
A indústria farmacêutica brasileira se mobiliza para uma oportunidade rara: até 2030, cerca de 1,5 mil patentes de medicamentos vão expirar, liberando a produção de versões genéricas — ao menos 35% mais baratas — de aproximadamente 1 mil remédios usados para tratar 186 doenças, como câncer, diabetes, hipertensão e infecções. Com informações do Globo.
O movimento pode aumentar em 20% o mercado de genéricos no país, hoje com 4,6 mil produtos, segundo a Abifina (Associação Brasileira da Indústria de Química Fina).
As patentes mapeadas pertencem a 400 multinacionais farmacêuticas americanas, europeias e asiáticas, como Pfizer, AstraZeneca, Novartis, Takeda e Janssen. Com as liberações, outros laboratórios passam a poder fabricar cópias — desde que comprovem bioequivalência e eficácia — e disputar espaço com os medicamentos de referência.
Corrida de investimentos
Laboratórios nacionais intensificam planos de expansão para dominar a janela da expiração, investindo em:
- Pesquisa e desenvolvimento (P&D) de genéricos até três anos antes do fim da patente;
- Novas plantas industriais e logística — principalmente de Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs);
- Estruturação para entrada rápida junto à Anvisa após o fim da proteção.
Entre 2023 e junho deste ano, o BNDES liberou R$ 7,8 bilhões para o setor da saúde, alta de 72% em relação aos quatro anos anteriores. Somando o apoio da Finep, o volume chega a R$ 11,8 bilhões dentro da política Nova Indústria Brasil (NIB), que inclui o setor farmacêutico como prioritário.
O que dizem os laboratórios
- Aché vai investir R$ 500 milhões até 2027 na expansão de fábricas em Pernambuco, Goiás e São Paulo, para antibióticos, oncológicos e genéricos.
- Cimed destinou R$ 200 milhões à área de genéricos em 2024 e vai lançar cinco novos produtos por ano em áreas como diabetes, sistema nervoso e cardíaco.
- Teuto já tem 80 produtos aguardando liberação na Anvisa e envia cerca de 30 novos pedidos a cada ano.
- Medley investe cerca de R$ 30 milhões anuais em pesquisa e R$ 120 milhões no aumento de capacidade produtiva.
Impacto para o SUS (e para o bolso do paciente)
Com o SUS gastando R$ 20 bilhões por ano com remédios, o governo vê na nova leva de genéricos uma chance de reduzir custos entre 30% e 40%.
O Ministério da Saúde já mapeou moléculas como o eculizumabe, usado no tratamento de doença rara do sangue, que hoje custa R$ 1 bilhão ao ano aos cofres públicos. Os genéricos devem reforçar a independência de importações, ampliar o acesso e reduzir a judicialização de medicamentos caros.
Dos 20 medicamentos mais prescritos no Brasil, 15 são genéricos, e 85% dos itens do programa Farmácia Popular são da categoria.

Disputa bilionária: o caso Ozempic
Um dos alvos mais cobiçados é a semaglutida, princípio ativo do Ozempic e Wegovy (Novo Nordisk), usados para tratar diabetes e obesidade.
A patente expira em 20 de março de 2026, mas a farmacêutica tenta estender esse prazo judicialmente no STJ, alegando demora do INPI na análise da patente. O setor aguarda o desfecho com atenção: o medicamento movimenta bilhões no mundo, com a explosão da procura por remédios emagrecedores.
Desafios futuros e próximos passos
A demora histórica do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), que leva em média 4,4 anos para examinar patentes farmacêuticas, preocupa. A indústria pressiona pela aprovação, no Senado, de um projeto que dá autonomia financeira ao órgão, permitindo reduzir esse prazo para dois anos, como previsto na Nova Indústria Brasil.
Com o mercado de genéricos projetando crescimento de 10% ao ano, laboratórios, governo e financiadores se movem para que os produtos cheguem às farmácias imediatamente após o vencimento das patentes.
Nas contas da Abifina, o país vive uma “corrida do ouro farmacêutica” que pode trazer benefícios para o consumidor e para o SUS — se a indústria conseguir aproveitar a janela de inovação reversa que se abre até 2030.