
Portugal vive um endurecimento sem precedentes em sua política migratória, o que tem provocado medo e insegurança entre brasileiros que vivem no país. A demora da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (Aima) para renovar documentos e a atuação da nova polícia especializada em estrangeiros, criada em agosto, têm levado a detenções e deportações. Em um dos casos recentes, uma brasileira foi separada do marido e dos filhos pequenos e enviada de volta ao Brasil por ainda não ter recebido a autorização de residência.
A Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras (Unef), formada por 1.200 agentes, ganhou poderes para abordar imigrantes em ruas e transportes públicos, exigindo documentos. Quem não consegue comprovar regularidade pode ser detido e enviado ao Centro de Instalação Temporária do Porto, que tem apenas 41 vagas. O governo anunciou a construção de dois novos centros, em Lisboa e no norte do país, que devem comportar até 300 pessoas.
O discurso oficial é de que “acabou a política de portas escancaradas”, nas palavras do ministro da Presidência, António Leitão Amaro. O endurecimento ganhou força após a aprovação do chamado pacote anti-imigração, que aumentou o tempo de residência exigido para cidadania, restringiu vistos de trabalho a profissionais altamente qualificados e eliminou a possibilidade de regularização após chegada ao território português.
Brasileiros, que formam a maior comunidade estrangeira em Portugal — mais de 513 mil pessoas —, relatam dificuldades práticas no dia a dia. A arquiteta paulista Amanda Turchetto, que vive no país desde 2019, perdeu a validade da autorização de residência em julho e teme não conseguir manter a conta bancária ativa. “Agora não consigo comprar uma televisão em três vezes na loja”, disse ao UOL, em comparação com a facilidade que teve anos atrás para abrir conta e comprar imóvel.

Advogados e entidades de apoio a imigrantes denunciam uma mudança de postura tanto do Estado quanto da sociedade portuguesa. “É uma caça às bruxas. Nunca vi ostensividade igual”, disse a advogada Catarina Zuccaro, que atua na defesa de estrangeiros. O Itamaraty informou que o tema será tratado em reunião bilateral no próximo dia 30 de setembro, em Lisboa, e recomenda que brasileiros portem sempre documentos atualizados e comprovantes de vínculos com o país.
Pesquisas recentes apontam aumento da hostilidade social. Segundo levantamento da Fundação Francisco Manuel dos Santos, 51% dos portugueses consideram os imigrantes uma ameaça aos valores do país, e mais da metade defende a redução do número de brasileiros. O governo português, por sua vez, justifica a rigidez dizendo que herdou mais de 400 mil processos de regularização pendentes e que precisa retomar o “controle do sistema migratório”.