O peão do Alegrete e os fascistas fantasiados de gaúcho. Por Moisés Mendes

Atualizado em 23 de setembro de 2025 às 12:45
Pessoas conversando. Foto: Divulgação

Nada é pior para quem escreve do que ter de explicar o que escreveu. Mas vou explicar. Escrevi na semana passada que nunca antes se viu tanto fascista fantasiado de gaúcho como no 20 de setembro em Porto Alegre.

Alguns entenderam ou fingiram que entenderam que eu havia chamado todos os pilchados de fascistas. Não foram poucos os que pensaram assim. Entenderam errado. Esse gaúcho aí da foto, por exemplo, é um genuíno gaúcho do Alegrete.

Então, esclarecendo o que não precisaria ser esclarecido, o que escrevi é que muitos fascistas, alguns desconfortáveis com a pilcha, apareceram fantasiados de gaúcho na chamada data farroupilha.

Esse ano foi mais do que o normal, porque eles tentam afirmar posições extremistas misturadas a essa ideia de gauchismo bélico exaltada por certos gauchistas.

Vou repetir então: nunca vi tantos fascistas de bota e bombacha, alguns de lenço encarnado, que certamente vestiram por descuido, porque lenço de fascista, segundo eles, nunca deveria ser vermelho.

O que não significa que figuras urbanas não podem usar indumentárias que as identifiquem com o ser gaúcho. Não é disso que se trata.

No mais, o que está sempre presente nessas controvérsias falsas ou verdadeiras é a confusão entre identidade, tradição e conservadorismo, que já foi abordada tantas vezes pelo historiador Tau Golin. Quem quiser saber mais, que procure nas livrarias virtuais seu livro ‘Identidade’, da Méritos Editora.

Ofereço aqui uma prova:

“A primeira característica dominante de uma identidade “tradicional”-folclórica em uma sociedade moderna é a diluição da noção de tempo histórico. Cria-se o “tempo vago”, ao qual se remete a origem de seus elementos. Ao se instituir como movimento cultural organizado, essa gauchidade se apresenta como se estivesse credenciada a reproduzir valores pretensamente imutáveis forjados pelos antepassados. Melhor dizendo, há uma reelaboração do passado como o lugar de uma sociedade tradicional. Entretanto, historicamente, a sociedade de tipo tradicional nunca existiu no Rio Grande do Sul. Desde a sua origem ocupacional organizada pelo Estado Colonial Absolutista no século XVIII, na região sulina foi implantada uma sociedade de classes de tipo escravista alicerçada na propriedade privada. Desse modo, jamais se configurou uma sociedade historicamente tradicional. Esta é uma suposição criativa intelectual de legitimação da sociedade oligárquica, em um primeiro momento, e do capitalismo gauchesco de corte latifundiário em sua forma mais acabada. A sociedade rio-grandense (e sua representação cultural) é conservadora e não tradicional”.

Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/