Grandes Personagens da Literatura: Carmilla, a vampira lésbica, é a quinta da lista

Atualizado em 9 de janeiro de 2013 às 13:10

Carmilla e Laura, numa ilustração contemporânea

Carmilla,  livro do escritor irlandês Joseph Sheridan Le Fanu publicado em 1872, foi um dos precursores de um gênero que conquistaria para sempre o coração — e o sobressalto — de leitores de todo o mundo: o dos vampiros. Antecedeu em muitos anos, e influenciou fortemente, o Drácula de Bram Stoker. Isso mostra a importância do romance e da personagem que lhe dá nome. Carmilla é uma vampira de beleza extraordinária que se apaixona por sua vítima, Laura. É Laura a narradora.

Laura vivia uma existência solitária na Áustria. Morava em um castelo na companhia de seu pai e de algumas empregadas. Certo dia, há um acidente de carruagem nas redondezas, e uma jovem se fere. A mãe da moça diz que precisa ir embora imediatamente, e que voltará em breve.

A garota em questão é Carmilla, que a narradora descreve como dona de um rosto anormalmente belo e uma expressão melancólica. Quase que instantaneamente, ela reconhece a moça: anos antes, teve um sonho no qual uma jovem a segurou nos braços e cravou os dentes em sua garganta. Carmilla afirma que também sonhou com ela. As duas se tornam inseparáveis.

Há, na relação entre Laura e Carmilla, um lesbianismo latente extremamente ousado para os rígidos padrões morais da Inglaterra vitoriana. Laura admite que estava consciente de um amor que se intensificava até a adoração, mas também de algo aversivo que não conseguia entender. Num trecho do livro, Laura afirma: “Corava levemente, fitava meu rosto com os olhos lânguidos e ardentes, respirando tão ofegante que seu vestido subia e descia com o atribulado fôlego. Era como o ardor de um amante, e isso me constrangia; era uma sensação odiosa e no entanto arrebatadora. Com o olhar triunfante, ela me puxava, e seus lábios quentes passeavam em beijos pelo meu rosto. Então sussurrava: Você é minha, você será minha, você e eu seremos uma só para sempre”.

Outra fala de Laura sobre Carmilla: “Como ela estava linda à luz do luar! Era tímido e estranho o olhar com que de repente escondeu o rosto no meu pescoço e nos meus cabelos, com violentos suspiros que até pareciam soluços, e apertou minha mão com a dela, que tremia. Sua face macia ardia contra a minha. Querida, querida, ela murmurou, eu vivo em você, e você morreria por mim! Eu a amo tanto!”.

O tempo vai passando. Pessoas na vila vão morrendo. Carmilla está cada vez mais saudável e mais corada. Sua mãe não aparece, e o mistério quanto ao passado da jovem vai aumentando. É importante ressaltar que, antes de receber a visita de Carmilla, Laura esperava outra amiga. Tal amiga morreu de enfermidade desconhecida algum tempo de começar a conviver com uma garota chamada Millarca.

Millarca, Laura acaba sabendo, era estranhamente parecida com Carmilla — a mesma obsessão romântica, a mesma figura lânguida e espectral, os mesmos cabelos cor de ouro. Por fim, ela cai em si. A semelhança de nomes não é à toa; Mircalla é Carmilla, e  conquistava suas vítimas para depois matá-las lentamente.

Laura explica a atração que Millarca tinha por ela da seguinte maneira: “O vampiro tende a ficar fascinado, com uma intensidade absorvente que lembra a paixão, por uma determinada pessoa. (…) Nunca desiste até saciar sua paixão, sugando a própria vida de sua cobiçada vítima. Nesses casos, porém, ele poupará e prolongará seu prazer assassino com o requinte de um especialista, e o intensificará com os progressivos ataques de um cortejar malicioso”.

Laura acaba escapando de Carmilla – mas esta acabou ficando eternamente jovem e bela e sedutora nas páginas do pequeno grande livro que leva seu nome.

Camila Nogueira
Aos 19 anos, Camila Nogueira estuda Letras na USP. Já aos 10 anos, constatou que seus maiores interesses na vida consistiam em sua família, em cerejas e em Machado de Assis. Em uma etapa posterior, adicionou à sua lista ópera italiana e artistas coreanos.