Bolsonaro e o “Orgulho de ser Hétero”

Atualizado em 1 de maio de 2015 às 1:20
Jair Bolsonaro
Jair Bolsonaro

Há cerca de dois meses, uma amiga enviou-me uma imagem. Dentro de um carro, armas. “Direitos humanos? Desconheço essas palavras”, afirmava. Era da página Orgulho de ser hétero – que, para mim, poderia ser classificada facilmente como uma das mais odiáveis do Facebook – e comportava a segunte legenda: “Direitos humanos para humanos direitos”.

Orgulho de ser hétero, página cuja imbecilidade já se faz visível pelo próprio nome, consiste em um apanhado de considerações extremamente machistas, homofóbicas e violentas, que partem do belo pressuposto de que, em poucas palavras, as minorias oprimem as maiorias.

Feministas, dizem, não reconhecem os inúmeros benefícios do machismo. Um deles? No momento em que o Titanic estava prestes a afundar, o machismo salvou a vida das mulheres. Homens e – o que é ainda mais trágico – mulheres curtem, compartilham e aplaudem esse tipo de loucura. Eu me pergunto se tais pessoas realmente acreditam que o machismo é uma bênção para as mulheres. “Se você acredita nisso”, diria o duque de Wellington, “acredita em tudo”.

Os mais exaltados defendem que o direito ao voto por parte das mulheres não foi fruto da luta de sufragistas como Emily Davison, Elizabeth Cady Stanton, Emmeline Pankhurst, entre outras – e sim um presente generoso concedido pelos homens, sempre prestativos e magnânimos.

Suponho que essas mesmas pessoas vejam a abolição da escravatura no Brasil como um doce momento de bondade heróica da parte da princesa Isabel.

Muito bem. Faço o possível para manter-me afastada de páginas que destilam ódio, mas um vídeo compartilhado por um conhecido capturou a minha atenção.

Nele, Jair Bolsonaro respondia as questões a seguir, enviadas por uma internauta: “O que o senhor acha dos políticos enrustidos? Há políticos enrustidos na câmara? O senhor se encaixa entre eles?”. Perguntas indelicadas muitas vezes resultam em respostas indelicadas, mas nenhuma indelicadeza poderia justificar a resposta do deputado. Se não fosse casado, avisa, responderia pessoalmente – e a internauta entenderia a diferença entre transar com um “homem” e com um “homossexual”. E, se fosse obrigado a provar sua virilidade, colocaria uma cama no Maracanã e transaria publicamente com a irmã ou com a mãe da jovem.

Algumas questões devem ser levadas em conta.

Antes de mais nada, a distinção entre “homem” e “homossexual”. Aparentemente, na limitada visão de Bolsonaro e de seus seguidores, a homossexualidade priva um homem de sua masculinidade – o que é uma ideia completamente equivocada. A não ser que o homossexual em questão enxergue a si próprio como mulher e deseje ser visto como tal, ele é tão homem quanto qualquer outro.

Em segundo lugar, temos a questão da objetificação da mulher, que é combinada ao seguinte: para provar sua masculinidade, é necessário que um homem a domine sexualmente.

Quanto a isso, eu poderia repetir a frase de Wellington, mas não seria o bastante. Quem acredita nisso não só acredita em tudo, mas ignora a sexualidade gerada, acalentada e incentivada por esse tipo de concepção: violenta, impessoal, desprezível e, verdade seja dita, desqualificada.

Camila Nogueira
Aos 19 anos, Camila Nogueira estuda Letras na USP. Já aos 10 anos, constatou que seus maiores interesses na vida consistiam em sua família, em cerejas e em Machado de Assis. Em uma etapa posterior, adicionou à sua lista ópera italiana e artistas coreanos.