O Helicoca e a prisão de um youtuber que ensinava a cultivar maconha. Por Marcos Sacramento

Atualizado em 21 de julho de 2016 às 9:34
Sérgio Delvair da Costa
Sérgio Delvair da Costa, aka THC Procê

 

A prisão de um youtuber em Brasília escancara a hipocrisia da chamada guerra às drogas, que encarcera cultivadores de maconha para consumo próprio mas é incapaz de descobrir a origem dos 445 quilos de pasta base de cocaína apreendidos no helicóptero da família do senador Zezé Perrella.

O preso em questão é o professor Sérgio Delvair da Costa, a.k.a THC Procê, militante pela legalização da maconha e “grower”, como são chamados os apreciadores dedicados ao cultivo da erva.

Seu canal no Youtube, onde ensinava técnicas de cultivo, tinha mais de 16 mil assinantes. Adepto da filosofia do “plantar para não comprar”, criou a CCB (Cooperativa de Cultivadores do Brasil), que fornecia sementes aos 1.500 associados.

Talvez por não militar nas sombras, tornou-se alvo fácil da polícia civil, que no mês passado invadiu a residência onde ele mantinha 120 pés de maconha. E só. Nada de armas, nenhuma quantia em dinheiro, nem a jacuzzi onipresente nos esconderijos dos chefes do tráfico do Rio de Janeiro.

THC Procê foi autuado por tráfico e se condenado pode pegar até 20 anos de prisão.

Com pose de quem acabou de pegar um chefão da máfia mexicana, os policiais que o prenderam usaram o próprio canal do THC Procê para deixar um recado aos growers associados à cooperativa.

“Nós temos o endereço de cada um dos colaboradores que pagam R$ 37 por mês para receberem e cultivarem suas plantas de maconha em casa. Vamos bater na casa dos senhores e vocês vão responder por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Esse é o último vídeo do canal. A casa caiu. Cada um dos senhores está na nossa lista, com endereço e com identificação”, diz o policial, anunciando o que pode ser a maior operação de combate ao tráfico do país, com uns 1.500 investigados.

Apesar do absurdo que seria uma operação desse porte para pegar um punhado de sementes e algumas plantas, os growers têm motivo para se preocupar.

Ao contrário do caso do “helicoca”, no qual todos os envolvidos estão livres, a situação não tem sido fácil para quem se aventura a plantar maconha para consumo próprio.

Adepto da religião rastafári, o ativista Geraldo Antonio Baptista, ou Ras Geraldinho, autoproclamado “maior expert em maconha do Brasil” está preso e cumpriu três dos 14 anos de condenação por tráfico de drogas.

Geraldinho foi condenado por cultivar 37 pés de maconha em sua propriedade. Segundo seu advogado, as plantas renderiam menos de um quilo da droga.

Se fosse comercializada, o dinheiro obtido seria uma migalha comparado aos 50 milhões de reais que a cocaína apreendida no helicóptero dos Perrella valeria no mercado final.

As prisões dos ativistas e a liberdade dos envolvidos com o “helicoca” mostram que o Estado trata alguns com a fúria do ex-chefão do FBI John Edgar Hoover, enquanto com outros é leniente feito uma vovó carinhosa.

Será que a diferença no trato é só coincidência? Com Fernandinho Beira-Mar e Marcola dando ordens de dentro dos presídios e o tráfico pesado alimentando uma cadeia de propinas, extorsão e comércio de armas, fica difícil acreditar que essas discrepâncias são obras do acaso.