Sakamoto: PL da Anistia, que perdoa bandido, é irmão gêmeo da PEC da Blindagem

Atualizado em 20 de setembro de 2025 às 12:50
Câmara dos Deputados. Foto: Bruno Spada

Por Leonardo Sakamoto, no UOL

Chamar as coisas pelo seu nome real ajuda a compreender como elas estão inseridas no roteiro desta grande pornochanchada chamada Brasil. A partir do momento em que são condenados por organização criminosa armada e por tentar roubar a democracia, os réus podem ser chamados de criminosos, com respaldo judicial. Em suma, bandidos.

Tão ou mais bandido que deputado ou senador que desvia dinheiro de emendas parlamentares para bancar o seu coquetel de camarão na beira da piscina ou o caixa dois de sua reeleição. Pois, sob qualquer ótica que não seja míope, abolir o Estado democrático de direito é algo com consequências muito mais graves do que aquele sujeito que rouba um pacote de carne no mercado. E, depois, é espancado pelos seguranças, preso pela polícia e condenado pela Justiça. Só que o ladrão de carne vai ser sempre bandido e o que rouba emenda e democracia não aceita nada menos que doutor.

Considerando uma sociedade hipócrita que, não raro, chama sonegador bilionário de herói, faz sentido.

Chamar de golpista a turma que tentou transformar a democracia brasileira em geleia é correto do ponto de vista formal, mas não passa à população a real dimensão da encrenca. Todo mundo entende o que é um ladrão de carros, mas tentar matar a democracia é, por vezes, algo por demais abstrato. Seria melhor chamar os golpistas condenados pelo nome que realmente lhes cabe: bandidos. Não importa se ex-presidente da República, general, almirante ou deputado.

A Câmara dos Deputados resolveu deixar o tapa sexo de lado e desfilar nu diante da população brasileira ao aprovar a PEC das Prerrogativas, quer dizer, a PEC da Blindagem, quer dizer, a PEC da Bandidagem. O objetivo é poder cometer crimes e sair ileso ao garantir que outros deputados, que, potencialmente, podem cometer crimes também, decidam o destino do colega.

Bolsonaristas durante o ataque golpista de 8 de janeiro de 2023. Foto: Sérgio Lima/AFP

São duas propostas para perdoar bandido rico. “Ah, mas e a massa presa no 8 de janeiro de 2023?” Eles têm que acertar contas à Justiça pelos seus atos, mas eles foram usados naquele momento e estão sendo usados agora novamente. Se Bolsonaro tivesse que escolher entre sua anistia e a de centenas de seus seguidores, ele daria uma banana para a massa. E ainda construiria a narrativa de forma que ele esse sacrifício criará mártires do patriotismo [sobe som do hino dos Estados Unidos].

A PC da Bandidagem e o PL da Anistia são a mesma coisa. Por mais que os crimes perdoados sejam diferentes, a ideia de que há uma casta que não precisa responder por seus crimes, protegida pelo Poder Legislativo, é a mesma.

E pouco importa que, agora, estão tentando rebatizar o segundo projeto de PL da Dosimetria, pois, no plenário da Câmara, a extrema direita precisa de maioria simples para mudar o que o relator apontou e abrir uma brecha para Jair.

Ninguém aqui é uma marmota, claro que sabemos todos que há dinâmicas diferentes envolvidas nos dois projetos. E que boa parte do centrão não é a favor de golpe de Estado. Mas isso é irrelevante: a partir do momento em que vota para perdoar bandido que tentou golpe de Estado, passa a ser conivente e cúmplice.

No final, o Supremo Tribunal Federal vai vetar uma anistia inconstitucional, mas o tumulto gerado por essa turma erode ainda mais as instituições da República.

Nem tudo está perdoado ou pode ser justificado em nome da articulação, da composição, da governabilidade. A História vai lembrar disso. E, antes dela, os eleitores.