
Por Leonardo Sakamoto, no UOL
O deputado federal Gilvan da Federal (PL-ES) disse três vezes, nesta terça (8), que quer que o presidente Lula morra, durante uma sessão da Comissão de Segurança Pública da Câmara. Desconhecido da maioria do público que usa garfo e faca, ele consegue minutos de fama ajudando a espalhar esse tipo de ódio. Mas o caso tem um efeito rebote e ajuda a jogar água fria no ânimo do Congresso para apressar a anistia aos golpistas que ele tanto defende.
Troquei mensagens com quatro deputados ontem, dois dos quais não são de partidos fiéis ao governo, todos líderes em suas agremiações, que lamentaram as declarações do colega e, com algumas variações, disseram que elas são fruto do caldo político que vivemos hoje. Os quatro afirmaram que isso reforça que não é a hora de discutir um tema como a anistia e que o parlamento tem coisas mais importantes a tratar.
Trava-se uma discussão nas redes se o que ele disse seria considerado quebra de decoro, pois entre desejo e ação há um abismo. Líderes políticos, sociais ou religiosos afirmam que nunca incitam a violência direta através de suas palavras. Porém, suas mãos não seguram a faca ou o revólver, mas é a sobreposição de seus argumentos e a escolha que fazem das palavras ao longo do tempo que distorce a visão de mundo de seus seguidores e torna o ato de esfaquear e atirar banal. Ou, melhor dizendo, “necessário”.
Suas ações e regras redefinem, lentamente, o que é ética e esteticamente aceitável, visão que depois será consumida e praticada por terceiros. Estes acreditarão estarem fazendo o certo, quase em uma missão civilizatória ou divina.
A questão é que, no caso de Gilvan, as palavras juntam-se à ação. Ele é relator de uma proposta, aprovada na comissão, para desarmar a segurança pessoal de Lula. Ou seja, semeia ódio de um lado e facilita o ataque, de outro. O projeto não vai ser aprovado no Congresso, mas é indicador do que acontece quando comportamentos violentos são tolerados em nome da liberdade de expressão.
URGENTE: o deputado Gilvan da Federal DEFENDEU A MORTE DO PRESIDENTE LULA. Isso em um contexto em que ele e outros deputados estão tentando tirar as armas da segurança pessoal do presidente. É o mesmo grupo político, que segundo relatório da Polícia Federal, planejou matar o… pic.twitter.com/P3Y7BkF7Q5
— Vinicios Betiol (@vinicios_betiol) April 8, 2025
As declarações, que podem ter criado orgasmos em parte da extrema direita, têm um efeito rebote imediato, contudo, como visto pelos comentários dos parlamentares.
Parte da Câmara está com bode do bolsonarismo por chantagear deputados pela votação do PL da Anistia – que quer perdoar a tentativa de golpe do ex-presidente Jair Bolsonaro (antes mesmo de sua condenação pelo STF), usando os executores do 8 de janeiro de 2023 como justificativa.
O surto do deputado capixaba só reforça que perdoar algo como o plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa o assassinato de Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes como parte da ação golpista, e só não foi concretizado porque, aos 45 do segundo tempo, deu chabú, é pedir para ele ser posto em prática novamente no futuro.
A execução, seja de um líder de direita, seja de um de esquerda, não pode ser instrumento de disputa política, mas infelizmente têm sido. Houve a morte de Marielle Franco, a tentativa de assassinato de Bolsonaro e tiros contra a caravana de Lula em 2018. Brasileiros mataram brasileiros por disputa eleitoral, em 2022, como o bolsonarista Jorge Guaranho que invadiu a festa de aniversário do petista Marcelo Arruda e o executou em Foz do Iguaçu.
Qualquer marmota que estuda ultrapolarização sabe que um dos mecanismos mais eficazes de reduzir a violência é seguidores verem seus líderes parar de desumanizar e incitar ódio contra os adversários. E Gilvan foi na contramão disso. Não vai, com isso, colocar a vida de Lula em risco, mas ironicamente ajudou a manter como morta-viva a anistia que tanto defende.
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