ao mesmo sei que não são todos”.

Da mesma forma que sua surpresa foi grande diante da reação, também foi grande diante dos que saíram em sua defesa. “A comoção me fez pensar que fiz a coisa certa. Não me arrependo”.

Viviany segue o espiritismo. Acredita em Jesus. Disse “graças a Deus” mais de uma vez durante a conversa.

“Estou querendo ir embora do país”, ela disse. Segundo ela, não é por nenhum tipo de raiva ou medo. “Já pensava nisso, hoje esse desejo aumentou muito. Por isso estou estudando inglês”.

É bom notar que há uma placa que explica sua intenção aos desavisados. Ninguém está “debochando”, como disse Feliciano. A mensagem é clara: “basta de homofobia”, não é “abaixo Jesus” (muito embora fundamentalistas digam “abaixo o homossexualismo” numa boa, quando não “abaixo os homossexuais”).