
Por Manus AI, em O Cafezinho
A inflação de alimentos no Brasil apresenta sinais consistentes de arrefecimento, conforme revelam os dados mais recentes do Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) da Fundação Getulio Vargas. O movimento de queda, que se intensificou em junho de 2025, é liderado pelo Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA-DI), componente que representa mais de 60% do IGP-DI e funciona como termômetro antecipado das tendências inflacionárias que posteriormente se refletem no varejo.
Os números de junho trouxeram alívio significativo para um país que carrega na memória coletiva as cicatrizes da hiperinflação. O IPA-DI registrou queda de 2,72% no mês, aprofundando a trajetória descendente iniciada em maio, quando havia recuado 1,38%. Em termos anualizados, o índice acumula alta de apenas 3,23% em 12 meses, patamar que não se observava há anos e que sinaliza uma mudança estrutural no comportamento dos preços no atacado.
O peso do IPA-DI na economia brasileira
O Índice de Preços ao Produtor Amplo – Disponibilidade Interna não é apenas mais um indicador econômico. Com participação de 60% na composição do IGP-DI, ele representa o termômetro mais sensível das pressões inflacionárias que se originam no setor produtivo e atacadista. Sua importância transcende os números: funciona como um radar antecipado das tendências que, meses depois, chegam às prateleiras dos supermercados e ao bolso do consumidor final.
A relevância do IPA-DI reside em sua capacidade de capturar as variações de preços em diferentes estágios da cadeia produtiva. Desde as matérias-primas brutas até os bens finais destinados ao consumo, o índice oferece uma radiografia completa dos movimentos de preços no atacado. Quando o IPA-DI apresenta quedas consistentes, como observado nos últimos meses, isso indica que as pressões inflacionárias estão se dissipando na origem, criando condições favoráveis para a estabilidade de preços no varejo.

A trajetória mensal do IPA-DI em 2025 revela uma mudança de direção que se tornou mais evidente a partir de março. Após registrar alta de 1,03% em fevereiro, o índice iniciou um movimento de correção que se intensificou nos meses seguintes. A queda de 2,72% em junho representa o maior recuo mensal desde o início do ano, consolidando uma tendência que já havia se manifestado em maio com a retração de 1,38%.

O comportamento do IPA-DI em base anualizada oferece uma perspectiva ainda mais reveladora. O índice, que chegou a acumular alta de 10,36% em 12 meses durante fevereiro, apresentou desaceleração consistente nos meses subsequentes. A queda para 3,23% em junho representa uma redução de mais de 7 pontos percentuais em apenas quatro meses, sinalizando uma mudança estrutural no comportamento dos preços no atacado.
A anatomia da queda: matérias-primas lideram o movimento
A decomposição do IPA-DI por estágios de processamento revela que o movimento de queda tem origem nas matérias-primas brutas, segmento que registrou retração de 4,95% em junho. Esse comportamento é particularmente significativo porque as matérias-primas funcionam como o primeiro elo da cadeia produtiva, e suas variações tendem a se propagar para os demais estágios nos meses seguintes.
Matheus Dias, economista do FGV IBRE, destaca que “as matérias-primas brutas explicam a queda da taxa de variação do IPA, índice de maior peso no IGP-DI”. Entre os produtos que mais contribuíram para essa dinâmica, o café se destaca com quedas expressivas nos preços ao produtor. Essa redução já começa a se refletir nos preços do varejo, inicialmente com uma desaceleração mais acentuada da inflação do produto.
O minério de ferro, insumo básico na produção de aço, também apresentou quedas significativas. Segundo Dias, essas reduções “têm ocasionado repasses menores nos materiais metálicos para estruturas no INCC”, demonstrando como a deflação nas matérias-primas se propaga através da cadeia produtiva.
Sinais antecipados: do atacado ao varejo
A importância do IPA-DI como indicador antecipado fica evidente quando se observa sua relação com outros índices de preços. Enquanto o IPA-DI já apresenta quedas consistentes, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que compõe 30% do IGP-DI, ainda registra variações positivas, embora em desaceleração. Em junho, o IPC avançou 0,16%, uma redução significativa em relação aos 0,34% de maio.
Essa defasagem temporal é natural e esperada. Os preços no atacado, captados pelo IPA-DI, tendem a se refletir no varejo com alguns meses de atraso. A atual trajetória descendente do IPA-DI sugere que os consumidores devem começar a sentir os efeitos da deflação de alimentos nos próximos meses, especialmente em produtos básicos como café, óleos vegetais e proteínas.
