
Donald Trump ataca a soberania nacional e o Poder Judiciário do Brasil para pressionar a Suprema Corte a arquivar o julgamento de Bolsonaro e outros bandidos, civis e fardados, que tentaram o golpe de Estado.
É inacreditável o presidente dos Estados Unidos no papel de gângster, chantageando nosso país com tarifas para obrigar o STF a conceder a criminosos brasileiros o mesmo indulto que ele concedeu à horda fascista que invadiu o Capitólio em 6 de janeiro de 2021 para impedir a posse do seu adversário eleito presidente.
O gesto de Trump evidencia a associação orgânica da extrema-direita estadunidense com o bolsonarismo.
Considerando esse vínculo, o episódio permite inferir que, se Trump estivesse no poder em 2022 e não Biden, as Forças Armadas brasileiras teriam recebido apoio estadunidense para avançar com o golpe.
Reportagem do jornal inglês Financial Times, de 21/6/2023, revelou que as cúpulas militares só não viraram a mesa para impedir que Lula assumisse por falta de apoio dos EUA.
O veículo detalhou “uma pressão silenciosa de um ano pelo governo dos EUA para conclamar os líderes políticos e militares do país a respeitarem e protegerem a democracia”.
Michael McKinley, ex-embaixador dos EUA no Brasil entre 2016 e 2018, uma das fontes da matéria, citou um “empenho muito incomum” que “durou quase um ano” e significou uma “campanha coordenada em várias ramificações do governo dos EUA, como os militares, a CIA, o Departamento de Estado, o Pentágono e a Casa Branca”.
O ex-subsecretário do Departamento de Estado e também ex-embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon (2009 a 2013), informou que “o esforço começou com a visita do assessor de segurança nacional de Biden, Jake Sullivan”, a Bolsonaro, em agosto de 2021.

Sullivan se convenceu de que “Bolsonaro seria totalmente capaz de manipular os resultados da eleição ou negá-los, como Donald Trump havia feito”. Em razão dessa percepção, a administração Biden decidiu aumentar a pressão sobre Bolsonaro e os militares.
A reportagem menciona que, no dia seguinte ao encontro de Bolsonaro com diplomatas estrangeiros para difamar a urna eletrônica (18/7/2022), o Departamento de Estado saiu em defesa do sistema eleitoral e das instituições brasileiras.
Uma alta autoridade brasileira afirmou à reportagem que aquele “endosso incomum” ao sistema de votação do Brasil “foi muito importante, especialmente para os militares. Eles recebem equipamentos dos EUA e fazem treinamentos lá, de modo que ter boas relações com os EUA é muito importante para os militares brasileiros. Por isso, a declaração foi um antídoto contra a intervenção militar”.
Segundo o Financial Times, em 26/7/2022, o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, advertiu os militares brasileiros sobre as consequências negativas caso perpetrassem o golpe.
A reportagem destacou ainda que a general-chefe do Comando Sul dos EUA, Laura Richardson, e o chefe da CIA, William Burns, também abordaram Bolsonaro e os militares com o mesmo propósito.
Essa intensa movimentação de agentes da administração Biden em 2021 e 2022 desencorajou setores das cúpulas militares e dividiu o Alto Comando do Exército – fator relevante para a detenção da intentona golpista.
Biden não fez isso porque os Estados Unidos respeitam a democracia e a soberania de outras nações, mas por cálculos circunstanciais e, talvez, devido à relação de Trump com Bolsonaro, que não reconheceu a eleição de Biden e celebrou o atentado ao Capitólio.
Se Trump estivesse na Casa Branca em 2022, Bolsonaro e as cúpulas militares teriam passe livre para executar o golpe e mergulhar o país numa ditadura cruenta.
É ingênuo acreditar no profissionalismo e no compromisso democrático das cúpulas partidarizadas das Forças Armadas. O ex-chefe do Estado-Maior do Exército, general Fernando José Sant’Ana Soares e Silva, contestando a ampla percepção da sociedade sobre o envolvimento institucional das Forças Armadas com o empreendimento golpista, afirmou em junho de 2023 que “nós, o Exército, nunca quisemos dar nenhum golpe”.
E complementou: “Tanto não quisemos, que não demos”. Sim, é verdade, porque desta vez faltou um Trump para que pudessem tomar de assalto o poder civil.
Originalmente publicado no Blog do J