Quem é o ex-zagueiro do tri do São Paulo que admitiu mágoa pelo pouco reconhecimento

Atualizado em 13 de agosto de 2025 às 10:09
O ex-zagueiro André Dias. Foto: Reprodução

André Dias, peça-chave no tricampeonato brasileiro do São Paulo em 2006, 2007 e 2008, teve uma trajetória marcada por dificuldades, trabalho fora dos gramados e, hoje, carrega mágoa pela falta de valorização do clube paulista.

Antes de se firmar como um dos principais defensores do Tricolor, o ex-jogador chegou a largar o futebol para montar pneus em uma borracharia, voltou aos campos por insistência de um dirigente e construiu uma carreira com passagens pelo Paraná, Goiás, Lazio e pela seleção brasileira.

Aos 46 anos, vivendo em Curitiba, ele relembra conquistas, bastidores e a sensação de ser “pouco citado” na história do clube.

Início com obstáculos e trabalho fora do futebol

Natural de São Bernardo do Campo (SP), André Dias passou por frustrações em testes no São Caetano e Santo André antes de ser aprovado no Palestra, time de sua cidade natal. Sem ajuda de custo e morando a 12 km dos treinos, ia a pé para o clube.

Mesmo com bom desempenho nos Jogos Abertos do Interior, o presidente do Palestra recusou ofertas de Araçatuba, Portuguesa e Guarani.

Apesar de ter estreado como titular na Série B1 do Paulista, as dificuldades financeiras pesaram. O clube oferecia R$ 120 por mês, e ele recebeu proposta de trabalho na borracharia DPaschoal por R$ 700, com cesta básica e vale-transporte.

“O Palestra não me dava ajuda de custo, não tinha almoço e precisava treinar duas vezes por dia. Eu larguei para ir trabalhar na DPaschoal para montar pneus porque não ia dar certo no futebol. No Palestra, tinham me oferecido R$ 120 por mês, e na empresa iria ganhar R$ 700, cesta básica e vale-transporte. Eu resolvi ficar por lá mesmo”, contou à ESPN em 2021.

Pouco depois, o presidente do Palestra o reencontrou e o convenceu a voltar, prometendo regularizar a situação — promessa não cumprida.

“Ele me perguntou: ‘Ô garoto, o que você está fazendo aqui?’. Respondi: ‘Larguei o futebol’. Ele disse: ‘Está louco? Você vai voltar para ser jogador’. Retruquei: ‘Mas presidente, vocês não me dão nada. Não tenho condição de voltar’. Ele falou para eu me apresentar na segunda-feira, que iria regularizar a situação.”

“Eu tinha acabado de começar e não sabia mexer nas máquinas ainda, só montava e desmontava pneus. Estava no começo de trabalho. Quando Deus tem um propósito na nossa vida, não adianta você querer ir para outro lado”, afirmou.

“Meu pai me disse: ‘Se é o teu sonho, vai atrás’. Eles me prometeram um dinheiro e não me deram (risos). Meu treinador era o Lance, ex-jogador do Corinthians, que quis me dar uma bicicleta, mas o caminho tinha tanta subida que eu iria me cansar mais do que se fosse a pé (risos)”.

Retorno e ascensão no futebol brasileiro

Time do São Paulo em 2008. Foto: Reprodução

Após disputar um campeonato pelo Palestra, André fez testes no Paraná, jogou a Copa São Paulo e subiu ao profissional. Passou rapidamente pelo Flamengo, atuou no Paysandu e se destacou no Goiás, despertando interesse de clubes da Itália e da Turquia.

Um acordo de transferência não cumprido pelo presidente do Goiás fez com que entrasse na Justiça e recebesse convite de Milton Cruz para defender o São Paulo.

“Eu disse ao presidente do Goiás: ‘Tenho propostas de times da Itália e da Turquia. Meu sonho é jogar na Europa’. Ele falou: ‘Se você prorrogar seu contrato, no fim do campeonato te vendo para um clube’. Renovei por mais dois anos confiando na palavra dele. Só que veio um time de Portugal, e ele não quis. O Luxemburgo me ligou: ‘Ô garoto, eu quero que você venha para o Santos, mas o presidente não quer te liberar’. Eles iam pagar um dinheiro e colocar mais três jogadores na troca.”

