
Por Leonardo Sakamoto, no UOL
A investigação de Tiago Mali, do UOL, sobre a desigualdade no envio de recursos pelo Congresso Nacional aos municípios, deveria ser leitura obrigatória para todos os eleitores antes de decidirem seus votos em outubro do ano que vem.
Ao analisar a distribuição de R$ 106 bilhões em emendas pagas, entre 2020 e maio de 2025, ela revela que locais pobres e sem infraestrutura receberam menos por habitante do que cidades semelhantes, mas com melhor índice de desenvolvimento.
Isso mostra que a Câmara e o Senado consideram que há brasileiros que valem mais do que outros, dividindo o país entre cidadãos, que merecem investimentos, e a ralé. O que separa um de outro é sua capacidade de garantir quantidade de votos para reeleger deputados e senadores.
A investigação aponta que se um município tem um “padrinho” ou uma “madrinha” ou se um parlamentar possui um reduto eleitoral ou uma rede de contatos em determinada região, o local recebe mais recursos. Ainda mais se o estado tiver uma representatividade maior, com poucos habitantes e municípios. Se uma cidade de um estado populoso tem o azar de não fazer parte de um curral eleitoral, pode ficar às mínguas.
Emendas são importantes, claro. O problema é elas terem atingido o tamanho atual, roubando recursos de políticas baseadas em indicadores sociais e econômicos que poderiam mudar realidades regionais.
O Congresso Nacional sempre negou que parte das emendas parlamentares tivessem o objetivo puramente eleitoral, de garantir votos para a reeleição de deputados e senadores. Davam a desculpa mandrake de que se tratava de um “orçamento municipalista”, pois o parlamentar saberia mais das necessidades de seu povo do que o governo federal e, portanto, seria justo que decidisse a distribuição de recursos para a base.
A questão é que a desigualdade no envio de emendas diretamente para os municípios mostra que a Câmara e o Senado priorizam os locais que podem mantê-los em seus cargos. Lembrando que parlamentares enviam emendas para eleger prefeitos e vereadores que, depois, vão agir para reeleger os mesmos deputados e senadores. As cidades que estão fora desse esquema têm que se contentar com o básico do fundo de participação dos municípios.
O foco nas emendas reduz a possibilidade de mudanças regionais porque tudo fica atomizado, como se o Brasil fosse uma federação de municípios independentes.
E olha que estamos falando apenas da distribuição, sem tratar da questão de falta de transparência e da ausência de prestação de contas que vêm sendo questionadas pelo Supremo Tribunal Federal no escândalo do orçamento secreto. Ou mesmo do desvio de finalidade dos recursos de emendas que acabam virando coquetel de camarão em festa de político ou caixa 2 para as eleições, e está sendo alvo de operações da Polícia Federal.

Sequestrar a competência do governo federal através da diminuição de recursos para esses projetos regionais ajuda a manter cidadãos de primeira e segunda classes. Como o objetivo é a reeleição e não o desenvolvimento do país, que os não cidadãos se virem. Sim, cidadão é quem vota em mim, quem não vota, é ralé.