
Acabo de assistir a um vídeo de Eduardo Bananinha em estado de possessão cívica. Olhos vermelhos, esbugalhados, órbitas saltadas, narinas enevoadamente esbranquiçadas. Nele, o herdeiro careca da familícia anuncia, entre convulsões retóricas e lampejos místicos, seu autodesterro. Num gesto de sacrifício épico, quase tiktokeano, oferece seu corpo à pátria, decidido a resgatar a democracia brasileira. Para tanto, afirma que deixará a Câmara dos Deputados e fincará pé nos Estados Unidos.
Disse ele que se entrega por um ideal superior, por uma missão revelada, ao que tudo indica, em sonho. Trata-se, possivelmente, de um daqueles sonhos que o Altíssimo envia quando está de espírito particularmente brincalhão. É como se uma entidade celestial lhe tivesse assoprado ao ouvido: “Vai, Eduardo. Exila-te. A democracia precisa de ti.”
Fiquei tocado. É muito altruísmo. Como diria um editorial do Estadão, era uma escolha muito difícil.
Deixando de lado a fanfarronice do bolsofugitivo, há algo nessa fuga que precisa ser registrado com a devida atenção. Ao contrário dos brasileiros anônimos que atravessam fronteiras em busca de trabalho honesto, Bananinha não precisará lavar pratos, tampouco fritar hambúrgueres. Foi-se o tempo em que desempenhava a função de chapeiro. Desde então, a família profissionalizou a rachadinha e a transformou em ciência orçamentária. Dinheiro, para eles, não representa obstáculo: flui em corrente constante, abundante, jorrando do ladrão com a mesma naturalidade com que brotam ofensas no Twitter do pai, que jorra. A fortuna amealhada a golpes de assessores fantasmas e lealdades tarifadas garante ao ex-deputado, e também aos seus rebentos, uma ociosidade confortável, cosmopolita e, por óbvio, blindada.
Ao homiziar-se no Texas, Bananinha apenas repete o itinerário consagrado dos delinquentes latino-americanos, como ele, em fuga. À exceção de Pinochet, que preferiu o colo fascista de Margaret Thatcher, a maioria dos oligarcas falidos, políticos autoritários, corruptos e arrivistas em desgraça opta pela Flórida. A península transformou-se, há tempos, em aterro sanitário da política continental: uma região de descarte, zona de despejo de corruptos que sonham com impunidade à sombra de palmeiras e supermercados abarrotados de alimentos ultraprocessados. Os cubanos, com seu sarcasmo refinado, utilizam a palavra gusano para designar esse tipo humano: verme. É, sem dúvida, uma ofensa, mas também uma classificação. O gusano é o traidor que foge com o cofre e, do exílio, posa de mártir. É o ressentido profissional, o parasita em luto pelo poder perdido, o oportunista que, distante, vitupera contra o país que antes saqueou. Gusano é, em suma, Bananinha.
They are threatening to issue an arrest warrant against me as well. Moraes only knows how to double down.
But he has never faced an opponent like @realDonaldTrump. Let’s see what happens – everyone who came after Trump before ended up defeated… https://t.co/cSE3HNTT4N pic.twitter.com/RUTimjXcah
— Eduardo Bolsonaro🇧🇷 (@BolsonaroSP) July 13, 2025
E, como todo gusano, ele já tem um roteiro previsível a cumprir. Em breve, fundará algo como “Movimento Internacional pela Democracia no Brasil”, com direito a logotipo, bonés patrióticos, canal no YouTube e campanhas de arrecadação em dólar e real. A fórmula é antiga, mas ainda eficaz. As vaquinhas-PIX do pai demonstraram que nunca faltam otários dispostos a financiar a ilusão de um golpe que jamais se concretiza. Para quem construiu fortuna desviando salários de assessores, extorquir patriotários não provoca qualquer constrangimento moral. Trata-se, antes, de uma demonstração de coerência doutrinária.
Com o autodesterro do bolso-gusano, o Brasil experimenta um alívio discreto, porém genuíno. Por um lado, nos livramos de um parasita legislativo cuja presença no Congresso tornava o ar mais espesso e sulfuroso. Por outro lado, ele não será preso, tampouco julgado ou punido. São ilusões das quais o sistema jurídico brasileiro já nos ensinou a abdicar. Ainda assim, consola-me o fato de que ele tenha ido. Isso já representa alguma coisa.
Melhor ainda é saber que se foi para os Estados Unidos de Donald Trump. Instalou-se em um rancho texano, armado até os dentes, cercado de lunáticos, televangelistas e imbecis que o acolherão como a um irmão de armas e alucinações. Estará entre iguais. É reconfortante imaginar que exportamos, para o coração do Império, aproximadamente oitenta quilos de lixo político não reciclável, não biodegradável, absolutamente tóxico.
De algum modo, o Brasil respira. Um verme a menos no Congresso. Um gusano a mais no aeroporto de Miami. Perdemos um pesadíssimo peso morto. O Texas, mesmo sem saber, herda um. Melhor, francamente, penso que não seria possível.