A análise por classes de despesa do IPC já oferece pistas dessa transição. O grupo Alimentação, que havia registrado alta de 0,29% em maio, apresentou queda de 0,19% em junho, sinalizando que a deflação observada no atacado começa a chegar às prateleiras dos supermercados.
O contexto das commodities globais
A queda dos preços de alimentos no Brasil não ocorre em um vácuo. O movimento reflete, em grande medida, a dinâmica global das commodities, que atravessam um período de correção após os picos observados nos anos anteriores. Segundo projeções do Banco Mundial, os preços globais das commodities devem cair 12% em 2025, atingindo níveis não vistos desde 2020.
Essa tendência global encontra eco na economia brasileira através de diferentes canais. O café, commodity na qual o Brasil é líder mundial, tem seus preços internacionais influenciados por fatores como condições climáticas, estoques globais e demanda internacional. A atual queda nos preços ao produtor reflete, em parte, uma normalização após períodos de alta volatilidade.
A dimensão psicológica da inflação no Brasil
Para compreender plenamente o significado da atual queda na inflação de alimentos, é necessário considerar a dimensão psicológica que a inflação ocupa na sociedade brasileira. O país carrega na memória coletiva as cicatrizes profundas da hiperinflação que marcou as décadas de 1980 e 1990, período em que os preços chegaram a variar diariamente e a moeda perdeu sua função básica de reserva de valor.
Esse trauma histórico criou uma sensibilidade particular dos brasileiros em relação à inflação. Diferentemente de outros países onde a estabilidade de preços é vista como natural, no Brasil a inflação permanece como uma preocupação constante, influenciando desde decisões de consumo até avaliações políticas. A memória da hiperinflação, quando o IGP-DI chegou a registrar variações mensais superiores a 80%, ainda ecoa na psicologia coletiva.
Essa sensibilidade se reflete na importância que os indicadores de preços assumem no debate público brasileiro. Variações que em outros países passariam despercebidas ganham destaque na mídia e influenciam a percepção sobre a competência econômica dos governos. A inflação, mais do que um fenômeno econômico, tornou-se um termômetro político, capaz de influenciar avaliações governamentais e expectativas eleitorais.
A atual trajetória de queda da inflação de alimentos ocorre em um contexto político particular. Fontes próximas ao Banco Central indicam que o presidente da instituição, Gabriel Galípolo, está empenhado em consolidar a estabilidade de preços como forma de contribuir para a estabilidade econômica do país. Essa postura reflete o entendimento de que o controle inflacionário transcende questões técnicas, assumindo dimensões políticas e sociais.
A queda da inflação de alimentos tem potencial para gerar efeitos positivos em múltiplas dimensões. Do ponto de vista econômico, a redução das pressões inflacionárias pode criar espaço para políticas monetárias mais flexíveis, favorecendo o crescimento econômico. Do ponto de vista social, a estabilidade dos preços de alimentos beneficia diretamente as famílias de menor renda, que destinam uma parcela maior de sua renda para alimentação.
Perspectivas e desafios futuros
Embora os dados recentes sejam encorajadores, a consolidação da tendência deflacionária enfrenta desafios importantes. O cenário internacional permanece volátil, com riscos geopolíticos que podem afetar os preços das commodities. Mudanças nas condições climáticas, alterações na demanda global ou tensões comerciais podem reverter rapidamente a atual trajetória de queda dos preços.
No âmbito doméstico, a sustentabilidade da deflação de alimentos depende da manutenção de políticas econômicas consistentes. A estabilidade cambial, o controle fiscal e a coordenação entre as políticas monetária e fiscal são elementos fundamentais para que a atual tendência se consolide.
Conclusão: um novo capítulo na história inflacionária brasileira
A queda da inflação de alimentos, liderada pelo comportamento do IPA-DI, representa mais do que uma simples correção estatística. Simboliza a possibilidade de um novo capítulo na relação do Brasil com a estabilidade de preços, superando gradualmente os traumas do passado e construindo uma base sólida para o crescimento econômico sustentável.
Os dados de junho de 2025 oferecem motivos para otimismo cauteloso. A queda de 2,72% no IPA-DI, a redução do índice anualizado para 3,23% e os sinais de que essa deflação começa a chegar ao varejo sugerem que o país pode estar entrando em um período de maior estabilidade de preços.
Para uma sociedade que carrega na memória as cicatrizes da hiperinflação, cada mês de deflação representa não apenas um alívio econômico, mas também um passo na direção de uma normalidade que por muito tempo pareceu inalcançável. A queda da inflação de alimentos, segundo os dados da FGV, pode estar sinalizando que essa normalidade está finalmente ao alcance.