“Eu falei para o [técnico] Geninho: ‘Eu não estou feliz. Fiz um acordo e o presidente não me liberou. Não adianta contar comigo porque a minha cabeça não está aqui’. Ele disse: ‘Você vai estragar sua carreira’. Eu entrei na Justiça contra o Goiás. Se não fosse essa história do presidente, eu não teria entrado”, contou.

Chegou ao Tricolor logo após a conquista da Libertadores e do Mundial, integrando um elenco unido, comandado por Muricy Ramalho, que conquistou o Brasileirão em 2006, 2007 e 2008.

“O time tinha acabado de ser campeão da Libertadores e do Mundial, quem não ia querer? Eu tenho um carinho muito grande pelo São Paulo não só pelas conquistas, mas pelo clima. O São Paulo era o clube número um pelas conquistas”, afirmou.

“Não tínhamos vaidade, um torcia pelo outro mesmo com diferença de salários. Muricy sabe falar a língua do jogador”, disse. A defesa de 2007, segundo ele, segue como a menos vazada da história da competição.

Mágoa pela falta de reconhecimento

Apesar das conquistas, André sente que seu nome é pouco lembrado. “Lógico que sou grato ao clube por tudo, a grande maioria das coisas que eu tenho é graças ao São Paulo, mas a minha gratidão maior é pelo torcedor, não pela diretoria, porque os caras não têm reconhecimento nenhum. Não precisam me ligar todo dia e agradecer. Mas podiam ao menos valorizar o feito que a gente fez”, desabafou em recente entrevista ao GE.

Ele afirmou que o clube e parte da torcida valorizam mais títulos da Libertadores que os brasileiros e lamenta nunca ter havido uma festa para celebrar o tricampeonato.

“Ganhamos três vezes o Brasileirão em seguida e até hoje ninguém teve uma defesa menos vazada que a de 2007. E olha quanto tempo já passou. E os caras lembram? Ok, o Miranda teve uma carreira muito mais vitoriosa, falam do Pirulito (Alex Silva), mas eu sou muito pouco citado. E sempre foi assim”, completou.

André Dias com medalha de campeão brasileiro pelo São Paulo. Foto: Marcelo Braga

Apartamento de Hernán Crespo

Em 2010, André foi vendido para a Lazio, onde jogou até 2014. Morou por dois anos e meio em um apartamento alugado de Hernán Crespo, então ex-companheiro de profissão e atual técnico do São Paulo.

“Eu estava procurando casa em Roma, e aí o Lionel Scaloni, hoje técnico da seleção argentina e que jogava comigo, me falou que o Hernán Crespo tinha uma casa para alugar. Fui dar uma olhada, gostei e fiquei na casa do Crespo por uns dois anos e meio. Era bem bonita, a casa era boa. A gente conversou algumas vezes, mas só por telefone quando tinha de resolver alguma coisa”, contou.

Lazio x Roma: André Dias revela os bastidores do dérbi mais quente da Itália - Alagoas 24 Horas: Líder em Notícias On-line de Alagoas
André Dias atuou pela Lazio em 2010. Foto: Reprodução

Vida após os gramados

Sem camisas do São Paulo penduradas em casa — doadas a amigos ou rifadas para causas beneficentes —, André guarda medalhas e prêmios individuais como lembrança de sua passagem pelo clube.

Hoje, aos 46 anos, vive em Curitiba e mantém vivo o orgulho pelo que construiu. Mesmo com a sensação de que seu papel no tricampeonato não recebeu o devido destaque, André afirma que o São Paulo foi o clube mais importante da sua carreira, embora o fim da relação com a diretoria tenha deixado marcas.

André Dias exibe seus prêmios individuais em sua casa — Foto: Marcelo Braga
André Dias exibe seus prêmios individuais em sua casa. Foto: Marcelo Braga