
O plano do motim de agosto na Câmara dos Deputados era considerado tão perfeito quanto o da ocupação dos três poderes no 8 de janeiro. A política brasileira iria produzir mais uma obra de arte.
O primeiro impacto seria provocado pelo caos, como o planejado na invasão de Brasília. A invasão da capital, sem grandes líderes em terra, foi comandada por Fátima de Tubarão.
O motim que levaria à anistia de Bolsonaro e à aprovação da PEC da Bandidagem seria liderado pelos deputados Coronel Zucco, Marcel van Hattem, Zé Trovão e Sóstenes Cavalcante.

Ali naquele dia 6 de agosto, com Hugo Motta imobilizado pelos amotinados, a linha de frente da extrema direita no Congresso avançou, mas logo depois iria ver seus homens tombando.
Foi depois daquela cena que o fascismo começou a se abalar e Tarcísio de Freitas ficou sem saber se avança ou se recua. E ninguém sabe dizer direito hoje que tamanho tem o bolsonarismo. Mas a certeza é a de que se abateu.
O motim tinha um plano genial. Na reação às derrotas acumuladas na política e no Judiciário, os revoltados finalmente eliminariam as diferenças que ainda restavam entre a velha direita e a nova extrema direita.
Com Bolsonaro doente e politicamente morto e com os militares contidos, Câmara e Senado precisavam reagir. Alguém gritou eureka, e Van Hattem saltou e sentou-se na cadeira de Motta, no gesto que deveria ficar para a história.
A cadeira de Motta era o cavalo branco de Van Hattem. Chegara a hora de não só acordar e fidelizar a base fascista, mas de fazer com que o velho coronelismo do centrão e as novas milícias golpistas se misturassem em nome do bem maior, a proteção de todos diante dos avanços do Supremo.
A direita que ainda pretendia ser apenas direita, o centrão, o bolsonarismo, tudo seria a mesma coisa. Assim eles dobraram Motta, fizeram com que as pautas da bandidagem e da anistia avançassem e comemoraram a vitória na batalha seguinte. A PEC que os protegia foi aprovada na Câmara.
Mas a classe média decidiu voltar às ruas, o Senado se assustou, a PEC foi derrubada na câmara alta e o sentimento hoje é de que o avanço com o motim teve mais perdas do que conquista de terreno.
O bolsonarismo pode até conseguir a anistia com o disfarce de dosimetria para Bolsonaro. Mas nada mais será como antes, diante da pergunta que eles mesmos fazem em voz baixa: qual é o tamanho do fascismo hoje?
Que não se meça apenas o tamanho da atual força parlamentar, mas dessa força com perspectiva eleitoral. Qual será o tamanho da extrema direita na eleição de 2026, considerando-se não só a disputa para a presidência, mas principalmente para o Congresso?
Os danos do motim de agosto, combinados com os desatinos de Eduardo Bolsonaro e de Trump, o vacilo de Tarcísio, os negócios da Faria Lima com o PCC e a certeza de que as tropas do bolsonarismo estão abaladas – tudo isso cria um cenário de incógnitas.
Um dos principais resultados do motim é que a velha direita parece tentar se desconectar da orientação de rumo dada pelo que restava de bolsonarismo. Já não sabem o que Tarcísio significa e se tem coragem para seguir em frente.
Não sabem o que será de todos eles com Bolsonaro preso e sem um nome que enfrente Lula. Mas sabem que a Polícia Federal está avançando em todas as frentes.
Ficaram sabendo que Flávio Dino não se submete a ameaças. E que ainda falta saber o que 26 réus do golpe têm a dizer, depois da condenação de oito integrantes do núcleo crucial.
Os líderes do motim voltariam a provocar as ruas? Teriam coragem, depois de terem ajudado a desfazer a química que vinha unindo Valdemar Costa Neto, Bolsonaro, Gilberto Kassab, Sóstenes, Ciro Nogueira e Malafaia?
Ainda são os mesmos os interesses de quem apenas está enredado nas emendas e os criminosos que pretendiam misturar centrão, milícias e PCC dentro do Congresso?
Podem ser, mas são interesses que estão mais confusos e diluídos. O motim esculhambou o fascismo da prosperidade.