O legado de Eny Cezarino: relembre a história do “maior bordel do Brasil”

Atualizado em 1 de agosto de 2025 às 18:29
Fotografia das meninas que trabalhavam no bordel de Eny Cezarino, em Bauru (SP). Foto: Reprodução/’Eny e o Grande Bordel Brasileiro/Editora Planeta

Entre as décadas de 1950 e 1980, um imponente estabelecimento de 12 mil m² com letreiro neon chamava atenção na entrada de Bauru, interior de São Paulo, cidade que completa 129 anos nesta sexta-feira (1°). O Restaurante Eny’s Bar, mais conhecido como o bordel de Eny Cezarino, foi durante três décadas ponto de encontro de políticos, artistas e empresários, tornando-se uma referência nacional.

Com 40 dormitórios, duas suítes, restaurante, bar, piscina e um jardim de rosas cuidadosamente mantido pela própria Eny, o estabelecimento chegou a abrigar mais de 70 prostitutas no auge de sua fama, consideradas as mais bonitas do Brasil. Atualmente, o espaço está vazio e com as portas fechadas, guardando apenas memórias de seu período áureo.

A trajetória da cafetina começou longe dali. Nascida em 1917 em São Paulo, filha de imigrante italiano com francesa, Eny (registrada erroneamente como Emy) fugiu da família quando já tinha enxoval de casamento pronto. Passou pelo Rio de Janeiro, Porto Alegre e Paranaguá antes de chegar a Bauru, atraída pelo desenvolvimento acelerado da cidade.

“De 1950 até 1970, Bauru deu um salto de desenvolvimento tão grande que se tornou a cidade mais importante do interior do estado de São Paulo”, explicou Terezinha Santarosa Zanlochi, historiadora da USP, em entrevista ao G1. A localização estratégica, as ferrovias e o pioneirismo nas telecomunicações (com a primeira TV do interior da América Latina) transformaram Bauru em polo de negócios.

Visão aérea do bordel de Eny Cezarino, em Bauru (SP). Foto: reprodução

Eny começou trabalhando na Pensão da Dona Nair, na Rua Rio Branco, até juntar dinheiro para ter seu próprio estabelecimento. Quando as autoridades ordenaram a saída dos bordéis do centro, ela adquiriu um terreno às margens da SP-300, criando um complexo luxuoso que se tornou ponto de encontro da elite.

“Bauru aglutinava as pessoas e a Casa da Eny, na verdade, se tornou um ponto de encontro desses empreendedores, comerciantes e políticos que aqui vinham para fazer os seus negócios”, afirmou a historiadora Terezinha.

A fama de Eny extrapolou os muros do bordel. Conhecida por sua generosidade, ela fazia doações regulares de alimentos para instituições carentes e pagava enterros de mendigos. Mantinha também relações próximas com políticos, como o ex-prefeito Nicola Avallone Junior, sem nunca deixar transparecer suas preferências políticas.

As “garotas da Eny” seguiam rigorosos padrões: ficha limpa, exames médicos periódicos, vestidos sob medida e frequência ao melhor salão de beleza da cidade. A lista de clientes incluía celebridades como Vinícius de Moraes, Sérgio Reis e Elke Maravilha, além de políticos como Jânio Quadros e Paulo Maluf.

O jornalista Lucius de Mello, autor do livro “Eny e o Grande Bordel Brasileiro”, finalista do Prêmio Jabuti, dedicou dez anos pesquisando a vida da cafetina. “Ouvi aproximadamente 100 pessoas para a biografia. Acredito que fui o primeiro jornalista a biografar a história de uma puta no Brasil”, conta.

O bordel foi fechado em 1983 e vendido por 150 milhões de cruzeiros. Quando Mello visitou o local nos anos 2000, ainda encontrou resquícios do luxo de outrora: espelhos no teto, cortinas de veludo e camas redondas. Mas o que mais impressionou o escritor foram os relatos sobre Eny: “Diziam que ela era bela, charmosa e elegante. Uma mulher que fazia muita caridade… Os elogios não tinham fim”.