
A onda de falsificação de bebidas com metanol no Brasil poderia ter sido evitada se houvesse maior controle sobre o destino das garrafas de vidro. Especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo apontam que a circulação dessas embalagens é o ponto-chave para criminosos conseguirem vender produtos adulterados.
Segundo Lucien Belmonte, presidente da Abvidro, não faltam leis que regulamentem a reciclagem de vidro. O problema é a fiscalização quase inexistente. Ele explica que bares, restaurantes e hotéis, responsáveis por até 60% do consumo de destilados, entregam as garrafas vazias a funcionários sem controle sobre o destino.
Essas embalagens acabam entrando em um comércio paralelo. Enquanto uma garrafa em cooperativas de catadores vale menos de R$ 1, no mercado clandestino ela pode ser vendida por até R$ 200, dependendo da marca. Há até anúncios em sites de venda online, facilitando o acesso dos falsificadores.
Empresários do setor de reciclagem defendem medidas mais rígidas, como ocorre com pneus no Brasil e com garrafas na Alemanha. Por lá, o consumidor paga um depósito no ato da compra e recebe o valor de volta ao devolver a embalagem em máquinas instaladas em mercados, o que garante rastreabilidade.

No Brasil, a coleta de vidro está concentrada em cerca de 700 cooperativas, responsáveis por encaminhar o material a empresas como a Massfix. Em 2023, o país reciclou 320 mil toneladas de vidro, apenas 30% do consumo nacional, um índice considerado baixo.
Para especialistas, seria necessária uma mudança estrutural que obrigasse bares e restaurantes a comprovar a destinação de 100% das garrafas adquiridas. A ideia é reduzir a dependência de catadores e integrar empresas especializadas na logística reversa.
Enquanto isso, donos de bares relatam improviso e insegurança. Um comerciante de São Paulo contou que chegou a quebrar garrafas antes do descarte para evitar que caíssem em mãos erradas. Mesmo assim, descobriu que falsificadores aproveitavam os cacos.