Sobre as manifestações, a violência e a tolerância

Atualizado em 10 de novembro de 2014 às 15:27
Isto não é Rio de Janeiro. É Londres
Isto não é Rio de Janeiro, 2014, anti-Copa. É Londres, 2011, anti-cortes no orçamento

Há algo que os brasileiros em geral, de qualquer posição política, têm dificuldade em fazer: observar referências. Isso serve para absolutamente tudo. Vai abrir uma fábrica de carruagens? Se quer fazer isso bem, vá atrás das melhores fábricas de carruagens do mundo e veja como eles fazem. Vai ter um filho? Procure os melhores pais que conhece, busque informações dos melhores psicólogos.

Aí, é claro, você junta com seus instintos e suas próprias convicções. Mas ter referência é fundamental para se posicionar, além de ser uma atitude humilde. Ser auto-referente, como os brasileiros em geral são, é uma lástima. Tudo vira achismo.

Digo isso porque me espantaram alguns comentários no texto que defende a Sininho. Mais de um sugeria, como a Rachel Sheherazade, que as manifestações são anti-democráticas. Tipo, venceu a maioria, agora cala a boca e não enche o saco.

O fato é que essa alegação não é ilógica. A visão é que alguns poucos manifestantes querem impor sua vontade sobre milhões de eleitores de um governo. Mas é míope, e daí a importância de ter referência. Observando outras sociedades, as boas obviamente, onde vive-se bem, vive-se feliz, etc, você vai notar que há manifestações. Algumas iguais às nossas, aliás, com agências de bancos quebrados, bens públicos destruídos, etc.

Aqui, algumas notícias de protestos recentes nas sociedades mais desenvolvidas do mundo:

RT: Dezenas de policiais de Hamburgo são feridos em protesto violento contra despejos

Euronews: Jovens noruegueses protestam contra exploração de petróleo no ártico

Al Jazeera: Milhares protestam contra governo Polonês

BBC: Autralianos protestam contra lei de refugo de tubarões

AOL: Violência emerge na Alemanha, onde manifestantes defendem centro cultural

RT: Milhares protestam no Japão contra conta secreta do estado novo

RT: Dezenas de cidades americanas protestam contra brutalidade policial

DW: Centenas de professores dinamarqueses protestam contra fechamento massivo de escolas

The Guardian: Polícia prende 200 em Londres por violência em protesto

Basicamente, se você seguir as listas dos maiores IDHs do mundo, vai encontras manifestações de 2013 para cá em todos os países.

aconteceu na Alemanha
aconteceu na Alemanha

Protestos, manifestações e passeatas fazem parte das desobediências civis fundamentais para a democracia. Ghandi, Luther King, John Lennon lideraram manifestações.

Aí você me diz: mas eles não foram violentos. Verdade. Mas a violência que por vezes acontece no Brasil é resultado de uma série de fatores que não havia naquelas ocasiões: primeiro, polícia despreparada para lidar com elas; segundo, uma sociedade desigual e culturalmente diversa como a nossa pode provocar atritos muito maiores; terceiro, pessoas que não tiveram a educação adequada se expressam como podem.

aconteceu na França
aconteceu na França

Mas é bom lembrar que mesmo em sociedades onde há todos esses ingredientes positivos (polícia preparada, igualdade, educação) às vezes manifestações acabam se tornando bastante agressivas e perigosas. É quando o fator raiva chega no limite nos manifestantes.

Nós temos que compreender as manifestações brasileiras, ainda que não concordando com os motivos e nem com as ações. É uma questão de tolerância. Nós estamos reaprendendo a fazer isso. Se formos intolerantes, seremos Sheherazades. Apenas com outros princípios e com menos maquiagem.

aconteceu no Reino Unido
aconteceu no Reino Unido