
Quando Zohran Mamdani venceu de forma surpreendente, mas decisiva, as primárias democratas para prefeito de Nova York no mês passado, foi graças a uma plataforma centrada em um ponto: tornar a maior cidade dos Estados Unidos mais acessível para a classe trabalhadora.
Entre suas propostas — que incluem creche gratuita e congelamento do aluguel — a que mais chamou atenção foi a criação de uma rede de supermercados municipais, sem fins lucrativos, voltados a oferecer preços mais baixos.
Segundo Mamdani, sem despesas com aluguel ou impostos, os mercados públicos poderiam repassar economias diretamente ao consumidor. A ideia é centralizar compras e distribuição, negociar no atacado e trabalhar em parceria com os bairros para definir produtos e fornecedores.
A proposta encontrou eco: pesquisa de abril de 2025 mostrou que dois terços dos novaiorquinos apoiam a criação de supermercados municipais. O dado reflete o aumento da insatisfação com a inflação — 85% afirmaram pagar mais por alimentos em 2025 do que em 2024, e 91% se disseram preocupados com o impacto do custo da comida no orçamento.
Embora soe ousada, a ideia tem precedentes históricos. No Reino Unido, durante a Segunda Guerra, havia os “British restaurants”, que ofereciam refeições com preços tabelados. A Polônia criou os “bares de leite”, cafeterias subsidiadas. Modelos semelhantes existem hoje em países como Índia, México, Turquia e até no Brasil.
Nos Estados Unidos, o exemplo mais próximo são os mercados em bases das Forças Armadas onde famílias de militares compram alimentos de 30% a 40% mais baratos. Em 2023, esse sistema poupou US$ 1,58 bilhão às famílias.
Especialistas apontam que o sucesso depende da escala e do engajamento comunitário. Em Atlanta, por exemplo, após anos sem atrair supermercados privados, a prefeitura decidiu intervir em parceria com organizações locais para abrir um mercado no distrito mais carente.
Casos semelhantes ocorreram em pequenas cidades do Kansas e da Flórida. Outro desafio é evitar o estigma de ser um serviço “para pobres”: experiências anteriores mostram que o modelo funciona melhor quando é universal, como escolas e bibliotecas públicas.
Zohran Mamdani: As mayor, I will lower prices by making stores owned by the government pic.twitter.com/JAiBcggiiU
— End Wokeness (@EndWokeness) March 19, 2025
Mamdani propôs abrir inicialmente cinco supermercados — um em cada distrito da cidade. Analistas lembram que Nova York já compra grandes volumes de alimentos para escolas e hospitais, o que poderia ser usado para negociar preços mais baixos também para as lojas.
Adotar formatos que imitem redes bem-sucedidas, como Aldi (poucos itens, baixo custo) ou Costco (modelo de atacado), pode ser parte da solução.
Se dará certo ou não, ainda é cedo para dizer. Mas os exemplos internacionais, as tentativas em outras cidades americanas e o modelo militar indicam que supermercados públicos não são uma utopia. Como resume Margaret Mullins, pesquisadora da Universidade Vanderbilt: “O correio, as bibliotecas e as escolas públicas mostram que serviços assim podem ser parte fundamental da comunidade. Com comida, não precisa ser diferente”.