A maior de todas as batalhas de Lula. Por Aldo Fornazieri

Atualizado em 14 de julho de 2025 às 4:39
O presidente Lula e o então presidente Jair Bolsonaro cumprimentando Donald Trump, em 2020. Fotomontagem

Por Aldo Fornazieri*

A deusa Fortuna oferece a Lula, ao governo e às esquerdas uma ocasião excepcional para sair da defensiva e passar ao ataque, impondo uma derrota política ao bolsonarismo e à extrema-direita. Oportunidades anteriores foram desperdiçadas, com o governo insistindo numa postura retraída nesses dois anos e meio de mandato.

Os sinais recentes vindos de Lula, do governo e dos partidos de esquerda são animadores. Indicam que a ocasião foi compreendida como uma chance rara. Mas esse movimento não pode ser passageiro. Exige combatividade política duradoura, combinação de força e astúcia, inteligência estratégica.

O imobilismo e uma sucessão de erros abalaram a popularidade do governo. Muitos já projetam um cenário desfavorável para as eleições de 2026. Mas os instrumentos da Fortuna — o acaso, o imprevisto — colocaram nas mãos do governo uma carta poderosa: a reação de Trump e seu tarifaço. Deixá-la escapar pode significar uma derrota irreversível.

Analistas levantam hipóteses para explicar o movimento de Trump: incômodo com o papel do Brasil nos BRICS, aproximação com a China, reposicionamento dos EUA na América Latina, irritação com o STF e tentativa de interferir no julgamento de Bolsonaro. Os dois últimos pontos aparecem de forma clara na carta divulgada por Trump, que afirma que Bolsonaro deveria estar livre para concorrer em 2026.

Foto da 17ª Cúpula do Brics, no Rio
Foto da 17ª Cúpula do Brics, no Rio – Isabela Castilho/BRICS Brasil

A justificativa do tarifaço não se apoia em argumentos econômicos ou de interesse de Estado. Segundo analistas como o economista Paul Krugman, trata-se de uma retaliação política e ideológica. Nesses termos, seria uma medida ilegal.

A carta de Trump revela que a questão central é 2026. Derrotar Lula ou quem o represente passou a ser o objetivo estratégico do trumpismo, aliado aos Bolsonaros e a Steve Bannon. Dias antes do tarifaço, Bannon antecipou que viria um ataque duro contra o governo brasileiro.

Uma vitória do bolsonarismo em 2026 atenderia a diversos interesses: enfraquecimento do papel do Brasil nos BRICS, redefinição da política regional sul-americana e alinhamento mais forte com os EUA. Além disso, daria fôlego ao movimento da extrema-direita global.

No entanto, o cálculo pode sair errado. Em países como Canadá, Austrália e México, tarifas impostas por Trump fortaleceram candidatos mais progressistas. Claudia Sheinbaum, por exemplo, ampliou sua base de apoio.

No Brasil, o governo e setores produtivos reagiram, e a manobra para impulsionar a anistia no Congresso perdeu força. O tarifaço foi lançado logo após a derrota de Lula com a derrubada do decreto do IOF — o que sugere uma ação orquestrada.

O objetivo maior do trumpismo não é apenas a eleição de 2026. O mundo vive uma transição civilizacional. De um lado, estão aqueles que defendem um mundo democrático, multilateral, cooperativo e atento à crise ambiental. Do outro, forças que querem restaurar valores autoritários, negam direitos, minimizam a emergência climática e pretendem usar a tecnologia como ferramenta de controle — um projeto de fascismo digital.

Nesse embate, Lula representa uma liderança simbólica de uma alternativa democrática e civilizatória. Derrotá-lo seria enterrar esse projeto. Seria também apagar um legado construído ao longo de décadas de combate à pobreza, à desigualdade e à fome.

A liderança de Lula permanece ativa há 30 anos. Uma derrota em 2026 não seria apenas eleitoral, mas simbólica: significaria o fracasso de um esforço histórico. Seria a despedida de uma era.

As eleições de 2002 e 2006 consolidaram um projeto. O golpe de 2016, o governo Temer e a vitória de Bolsonaro em 2018 abalaram essa trajetória. A vitória de 2022 não encerrou a ameaça da extrema-direita, que segue viva e competitiva. As eleições de 2026 serão decisivas para o rumo do país.

Por isso, mais do que nunca, Lula enfrentará a maior de todas as suas batalhas. E, diante do que está em jogo, só há um caminho: vencer.

*Aldo Fornazieri possui licenciatura em Física pela Universidade Federal de Santa Maria (1979), mestrado em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (2000) e doutorado em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (2007).