Operação da PF revelou que o tráfico de drogas estava por trás do golpe no Paraguai. E aqui? Por Rodrigo Luis Velloso

Atualizado em 20 de novembro de 2019 às 7:47
Dario Messer e Horacio Cartes (Reprodução)
POR RODRIGO LUIS VELLOSO

Em 2012, um roteiro bizarro culminou no impeachment do então presidente do Paraguai, Fernando Lugo.
O movimento sem-terra “Campos Morombi” invadiu um latifúndio improdutivo no interior do país, que pertencia a um ex-senador do Partido Colorado, para reclamar a necessidade de reforma agrária.

Em seguida, sob pressão de boa parte da elite local, o governo designou uma operação policial para reintegração de posse do terreno. E o resultado foi uma tragédia que deixou 17 mortos, 11 militantes e 6 policiais, gerando um abalo na política do país.

De um lado, extremistas de direita acusavam o governo – que até ali apresentava bons índices de crescimento e melhora da qualidade de vida, sobretudo entre os mais pobres – de se mancomunar com grupos guerrilheiros esquerdistas ligados às FARC.

Para eles, Lugo e seus aliados na América do Sul representavam um risco para democracia, refletido na ação de emboscada dos sem-terra à polícia.

Do outro, movimentos sociais apresentavam indícios de que a operação havia sido tramada para enfraquecer o presidente, como fotos dos campesinos com sinais de execução sumária e rastros prováveis da participação de terceiros (além deles e dos policiais).

Nunca se realizou perícia técnica no local, nem filmagem de nada do que ocorreu.

Primeiro líder de esquerda eleito no Paraguai e o primeiro oposicionista a vencer depois de mais de 60 anos de domínio do Partido Colorado, o ex-bispo ligado à teologia da libertação Fernando Lugo acabou sofrendo um impeachment-relâmpago, aprovado no Senado dominado pela oposição de direita, em uma manobra amplamente rechaçada como golpe na região e na Europa.

Ele foi sucedido na eleição imediatamente seguinte por um empresário milionário, justamente do Partido Colorado, e que havia se tornado forte principalmente pela influência que detinha junto ao empresariado e à mídia local.

Seu nome? Horácio Cartes.

Exatamente o mesmo que teve ordem de prisão emitida no Brasil esta terça-feira (19) no âmbito da Operação Patrón (braço da Lava-Jato), que investiga as relações do doleiro Dario Messer com crime organizado.

Entre as suspeitas, baseadas em monitoramentos de mais de 20 anos do governo americano na tríplice fronteira, lavagem de dinheiro para traficantes de drogas e armas e contrabando, inclusive para o PCC.

Segundo a Polícia Federal do Brasil, Cartes mantinha contato direto com o doleiro Messer durante todo período em que este esteve foragido da justiça brasileira, e articulava toda proteção institucional que ele precisava para se manter anônimo no Paraguai.

Os dois seriam conhecidos desde que o pai de Messer ajudou Cartes na década de 1990 durante suspeitas de lavagem de dinheiro.

Cartes também foi decisivo no último escândalo da política paraguaia, em que o atual presidente Mario Abdo Benítez, do mesmo Partido Colorado, foi acusado de favorecer o Brasil (e o governo Bolsonaro) em uma renegociação imprevista do acordo sobre a usina binacional de Itaipu.

Ele usou toda sua força política para barrar o que poderia ser um novo impeachment e manter Benítez no cargo.
Agora seus advogados trabalharão em duas frentes. Por um lado para tentar anular a decisão no Brasil, onde o impeachment de Lugo serviu de modelo para derrubar Dilma nos anos seguintes, e pelo outro, para evitar uma possível extradição.

Ao mesmo tempo, os paraguaios assistem perplexos um ex-presidente e nome forte da atual gestão ser tragado para uma condenação gravíssima.