Raoni lança biografia e diz que prepara sucessor

Atualizado em 28 de junho de 2025 às 19:14
Raoni Metyktire. Foto: Domingos Peixoto

O líder indígena Raoni Metyktire, símbolo da luta pela preservação da Amazônia e dos direitos dos povos originários, lança a biografia “Memórias do cacique” (Companhia das Letras), uma coletânea de relatos feitos entre 2020 e 2023 com a ajuda dos netos.

Gravadas em sua língua nativa, as entrevistas foram traduzidas ao português para cumprir o desejo do cacique de registrar em livro sua história, ensinamentos e visão de mundo. Aos cerca de 90 anos, Raoni também revelou ao Globo que irá anunciar seu sucessor em agosto: “Esse sucessor tem que ter o compromisso de continuar o meu trabalho, a minha luta”, declarou em videochamada.

Tradição oral e cosmovisão indígena guiam a narrativa

A obra segue a tradição dos Mebêngôkre (Kayapó), povo ao qual Raoni pertence, valorizando a oralidade e os ensinamentos espirituais. Ao longo das páginas, o cacique revisita sua infância, seu primeiro cocar com penas de japu e a relação com sua companheira Bekwyjkà, com quem viveu por quase 70 anos.

Reunidos com seus tàpdjw (netos), Raoni Metyktire em uma das entrevistas que deram origem ao livro ‘Memórias do Cacique’. Foto: Divulgação/Simone Giovine

A narrativa mescla memórias de vida, visões míticas e episódios históricos, como sua atuação na Constituinte de 1988 ao lado de Mario Juruna e Paulinho Paiakan, sua amizade com Sting e seu papel na demarcação de terras indígenas. A mágoa com Lula por não ter impedido Belo Monte também é registrada.

Visões, críticas aos “brancos” e alerta sobre o futuro da Terra

Além de encontros com papas, presidentes e reis, Raoni revela episódios curiosos, como quando foi convocado para ajudar na busca por Che Guevara, e relata sonhos com Jair Bolsonaro.

Ele critica fortemente a destruição ambiental causada pelos “brancos” e compartilha alertas recebidos em sonhos: “A Terra pode ter problemas sérios, a Terra pode não ser mais normal. Os espíritos já mostraram isso para mim”. Para Raoni, preservar a floresta é uma obrigação sagrada, transmitida pelos criadores do mundo, e não apenas uma causa política.

Produção da obra envolveu netos e antropólogos

A edição da biografia foi organizada pelo antropólogo Fernando Niemeyer, com apoio de especialistas como Vanessa Lea e Gustaaf Verswijver. O livro conta com glossário, cronologia e mapas para contextualizar os relatos. Segundo Raoni, o objetivo da obra é também inspirar as novas gerações indígenas: “Eu penso que os jovens vão continuar lutando pela floresta, pela vida, pela comunidade indígena. Nós vamos continuar resistindo e existindo”, concluiu.