
Por Leonardo Sakamoto, no UOL
A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes, que teve forte atuação contra o PCC e também contra policiais corruptos, é mais um BO em uma sequência que representa um inferno astral para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Fontes, que estava aposentado da polícia, foi morto a tiros de fuzil após uma perseguição cinematográfica em Praia Grande, litoral paulista, na noite desta segunda (15). Se a morte do delegado tiver participação de policiais estaduais, a percepção de que há perda no comando do governo será reforçada.
Em novembro do ano passado, outro crime de grande repercussão já havia sido cometido de forma descarada em São Paulo com a execução de Vinícius Gritzbach, delator do PCC e de policiais corruptos, no terminal 2 do aeroporto de Guarulhos, uma área de segurança. Ou seja, o maior aeroporto do país e um dos maiores do mundo, principal porta de entrada para visitantes do país, que recebeu 41,3 milhões de passageiros em 2023, mostrou-se vulnerável.
Outro constrangimento para Tarcísio, que praticamente já caiu no esquecimento, é a investigação na Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo. Descobriu-se que auditores fiscais de alto escalão do Departamento de Fiscalização do órgão manipulavam processos administrativos para facilitar a quitação de créditos tributários de empresas. Em troca, recebiam mensalidades de propina.
No dia 12 de agosto, o dono e fundador da Ultrafarma, Sidney Oliveira, foi preso em uma operação do Ministério Público de São Paulo que investiga um esquema de corrupção ativa e passiva, organização criminosa, lavagem de dinheiro e propinas que movimentou mais de R$ 1 bilhão desde 2021. Outras empresas também foram envolvidas, como a Fast Shop.
A repercussão negativa foi tão grande que o próprio governo Tarcísio publicou, uma semana depois, alterações nas regras de concessão de créditos de ICMS — revogando um decreto do início da atual gestão que visava exatamente acelerar as transferências tributárias. Essa agilidade nos processos de restituição era uma das estratégias usadas pelos funcionários da Secretaria da Fazenda para cometer fraudes a favor das empresas.

Tarcísio também se meteu em um BO gigante ao defender a anistia a seu padrinho, evitando criticar a pressão do presidente Donald Trump pela interrupção do julgamento de Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado. Pelo contrário, em um duplo twist carpado, culpou o governo Lula pelo tarifaço que criou problemas a empregos e empresas de São Paulo e do Brasil.
Mas foi além. Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo, revelou que o governador chegou a telefonar para ministros do STF, a fim de propor que o tribunal devolvesse o passaporte de Bolsonaro e o liberasse para ir aos EUA negociar com Trump o fim do tarifaço. A assessoria do governador nega que ele tenha feito tal articulação.
O governador Tarcísio de Freitas e políticos bolsonaristas também vêm articulando a aprovação de uma anistia no Congresso. Sabem que o STF vai barrar a medida, pois é inconstitucional, mas defendem a posição para receber a benção eleitoral do ex-presidente. E apoio dos eleitores bolsonaristas-raiz em 2026.
Dessa forma, ele passou a atacar mais fortemente o STF às vésperas do julgamento. Chegou ao ponto de dizer, em entrevista ao jornal Diário do Grande ABC, que “hoje eu não posso falar que confio na Justiça”, por causa do julgamento de Bolsonaro. Ou seja, um governador de Estado, que precisa cumprir contratos, disse que não confia na Justiça.
Na noite desta segunda, o ex-presidente Michel Temer deu uma puxada de orelha no governador durante entrevista ao “Roda Viva”, da TV Cultura, ao chamar de “infelicidade” os ataques que ele fez a Alexandre de Moraes. No 7 de Setembro, na avenida Paulista, Tarcísio chamou o ministro do STF de “tirano”.
“Até estranhei. Mas acho que ele pode recompor”, disse Temer. Quem conhece o ex-presidente, que evita fazer essas críticas públicas, sabe que isso foi duro.
Diante do inferno astral, e da quantidade de BOs por aqui, o governador de São Paulo poderia dedicar mais do seu tempo cuidando do estado que administra e menos de Bolsonaro.