Cid presta novo depoimento nesta segunda (14) ao STF sobre a trama golpista

Atualizado em 14 de julho de 2025 às 7:42
O tenente-coronel Mauro Cid durante depoimento sobre a trama golpista no STF. Foto: Ton Molina/STF

O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), volta a ser ouvido nesta segunda-feira (13) no Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito de três ações penais relacionadas à tentativa de golpe de Estado após a eleição de 2022. O militar firmou uma delação premiada com a Polícia Federal (PF).

Cid prestará novo depoimento nos processos que tratam dos três núcleos da trama golpista, que juntos somam 23 réus: o núcleo 2, de gerenciamento de ações (6 réus); o núcleo 3, de ações coercitivas (10 réus); e o núcleo 4, de operações estratégicas de desinformação (7 réus).

Em junho deste ano, Mauro Cid foi interrogado no STF dentro da ação contra o chamado “núcleo crucial” da organização criminosa, da qual ele também é réu, junto a Bolsonaro. Ele foi o primeiro dos oito réus ouvidos na ocasião, em razão do acordo de colaboração firmado com a PF.

Cid confirmou plano de golpe

Logo no início do depoimento, Cid disse que a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a tentativa de golpe era verdadeira e afirmou: “Presenciei grande parte dos fatos, mas não participei deles”. Ele ainda negou ter sofrido qualquer tipo de pressão ou coação e confirmou o teor dos depoimentos anteriores prestados à PF.

Bolsonaro leu e alterou minuta golpista

Um dos principais trechos do depoimento de Cid diz respeito à chamada “minuta do golpe”. Segundo ele, Jair Bolsonaro recebeu, leu e pediu alterações no texto, que previa a prisão de diversas autoridades para anular o resultado das eleições.

“O documento mencionava vários ministros do STF, o presidente do Senado, o presidente da Câmara… eram várias autoridades, tanto do Judiciário quanto do Legislativo”, disse Cid, relatando que Bolsonaro “enxugou o conteúdo”, retirando ordens de prisão, mas mantendo Alexandre de Moraes como alvo.

“O documento mencionava vários ministros do STF, o presidente do Senado, o presidente da Câmara… eram várias autoridades, tanto do Judiciário quanto do Legislativo”, afirmou.

Pressão sobre ministro da Defesa

Cid também relatou que Bolsonaro pressionou o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, por um relatório crítico sobre a segurança das urnas eletrônicas.

Cid confirmou que Bolsonaro queria um documento “duro” contra o sistema eleitoral e que Nogueira chegou a cancelar uma reunião no TSE para apresentar o material, por pressão do presidente.

Para a PGR, isso integrava uma estratégia para descredibilizar o processo eleitoral e justificar uma possível intervenção.

Braga Netto foi elo com acampamentos

Cid afirmou que o general Walter Braga Netto, então vice na chapa de Bolsonaro, era o elo entre o ex-presidente e os acampamentos golpistas montados em frente aos quartéis.

Segundo Cid, Braga Netto entregou a ele uma caixa de vinho contendo dinheiro, que foi repassada ao major Rafael de Oliveira, do grupo “kids pretos”, suspeito de envolvimento em plano para assassinar autoridades, como Lula, Alckmin e Moraes.

Entrega de dinheiro em caixa de vinho

Cid reafirmou que entregou a caixa de vinho com dinheiro ao major Rafael de Oliveira, a pedido de Braga Netto. “Recebi no Palácio da Alvorada e repassei a ele”, disse. Ele afirmou não saber a quantia.

Monitoramento de Moraes

O ministro Alexandre de Moraes questionou Cid sobre o monitoramento de suas atividades. Segundo Cid, “por várias vezes, o presidente [Bolsonaro] recebia informações de que aliados estariam se encontrando com adversários”, e pediam para a Aeronáutica ou ministros verificarem.

Cid afirmou que o monitoramento foi feito pelo major Rafael de Oliveira e, depois, pelo coronel Marcelo Câmara, ex-assessor de Bolsonaro.

Plano “Punhal Verde e Amarelo”

Cid negou ter conhecimento do plano batizado de “Punhal Verde e Amarelo”, que visava matar o presidente Lula (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin e Moraes.

“Eu fiquei sabendo pela imprensa, no dia da prisão dos militares [kids pretos], inclusive, meu nome nem constava naquele gabinete de crise que foi criado, ou que seria criado”, afirmou.

Para Moraes, há elementos que comprovam que Braga Netto contribuiu — “em grau mais efetivo e de elevada importância do que se sabia anteriormente” — para o planejamento e financiamento das práticas ilegais.

Cid, ao ser questionado sobre a origem de recursos para ações, disse que seria do “pessoal do agronegócio”.

Bolsonaro queria provas de fraude

Questionado por seu advogado, Cid afirmou que “a grande preocupação do presidente, no meu ponto de vista, sempre foi encontrar uma fraude nas urnas”.

As Forças Armadas participaram da comissão de fiscalização das eleições e produziram relatório que não identificou fraudes.

Omissão nos acampamentos golpistas

Cid disse que Bolsonaro não atuou para desmobilizar os acampamentos em frente aos quartéis: “Não fui eu que chamei, não sou eu que vou mandar embora”, teria dito o ex-presidente.

Investigadores consideram que a omissão de Bolsonaro funcionou como sinal de anuência aos atos que pediam intervenção militar e rejeitavam o resultado das eleições.

Moraes alvo de memes e xingamentos

Cid também relatou que Moraes era alvo de memes, figurinhas e xingamentos em conversas entre os “kids pretos”. Questionado pelo magistrado se o nome dele foi citado nas reuniões, Cid respondeu: “Sim, senhor. O senhor foi muito criticado”.

“Só? O senhor tem que falar a verdade”, perguntou o ministro do Supremo, arrancando risos constrangidos dos presentes na Primeira Turma do STF. “Eu estou acostumado já”, brincou Moraes.

E completou: “E só uma coisa. É que a Polícia Federal não está aqui, mas há uma contradição no depoimento, porque ele [Cid] falou que era uma conversa de bar, com guaraná e salgadinho. Então, não é conversa de bar”, acrescentou Moraes.