Trump, tarifas e o fantasma do BRICS. Por Edward Magro

Atualizado em 9 de julho de 2025 às 21:29
Donald Trump de braços cruzados e expressão séria
O presidente dos EUA, Donald Trump – Divulgação

Donald Trump, a anomalia histórica que hoje ocupa a cadeira presidencial da maior potência militar do planeta, decidiu mirar sua retórica bravateira contra o Brasil: uma taxação de 50% sobre nossas exportações. A motivação? Nenhuma que resista a dez minutos de exame sério. Mas Trump não se guia por lógica econômica, e sim por uma lógica de espetáculo, de performatividade agressiva.

Antes de mais nada, convém recordar quem é esse personagem ancião-juvenil-mimado que, do alto de sua vomitativa laranjice, quer reger a ordem mundial. Donald J. Trump é, oficialmente, um criminoso sentenciado três vezes, em três casos distintos.

Primeiro, a condenação por falsificação de registros contábeis no caso Stormy Daniels, em que o então candidato à presidência pagou por sexo e, depois, por silêncio. Depois, o caso da jornalista E. Jean Carroll, a quem ele agrediu sexualmente e difamou em praça pública (comprou sua pena por parcos 30 milhões de reais).

E, por fim, o escândalo de fraude financeira em Nova York, no qual Trump foi condenado por inflar artificialmente o valor de seus ativos (comprou a pena por R$ 1,7 bilhão). Três crimes, três condenações, zero consequências penais. Nos EUA, a cadeia nunca alcança os muito ricos e, quando alcançados, eles trocam prisão por dinheiro, numa espécie de “compra da pena”. É vergonhoso, mas é assim que a banda toca.

Num país minimamente decente, Trump estaria atrás das grades. Mas, como os Estados Unidos são uma democracia pré-helênica, uma sociedade que confunde eleições manipuladas pelo dinheiro com escolhas cidadãs, onde eleitores confundem propaganda com verdade, o homem que personifica o colapso moral de seu tempo volta ao poder como se nada tivesse acontecido. Pior ainda, volta ressentido, vingativo, faminto por revanche contra tudo que escape à sua lógica narcísica.

A taxação de 50% sobre produtos brasileiros é apenas um destempero a mais em sua furibunda cruzada estéril. Alegadamente motivada por “desequilíbrios comerciais”, a medida ignora por completo a realidade dos números. O Brasil tem acumulado déficits consecutivos com os Estados Unidos desde 2009. Em 16 anos, nossa balança comercial com os estadunidenses gerou um rombo de quase 90 bilhões de dólares, algo em torno de meio trilhão de reais.

Somos, portanto, o paraíso terrestre para o empresariado estadunidense: compramos mais do que vendemos, e ainda por cima em dólar. No entanto, para os EUA, o Brasil não é um parceiro, nem mesmo um adversário. É um peão num jogo maior, o tabuleiro das ambições imperiais estadunidenses, manejado pelo fascista de Mar-a-Lago.

O pano de fundo da encenação grotesca é a geopolítica. Não há outra explicação. Não tentem encontrar. Não há.
Ninguém se iluda com as presenças figurativas que orbitam essa decisão. Jair Bolsonaro, por exemplo, não tem qualquer importância nesse processo. Zero.

Foto da 17ª Cúpula do Brics, no Rio
Foto da 17ª Cúpula do Brics, no Rio – Isabela Castilho/BRICS Brasil

Trump já ensaiou manobras semelhantes contra a África do Sul, a China e agora ameaça a Índia, embora esta última ainda escape, protegida por vínculos industriais que enredam os interesses ianques. O que há em comum entre essas nações? BRICS.

Mais especificamente, a ameaça simbólica e real de uma arquitetura financeira alternativa, capaz de desdolarizar fluxos comerciais e subverter décadas de hegemonia anglo-americana.

A proposta de uma moeda dos BRICS, por mais embrionária que ainda seja, causou um pânico silencioso, mas profundo, em Washington, que ficou evidente pela verborragia descontrolada de Trump, ameaçando punir países que usem a moeda dos BRICS. O dólar, afinal, é mais do que uma moeda. É a espinha dorsal de um império.

E é isso que está em jogo. Os EUA não temem o Brasil como economia. Temem o Brasil como símbolo. Um país do Sul Global, com potencial econômico gigante e robusta capacidade diplomática, que pode ser vetor de transformação num mundo multipolar. E é no campo da diplomacia que o Brasil deve reagir ativamente, com altivez e inteligência.

A resposta não está em retaliar produtos ou espernear em organismos multilaterais controlados por Washington. Está em aprofundar as alianças com o Sul Global, diversificar mercados, acelerar o debate sobre uma moeda comum dos BRICS, romper com o modelo extrativista que nos torna vulneráveis a esses truques de feira e, acima de tudo, afirmar nossa soberania.

Por óbvio, há uma questão de reciprocidade tarifária que deverá ser implementada, mas não como retaliação. Por que, então, não agir despoticamente contra um déspota?

Porque Trump é apenas sintoma, mais grotesco, é verdade, de uma ordem em declínio. Um império que precisa tarifar o mundo para manter-se de pé já não é império. É cadáver disfarçado de colosso. E cadáveres, como se sabe, não negociam. Apenas apodrecem.