O escândalo da merenda em SP vai sumir sem ninguém bater panela por isso. Por Mauro Donato

Atualizado em 24 de fevereiro de 2016 às 12:06

merenda

 

Aproximadamente uma hora e meia antes do programa do PT ir ao ar na noite de ontem, havia terminado mais uma reunião na Assembléia Legislativa de São Paulo (ALESP) em que estudantes, professores e pais de alunos estavam presentes na expectativa de que seja aberta uma CPI para apurar o esquema de propinas na distribuição de merendas escolares que envolve o alto escalão do governo Geraldo Alckmin.

Quando Lula surgiu na tela da TV durante o programa do partido, deu-se o costumeiro panelaço nos bairros chiques de diversas cidades. Por que não se ouve batucada igual pela rapinagem na merenda escolar?

São algumas as razões. A primeira delas é que ninguém dos bairros chiques está nem aí para a educação pública, saúde, transporte, enfim nada que seja público. Depois, essa mesma audiência qualificada não terá tomado conhecimento da reunião na ALESP através da mídia tradicional. Nem antes nem depois. Curioso é que para colocar tensão quando lhe é interessante, a mesma mídia praticamente convoca manifestantes.

Por último, essas grandes emissoras apostam que trata-se de uma bobagem, uma perda de tempo pois a reivindicação é nati-morta. Afinal, qual a probabilidade de sucesso de instalação de uma CPI quando a presidente da mesa é uma deputada do partido envolvido no escândalo?

A deputada Analice Fernandes (PSDB) presidiu nesta terça-feira a sessão permeada pela esperança dos populares presentes nas galerias de que fosse aceito um pedido de abertura de CPI baseada nas denúncias feitas na operação Alba Branca que tem o presidente da ALESP, Fernando Capez (PSDB) como um dos suspeitos.

Foi um show de horrores. De início foi concedida a palavra ao Coronel Telhada (PSDB) que de imediatamente despejou gasolina na fogueira. Provocou os movimentos sociais ao dizer que ele não estava ali a troco de pão e mortadela. Mandou que ‘calassem a boca’, ameaçou fazer-se valer da força policial para esvaziar as galerias. Tudo muito bem arquitetado para inflamar a povo. Conseguiu.

Em suma, no primeiro orador do dia já foi feito um pedido de suspensão da sessão pela presidente tucana Analice Fernandes.

Telhada deu seu show e depois desapareceu. Quem tomou seu papel nessa palhaçada foi o deputado Campos Machado (PTB) que a todo momento repetia a mesma estratégia. Interrompia os deputados que estavam se manifestando a favor da instalação da CPI, pedia a palavra, fazia provocações. Assim, do nada, sem mais nem menos, pegava o microfone já exaltado: “Assim, não dá. Com essa baderna não é possível”. E tome vaia. Obvio, uma grande parte ali era de adolescentes. Treze, catorze, quinze anos. Caiam na provocação e a presidente da mesa, cúmplice no jogo de cena, ordenava a suspensão.

Com seu jeitão de jurado do programa Silvio Santos, Machado deve ter se achado muito inteligente, um gênio estrategista que derrota adolescentes. Repetiu este circo cinco vezes. “Presidente, sou interrompido a toda hora. Veja, eu preciso concatenar as ideias e não consigo.”

E assim foi, de suspensão em suspensão, interrupções patéticas com a finalidade exclusiva de tumultuar a sessão até que os trabalhos fossem encerrados em virtude do horário. Segundo o deputado João Paulo Rillo (PT), “Há três semanas estamos assim. Quando chega na ‘ordem do dia’, levanta-se (encerra) a sessão para evitar o debate sobre este assunto”.

Até então, apenas 23 deputados assinaram favoráveis à abertura da comissão de inquérito parlamentar. São necessárias pelo menos 32 assinaturas mas a pauta estava esvaziada pela ausência de governistas e base aliada. Além de Telhada e Campos Machado, apenas mais três ou quatro estavam no plenário.

Com os trabalhos encerrados e mais uma vez o assunto merenda escolar engavetado, o que restou evidente foi, além da forma jocosa como a base aliada de Alckmin tratou professores e estudantes, que a ALESP não está habituada com a participação popular. A ‘casa do povo’ tentou impedir que estudantes entrassem no plenário, tentou impedir que se manifestassem, confiscou apitos e escalou um contigente ostensivo de policiais militares.

Como bem definiu o deputado Carlos Giannazi (PSOL) a ALESP tornou-se uma extensão, um puxadinho do Palácio do Governo. Portanto, grandes TVs e jornais silenciarão a respeito do assunto e as panelas, para este tema, permanecerão no armário embaixo da pia.

O que está em pauta é a educação, pilar de uma sociedade, mas uma classe política que age como se estivesse num espetáculo de telecatch tal o seu grau de falsidade, e uma camada da sociedade alienada e co-responsável pela bandalheira deseja manter as coisas como elas sempre estiveram.