A cirurgiã-dentista Paloma Vieira passou os últimos sete dos seus 24 anos se dedicando ao estudo e à prática da odontologia. Começou com 18 anos a faculdade (2017), se formou aos 22, e agora especializa-se em Harmonização Orofacial. Como ela mesma explica à reportagem, esta é a área da odontologia responsável por buscar o equilíbrio entre a relação estética, funcional do rosto e sorriso do paciente.
“Através de alguns procedimentos, é possível corrigir assimetrias, melhorar algumas proporções faciais e a qualidade de pele do paciente. Dentro da Harmonização são realizados diversos procedimentos indicados para cada caso do paciente, tais como bioestimulador de colágeno, fios faciais, preenchedores, toxina botulínica, microagulhamento entre outros”, conta.
Faz três anos que a doutora Paloma incluiu em sua agenda de trabalho mais uma atividade: a de digital influencer, contando com cerca de 300 mil seguidores em suas redes sociais.
O dinheiro que entra com essa atividade é utilizado por Paloma em seus gastos pessoais, enquanto os recursos advindos de sua atividade como dentista são integralmente revertidos para as despesas e compra de materiais do próprio consultório de Paloma, ainda em começo de carreira, instalada profissionalmente na mesma cidade em que vive, Itajaí, no litoral catarinense, região do Vale do Rio de mesmo nome.
Assim, as horas de atendimento clínico de Paloma se transformaram em ácidos fosfóricos, tubos de ensaio para PRP (plasma rico em plaquetas), espátula de resina e a própria resina, kit clínico e toda a sorte de insumos necessários para a prática odontológica.
Além disso, foi por meio de sua atividade digital que foi convidada, em 2020, a participar do concurso de “Miss Santa Catarina de Las Americas” e também o de “Miss Brasil de Las Americas”. Ela venceu o primeiro e foi vice no segundo.
Há três anos, também, Paloma se dedicava a um relacionamento. Primeiro um namoro, depois, virou noivado, em 2023. Seu (ex-)noivo é Matheus Jorge da Silva. Ele é estudante de odontologia. Dentre os planos, incluía-se o de atuarem juntos no consultório de Paloma, depois que ele se formasse. A mãe de Matheus, Marcia Almeida da Silva, inclusive, chegou a adquirir uma cadeira de atendimento odontológico para o consultório, que Paloma, prontamente colocou em uso.
Há dois meses, porém, esses planos foram desfeitos por Matheus, que terminou o relacionamento após uma sessão de treino na academia, sentado no banquinho do lado de fora do estabelecimento.
Foram mais alguns dias até que Paloma recebesse mensagem da mãe de Matheus, perguntando se o filho poderia seguir esperando trabalhar com a dentista em seu consultório assim que viesse a se formar. A cirurgiã disse que não, ainda enquanto processava aquele término repentino de noivado.
A ex-sogra quis então saber da cadeira, e então combinaram de colocar seus advogados para decidir a forma como avaliar e realizar a devolução do bem. Isso faz duas semanas.
Há dez dias, Matheus se cansou de esperar e foi, junto com seu pai, ao consultório de Paloma. Invadiram o local e tirram dali não apenas a cadeira de cirurgiã dentista, mas tudo que conseguiram carregar.
O pai de Matheus é o empresário Laureci Jorge da Silva, conhecido na cidade como o “Ci da Embramel”, nome da rede de lojas de autopeças que detém. Tanto a empresa como seu dono abraçaram com afinco as recentes campanhas patrióticas que tiveram lugar no município catarinense. Abaixo, a foto do empresário e a reprodução de uma das muitas postagens de cunho patriótico publicadas pela empresa da família de Matheus.
Então, no sábado retrasado, sem saber que Paloma havia instalado uma câmera de segurança em seu consultório, foram lá pai e filho, junto com um chaveiro, arrombaram a porta e, diante da câmera de segurança que em dado momento Matheus avistou, só para imediatamente ir ao seu encontro para impedir a gravação, levaram tudo dali.
A cadeira, algumas gavetas dos móveis, carrinho auxiliar com materiais odontológicos, maquinários odontológicos, lixo sob medida da gaveta que separava resíduo infectante do comum, tudo que conseguiram carregar na Van da empresa Embramel que foi destacada para o saque. Veja o vídeo abaixo. Aos 35 segundos, Matheus identifica a câmera e desliga o aparelho. Ligo depois, o ex-noivo é filmado descendo as escadas do consultório, e, finalmente, as últimas imagens, foram gravadas por ela própria, Paloma, enquanto chorava.
