Por que nenhum jornalista quis ouvir a advogada da Odebrecht?

Atualizado em 20 de fevereiro de 2015 às 22:55
Desprezada
Desprezada

Se um dia a posteridade quiser aferir a miséria do jornalismo brasileiro nestes tempos, bastará consultar o desabafo da advogada Dora Cavalcanti, que defende a Odebrecht no caso Petrobras.

Num artigo publicado na Folha, ela contou que nem um único jornalista a procurou para conversar sobre o encontro que ela teve com o ministro José Cardozo no dia 5 de fevereiro.

Repito: nem um. Zero.

Que havia interesse jornalístico na reunião é evidente. É só ver, primeiro, o tom apocalíptico com que a mídia a noticiou. E depois a reação histérica e despropositada de Joaquim Barbosa e do juiz Sérgio Moro.

Por que, então, ninguém foi atrás de uma pessoa que participou do encontro?

É que a mídia brasileira não quer ouvir ninguém que traga pontos de vista diferentes dos seus em relação ao caso Petrobras.

Não há espaço para vozes divergentes. Não existe pluralidade. A grande mídia tirou de sua agenda opiniões discordantes.

Ajudar o leitor a entender a complexidade de muitas situações é uma das funções mais sagradas da imprensa.

A nossa abdicou disso há muitos anos. Se você mostra uma realidade parcial para o leitor é mais fácil manipulá-lo.

Esta a lógica sinistra da mídia brasileira.

Dora tens bons pontos.

A questão dos vazamentos seletivos é um deles. Em outros países, pondera ela, isso é inaceitável.

No Brasil, isso virou uma rotina – sem que se veja nenhum empenho em Moro em tentar pôr fim a elas.

Os vazamentos seletivos, e este é outro bom ponto de Dora, atrapalham consideravelmente o direito de defesa dos réus.

Em essência, é uma coisa injusta.

Como teria se comportado Moro se os vazamentos não alcançassem os suspeitos de sempre?

Bem, é uma hipótese inverossível: a imprensa não publicaria nada.

A advogada Dora Cavalcanti trouxe alguma luz ao caso Lava Jato com seu depoimento.

Moro e Barbosa, em compensação, produziram sombras.

Com sua agressão a Cardozo, Moro deixou claro, talvez involuntariamente, que está longe de personificar o ideal do juiz equidistante e imparcial.

É uma má notícia para a sociedade. Não à toa, a imprensa deu a ele o mesmo ar heroico que no Mensalão fora de Barbosa.

Os dois – Barbosa antes e Moro hoje – simbolizam o conservadorismo na Justiça nacional.

Barbosa, no Mensalão, fez horrores sem virtualmente nenhum obstáculo.

É um alerta.

Moro não pode ter o mesmo caminho fácil agora que foi concedido no passado a Barbosa.  Seus métodos têm que ser desafiados quando necessário.

Foi o que a advogada Dora Cavalcanti fez.

A despeito do que a Justiça decida sobre o papel da Odebrecht na história, o gesto de sua advogada merece aplausos. De pé.