O estranho processo que um diretor da Globo está movendo contra mim. Por Paulo Nogueira

Atualizado em 3 de fevereiro de 2016 às 17:44
Qual á a visão de imprensa livre de Bretas?
Qual á a visão de imprensa livre de Bretas?

Qual o conceito de jornalismo livre de Erick Bretas, diretor de novas mídias da Globo?

Bem, jamais esperei grande coisa de Bretas, e por isso não posso dizer que me decepcionei ao saber que para ele “imprensa livre” não admite críticas.

Bretas, fui informado dias atrás, está me processando por difamação etc etc.

Sou, como todos sabem, um defensor de que você busque na Justiça reparação contra calúnias. Aplaudi Lula e Chico Buarque por abrirem processos.

Agora: o que fiz para ser processado por Bretas?

Nada parecido com coisas que sua empresa faz costumeiramente. Não disse que ele é dono de um imóvel suspeito, não disse que alguém pagou as contas de alguém de sua família e por aí vai.

Não é este o tipo de jornalismo que pratico, e os leitores do DCM sabem disso.

Não invadi sua vida privada, não o chamei de coisas como desonesto – como ele, aliás, fez em relação a Dilma em seu Facebook.

O que fiz foi criticá-lo estritamente sob o ângulo profissional.

Reli tudo que o DCM publicou sobre ele antes de escrever este artigo.

A primeira vez que tomei conhecimento de sua existência foi quando recebi uma mensagem: olhe o que o Bretas está escrevendo no Facebook.

Fui ver quem era ele e o que estava postando. Era um post defendendo o impeachment – portanto a cassação de 54 milhões de votos. Não parava aí: Bretas conclamava seus leitores a ir para uma manifestação pelo impeachment. E avisava: estarei lá.

Ora, ora, ora.

Como um jornalista duma posição elevada como a que Bretas ocupa na Globo pode fazer este tipo de coisa? É a negação do jornalismo. A missão do Jornal Nacional usa a palavra “isenção”.

Bretas estava se comportando como um militante do impeachment e do golpismo, e não como um jornalista.

Afirmei que este tipo de profissional na Globo explica a cobertura desequilibrada da casa em suas várias mídias.

Há muitos outros, como Diego Escosteguy, da Época. Nos últimos anos, a Globo se cercou de antipetistas em todos os seus veículos, como de resto toda a grande mídia.

O maior atributo de um jornalista hoje não é o texto, a sagacidade, a capacidade de jogar luzes onde há sombras. É, simplesmente, atacar o PT, Lula e Dilma.

Você tem licença para matar. Lauro Jardim sobreviveu a uma barrigada fabulosa quando escreveu, em sua estreia, que uma empresa pagara contas de milhões de reais a uma nora de Lula.

Um blogueiro do UOL também sobreviveu depois de afirmar, meses atrás, que Lula estava com um novo câncer. Não um câncer qualquer, mas o mais rapidamente letal dele: o de pâncreas. Fosse verdade, há meses Lula já estaria morto.

Mas Lula está vivo, como vivo está o blog do jornalista que anunciou o câncer que seria fatal.

Os jornalistas das empresas jornalísticas sabem que nada lhes acontecerá se errarem massacrando os alvos certos. Mino Carta recentemente os definiu como “grilos falantes” dos patrões.

Notei também, em outras postagens, a falta de discernimento de Bretas. Numa delas, ele citava a Veja como um muçulmano cita o Corão, com fé absoluta.

Aí, ele foi mais Marinho que os Marinhos. Lembro-me, numa reunião do Conselho Editorial da Globo nos tempos em que eu trabalhava na empresa, de João Roberto Marinho recomendando cuidado com a Veja.

Faz uns oito anos isso. João já percebera que a Veja ultrapassara todos os limites de irresponsabilidade e leviandade para tentar derrubar o governo.

Durante muito tempo, havia uma parceria – não declarada – entre a Veja e o Jornal Nacional. A Veja denunciava, a seu modo frequentemente criminoso, e o JN repercutia no sábado com demoradas reportagens.

Uma vez, naqueles dias, perguntei numa reunião do Conselho: “A Globo tem centenas de jornalistas em tantos veículos e ainda assim toda semana é a Veja que publica sempre os furos que vão dar no JN?”

Mas, enquanto a Veja não se desmoralizou, foi uma relação ganha-ganha. O JN promovia a revista – e as intermináveis denúncias. E a Veja retribuía com uma cobertura vasta e adulatória da TV Globo.

O avatar no Facebook com o qual Bretas anunciou o fim de Dilma
O avatar no Facebook com o qual Bretas anunciou o fim de Dilma

Uma outra postagem de Bretas para a qual me alertaram dizia respeito aos protestos dos secundaristas de São Paulo. Bretas acusava-os de “brincar de Primavera Árabe”.

Mais uma vez: que tipo de coisa você podia esperar da cobertura da Globo sobre os secundaristas quando um homem de sua alta hierarquia jornalística se sentia à vontade, publicamente, para atacar a garotada?

Em outras ocasiões, Bretas voltaria a se comportar como militante, e não como jornalista. Numa delas, colocou a foto de Bicudo em seu avatar no Facebook. Em outra, pôs uma imagem, também no avatar, na qual estava escrito game over. Acabou. (O governo de Dilma, naturalmente.)

A rigor, eu poderia criticar, mais que Bretas, a Globo, por sua permissividade abjeta quando se trata de dar paulada nos suspeitos de sempre.

(Eu poderia falar também em ingratidão, porque a crise da Globo seria ainda mais grave do que é se não recebesse 500 milhões de reais por ano em publicidade  ligada ao governo federal, a despeito de audiências em queda livre na Era Digital.)

Não sei qual a noção de jornalismo dos irmãos Marinhos para deixar que jornalistas como Bretas façam o que façam publicamente.

Mas sei que os danos à reputação de Bretas se devem a ele mesmo, e talvez à ausência de uma orientação na Globo – e não a mim.