Um boletim de ocorrência por furto qualificado foi prontamente lavrado pela vítima, Paloma, que ouviu da Polícia Militar de Santa Catarina que seriam abertos procedimentos investigativos no âmbito da Polícia Civil de Santa Catarina. Ela espera até hoje qualquer notícia.
Enquanto isso, solicitou e obteve na Justiça uma medida protetiva contra o ex-noivo e seu pai empresário. Na decisão, o Juizado Especial Criminal e de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Itajaí destacou:
“Em razão do término do relacionamento, sem permissão da ofendida, os requeridos teriam adentrado no consultório odontológico e de lá retirado instrumentos de trabalho. Isso, em perspectiva, constituiu violência patrimonial, na linha do art. 7º, IV, da Lei Maria da Penha e, ademais, a vulnerabilidade da ofendida perante os requeridos, pelo contexto apresentado, é evidente.(…)
Caracterizada, pois, em perspectiva, a violência doméstica baseada no gênero – violência patrimonial -, ocorrida no
âmbito de relação íntima de afeto. Já o perigo na demora resplandece. Afinal, a manutenção do contato coloca a requerente “em situação ainda mais vulnerável e atenta contra o princípio da proteção integral da mulher submetida à violência”.
Ante o exposto, porque presentes os requisitos, defiro o pedido formulado, para aplicar as seguintes medidas protetivas
de urgência em benefício de PALOMA FIAMA TRIERWEILER VIEIRA: (1) proibição de qualquer tipo de contato direto ou
indireto com a vítima, inclusive por telefone, mensagens, email ou redes sociais, ainda que por intermédio de outras pessoas; (2) proibição de aproximar-se fisicamente dela, devendo manter uma distância mínima de 500 metros; (3) proibição de aproximar-se da residência e, durante o expediente, do local de trabalho dela.
Paloma Vieira conversou com a reportagem sobre todo o ocorrido. Uma conversa cortada por lágrimas, tristeza e soluços. Quem também falou com o DCM foi a advogada Daniela de Lima, representante legal da cirurgiã-dentista. Veja abaixo as perguntas e respostas enviadas.
DCM – A sua cliente pretende tomar algum tipo de ação judicial para reaver os bens tomados ou o valor correspondente a eles?
Advogada Daniela de Lima – Existe essa possibilidade, ocorreu um arrombamento e invasão ao seu consultório, que foi parcialmente depredado. Mas acredito que a melhor alternativa é o diálogo é um possível acordo entre as partes para que ela possa ser devidamente indenizada pelos danos causados.
A senhora está em contato com os invasores a fim de chegar a algum tipo de solução amigável?
Na realidade havia um diálogo com a advogada da parte contrária e estávamos ajustando nossas agendas para em conjunto analisar a melhor alternativa para todos. Infelizmente em seguida ocorreu essa situação criminosa é lamentável.
Há algum tipo de direito dos invasores sobre a propriedade dos bens que foram levados? Há algum tipo de dívida ou obrigação de sua cliente aos acusados que pudesse justificar a tomada dos bens?
A cadeira do consultório foi paga mãe de Matheus, e a minha cliente tem ciencia disso e justamente buscou alternativas para pagar essa dívida. Não existe qualquer direito sobre os bens do consultório, o consultório é da minha cliente.
A sua cliente sofreu abalo emocional em virtude dos fatos ocorridos? Se sim, estuda ingressar com uma ação indenizatória por danos morais?
Sim sofreu abalo emocional, chora copiosamente e talvez precise de algum acompanhamento psicológico. A intenção é, como já disse, que possam realizar um acordo sobre os danos materiais e morais, mas nunca descartando a possibilidade de se buscar a tutela jurisdicional do Estado, não apenas na esfera civil, mas sobretudo criminal.
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A reportagem também procurou Matheus Jorge Silva, para que ele pudesse dar suas versões sobre os fatos. Foram enviadas umas série de perguntas ao estudante, tais como por que tinha cometido a invasão e se entendia ter direito sobre os bens apropriados. O ex-noivo da vítima leu as perguntas e respondeu apenas com o envio de um link sem qualquer conteúdo identificável. Caso ele venha a se pronunciar, sua resposta será incluída nesta página.
Atualização: um dia após a publicação desta reportagem, uma pessoa que se identificou apenas com um sobrenome, dizendo-se advogado de Matheus, enviou a mensagem que segue à reportagem:
“Lamentamos a postagem feita sem a oitiva da parte…
Entendemos inclusive, ofensiva e mentirosa as colocações no texto! (sic)
Tomaremos as medidas cabíveis para o caso.
Att.
Dr. Righetto, advogado!”