Condenação de Bolsonaro não para a extrema direita. Por Moisés Mendes

Atualizado em 1 de setembro de 2025 às 23:45
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de cabeça baixa, sério
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – Reprodução

Começa agora, antes mesmo da condenação de Bolsonaro e de seus comandados do núcleo golpista, a próxima etapa do roteiro que vai sendo ajustado às circunstâncias pelo fascismo, mesmo que aos trancos e barrancos.

E o que vem aí, quando se completam sete anos de cerco da extrema direita, pode ser mais fascismo e em estágio mais avançado. Porque se intensifica agora a obra de reconstrução do bolsonarismo sem Bolsonaro.

Mesmo que as esquerdas tentem negar, a base política que sustenta essa gente é mais forte do que o lastro político a serviço da democracia. Tem mais representação parlamentar, mais potencial de votos e mais engajamento orgânico.

O cenário só não é pior pela bravura de Alexandre de Moraes, muito mais do que do Supremo. O fascismo tem perspectiva de poder que a esquerda acha que tem, porque sonega a si mesma a verdade de que só continua viva por causa de Lula.

Eles poderão existir sem Bolsonaro e até fortalecer e renovar retórica e ação. Poderão preparar uma situação em que, por imitação do que Trump fez, consigam retornar ainda mais cruéis, violentos, odientos e efetivos.

E nós? Nós temos Lula e Moraes, mas não temos mais a vitalidade da universidade, dos professores, dos estudantes, dos sindicatos e das comunidades organizadas nas periferias.

Numa das poucas intervenções com algum fundamento sobre a situação brasileira, no Roda Viva, no mês passado, Steven Levitsky, o teórico do fim das democracias, disse que um problema sério do Brasil é o déficit de intervenção da sociedade organizada nas decisões políticas.

Levitsky disse obviedades e chutou meia dúzia de bolas fora sobre o Brasil, mas alertou que as forças da política formal, de governo ou de representação legislativa, não conseguem enfrentar sozinhas os que conspiram contra a democracia.

Steven R. Levitsky, autor do best-seller ”Como as democracias morrem”. Foto: Jon Chase/Harvard Staff

Esse é o déficit do Brasil desde o golpe contra Dilma. E a extrema direita sabe explorá-lo. As expectativas de resistência política e de poder das esquerdas dependem de Lula, como já dependeram da imposição de Moraes na condução da eleição e dependem agora no cerco aos golpistas.

As expectativas da direita contam com a força eleitoral de uma base parlamentar que só cresce, com o poder econômico urbano e do agro, com as igrejas, as milícias, com a Faria Lima, o PCC, parte da grande mídia e, se conseguirem se fortalecer de novo, com os militares.

Outra obviedade, essa dita pelo jurista Miguel Reale Júnior, em entrevista à Folha, informa que a anistia é o suporte para o projeto de impunidade do bolsonarismo e da preparação para que o golpismo prepare a sua volta.

Acenar com a anistia para Bolsonaro, como faz Tarcísio de Freitas, é transmitir confiança aos seus. O extremista moderado está dizendo que não teme prometer a anulação da condenação de Bolsonaro, se eleito presidente, por entender que a extrema direita está forte o suficiente para lidar com os riscos desse gesto.

Tarcísio mostra que erraram todos os que previram, depois da derrota na eleição e do fracasso do golpe, uma direita alquebrada, que levaria um bom tempo para se recuperar.

O fascismo não está nem um pouco desconfortável com a condenação de Bolsonaro, porque seus projetos, mesmo com divisões internas, independem da sobrevida ou da morte política do líder. E o melhor talvez seja vê-lo bem morto.

Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/