Falta um chefe para o bolsonarismo sem Bolsonaro. Por Moisés Mendes

Atualizado em 11 de agosto de 2025 às 23:26
O ex-presidente Jair Bolsonaro. Foto: Getty Images

Só os grandes chefes de facção, os considerados insubstituíveis, conseguem manter o controle de seus grupos agindo de dentro da cadeia, com a escolha de um representante forte que esteja em liberdade. Em prisão domiciliar e tornozelado, Bolsonaro parece ser um desses grandes chefes. Mas talvez só pareça.

Os últimos movimentos do bolsonarismo, incluindo a performance da Gangue do Esparadrapo no motim na Câmara, indicam o voluntarismo do descontrole e da falta de comando.

Figuras do segundo time do bolsonarismo assumem o que um nome de ponta não quer fazer. Tarcísio seria o líder para organizar os desorganizados, em nome do chefão imobilizado, mas está encolhido. Os miúdos trabalham pelo graúdo e fortão que se cala e se esconde.

Como governador, Tarcísio não quer e não pode levar adiante uma missão que exige adesão absoluta às bandeiras do bolsonarismo mais radical, porque precisa manter um pé fora do pântano. Sabendo que sem radicalidade hoje não há bolsonarismo.

Tarcísio ainda se vende como o extremista moderado, o unicórnio que irá construir a segunda geração do bolsonarismo, por pretender chegar ao que Bolsonaro obteve em 2018.

Espera manter a base forte e unida do eleitorado construído pelo chefe, para depois expandir o seu alcance à velha direita, à Faria Lima, à grande imprensa e ao centro que tapa o nariz.

Sem Tarcísio de líder, temos o que se viu na Câmara. Gente sem expressão nacional, mas disposta a correr riscos, tentando fidelizar o bolsonarismo que volta a gritar alto e se declarar vivo.

Não erra quem diz que os 14 deputados investigados pela corregedoria da Câmara pelo motim estavam muito mais cuidando das suas vidas do que tentando ressuscitar Bolsonaro.

Estavam amarrando laços, fidelizando bases e se fortalecendo com quem podem contar. Vale para parlamentares, governadores com a ambição de disputar a presidência em 2026 e para quem ainda não tem mandato.

É preciso fincar bandeira em mentes e territórios bolsonaristas de fé. É o que tentam fazer Caiado, Zema e Ratinho. E a partir daí imaginar o mundo como um vasto e belo centrão sem Bolsonaro.

Como fazem sempre os que pretendem suceder grandes chefes de facções, em qualquer área que envolva, como definiu o ministro Alexandre de Moraes, uma organização criminosa miliciana.

ministro Alexandre de Moraes sério
O ministro Alexandre de Moraes – Reprodução

Nesse ambiente, o bolsonarismo mais espalhafatoso e tonto se agarra ao que lhe oferecem hoje – a obediência ao comando externo da estrutura neonazista de Trump. Sem Bolsonaro, Trump é a salvação.

Sabemos qual é a capacidade de representação teatral desses subalternos que agiram na Câmara. Só saberemos mais adiante qual é a sua capacidade de destruição.

O bolsonarismo sem Bolsonaro será capaz de colocar o esparadrapo na boca de ministros do Supremo? Conseguirá blindar criminosos com mandatos e evitar que sejam alcançados pelo STF?

O extremismo mais prestativo se dedica hoje, mais do que resgatar Bolsonaro, à proteção dos que atuam individualmente ou como quadrilha no desvio de emendas e na montagem de estruturas corruptas em suas cidades. Pretendem evitar o risco de serem condenados, porque não serão nem investigados.

Esses grupos de segunda linha podem fazer pelo bolsonarismo o que Tarcísio de Freitas não consegue para reforçar aqui a ação de Eduardo Bolsonaro vinda de fora. Será deles o crédito pelo que conquistarem.

Cada avanço dessa turma, a partir do Congresso, será cobrado dos que pretendem substituir o chefe morto, e em especial de Tarcísio. E hoje Valdemar Costa Neto, Gilberto Kassab e Ciro Nogueira podem mais do que Tarcísio.

Tarcísio foge dos próprios bolsonaristas e se esconde em qualquer situação que o aproxime publicamente de Alexandre de Moraes, como fugiu nessa segunda-feira de um evento no TCE de São Paulo.

Em qualquer facção, hoje Tarcísio não seria um cara confiável. Ninguém mais é confiável no bolsonarismo. Bolsonaro só tem Michelle, os filhos e Malafaia, mas nem o diabo confia em Malafaia.

Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/