
As convocações para os atos terroristas promovidos por bolsonaristas nas sedes dos Três Poderes em Brasília, no dia 8 de janeiro, que completará um ano na próxima segunda-feira, destacaram-se pela estratégia de comunicação discreta e pelo uso das redes sociais.
Poucos dias antes dos ataques, simpatizante do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) adotaram a expressão “Festa da Selma”, possivelmente relacionada à saudação militar “selva”, entre outros símbolos, para disseminar discretamente a manifestação na capital federal.
Luis Fakhouri, diretor de estratégia da Palver, empresa de análise de dados que monitorou as postagens nos grupos bolsonaristas à época, ressaltou que influenciadores digitais desempenharam um papel central ao unir os apoiadores durante o silêncio e as teorias conspiratórias de Bolsonaro.
“Havia uma estratégia de confusão. As pessoas estavam sedentas por alguma informação que alimentasse a esperança para continuar. O silêncio de Bolsonaro foi conveniente para essa extrema direita se manter acesa. A “Festa da Selma” se insere nesse contexto, de alimentar esse sentimento nas pessoas”, disse Fakhouri ao jornal O Globo.
A dinâmica foi tão relevante nos eventos que culminaram no 8 de janeiro que se tornou uma das linhas de investigação sobre os atos golpistas. Em agosto, a Polícia Federal (PF) desencadeou a Operação Lesa Pátria, focada em suspeitos de promover o movimento vinculado ao código bolsonarista.

Durante a ação, foram executados dez mandados de prisão e outros 16 de busca e apreensão. Segundo a investigação da PF, a expressão foi utilizada “para convocar e coordenar o transporte para as invasões” e “compartilhar coordenadas e instruções detalhadas para os atos”.
Instruções para a invasão a prédios públicos predominaram nos conteúdos circulados no WhatsApp antes dos ataques em Brasília. Um dos posts mais difundidos trazia um guia sobre como proceder durante a invasão aos Poderes.
“Jamais iniciem a invasão sem haver uma multidão que tome todos os 3 poderes ao mesmo tempo, ou seja, só iniciem a invasão aos 3 poderes quando houver patriotas o suficiente pra invadir tudo!”, dizia um trecho.
Um relatório publicado em fevereiro do ano passado por pesquisadores da UFBA e UFSC, com apoio do InternetLab, identificou pelo menos 176 ocorrências da expressão “Festa da Selma” no Telegram, de 1º a 8 de janeiro de 2023, em uma base de dados de 1.500 grupos e canais abertos.
A primeira menção aconteceu na noite de 4 de janeiro de 2023 em um grupo com mais de 13 mil inscritos. O vídeo em questão, produzido pelo influenciador bolsonarista Rodrigo Lima, trata dos “ingredientes da festa da Selma”.
“Tem que ter açúcar união, tem que ser esse açúcar. Açúcar união, tá, porque estavam fazendo um outro tipo de açúcar não dá certo, açúcar união, tem que ter organização que vai começar agora sábado que é a pré-festa da Selma, e a gente na hora da festa, a gente tem que ter cinco isso, espigas de milho, cinco milho, pra festa ser um sucesso”, afirmou no vídeo.
RECEITA DA FESTA, açúcar UNIÃO, ORGANIZAÇÃO dos ingredientes,5 espigas de MILHO,ENTENDERAM.??AI A FESTA DA SELMA VAI SER MARAVILHOSA. pic.twitter.com/OYUgM6Gixt
— Sueli Floeter (@FloeterSueli) January 6, 2023
Vale destacar que Lima, ex-secretário de comunicação da Prefeitura de Bayeux (PB), foi preso em agosto como parte da Operação Lesa Pátria e liberado em dezembro por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A defesa de Lima afirmou, em agosto ao G1, que ele “não participou dos atos ocorridos no dia 8 de janeiro” e questionou sua prisão preventiva, revertida posteriormente. Além disso, ele está proibido de usar redes sociais, por determinação de Moraes.