
O voo que levaria o presidente Lula (PT) e sua comitiva à Ilha do Marajó, no Pará, precisou ser interrompido na quinta-feira (2) após um problema técnico no avião da Força Aérea Brasileira (FAB). O episódio é o terceiro em menos de um ano envolvendo aeronaves usadas pelo presidente e reforça o alerta sobre o sucateamento da frota militar e a falta de recursos para manutenção. Com informações do Globo.
Em entrevista a uma emissora local, Lula relatou que o grupo teve de descer às pressas da aeronave por risco de incêndio.
“Ao embarcar para a Ilha do Marajó, teve um problema no motor do avião Casa, da FAB. Tenho que agradecer a Deus porque poderia ter acontecido quando eu estivesse no ar. Ainda em terra, tivemos que descer do avião com medo de o avião pegar fogo”, disse o presidente.
Na sexta-feira (3), Lula e a primeira-dama Janja estiveram na Basílica de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém, para agradecer “por ter se livrado de decolar e nos manter em solo, em segurança”.
Orçamento insuficiente e frota envelhecida
O caso reacendeu críticas sobre o baixo orçamento do Ministério da Defesa, que hoje representa 1,06% do PIB — abaixo dos 1,27% registrados em 2021. Do total de R$ 133 bilhões previstos para 2024, mais de 80% são destinados a gastos com pessoal, enquanto menos de 10% vão para manutenção e custeio.
O ministro da Defesa, José Múcio, tem defendido a PEC 55, que estabelece um investimento mínimo de 2% do PIB para o setor. Em audiência no Senado, ele foi direto: “Temos bastante equipamento, mas não temos dinheiro para combustível. Não temos dinheiro para comprar peças. Falta combustível, falta peça, falta munição.”
Militares ouvidos afirmam que o adiamento de manutenções preventivas tem se tornado rotina por falta de recursos, atingindo inclusive aviões de carga e transporte usados em missões oficiais.
O avião do incidente
A aeronave que apresentou o defeito era um C-105 Amazonas, modelo turboélice bimotor fabricado pela Airbus Defence, em operação na FAB desde 2006. No Brasil, é usada em missões de transporte de carga, passageiros e resgate.
Segundo o Palácio do Planalto, o avião “não integra a frota presidencial”, mas foi escolhido por ser adequado às condições da pista de Breves, no arquipélago do Marajó.

Com a falha, Lula embarcou em um C-97 Brasília, de menor porte e com menos da metade da capacidade de passageiros do C-105. O modelo, fabricado pela Embraer, é usado pela FAB desde 1987 e passou por atualizações de aviônicos nos últimos anos.
Histórico de falhas e desgaste da frota
Em um ano, Lula enfrentou três problemas diferentes em aeronaves da FAB. Em outubro de 2024, uma pane no avião presidencial VC-1 (Airbus A319CJ) o deixou cinco horas em voo de espera na Cidade do México antes de um pouso de emergência.
O episódio levou o governo a discutir a compra de um novo avião, apelidado internamente de “substituto do AeroLula”, mas o plano foi adiado por causa do ajuste fiscal.
Em março de 2025, outro contratempo: o avião presidencial precisou arremeter ao tentar pousar no aeroporto de Sorocaba (SP) por conta de ventos fortes, segundo a Secretaria de Comunicação Social. O episódio foi considerado normal pela aviação, mas somou-se ao histórico de contratempos.
“Do Sucatão ao AeroLula”
Entre militares, o episódio em Belém reacendeu lembranças do incêndio em um KC-137 da FAB em Porto Príncipe, no Haiti, em 2013 — o antigo “Sucatão”, que já integrou a frota presidencial.
Um técnico da área de manutenção explicou que, nas Forças Armadas, nem sempre os protocolos de manutenção seguem à risca as exigências dos fabricantes.
Na aviação civil, aviões com mais de 15 anos costumam ser substituídos por modelos mais novos e econômicos, mas nas Forças Armadas as aeronaves seguem em uso por décadas, mesmo com o custo crescente de manutenção.
“Se a manutenção preventiva for bem feita, as aeronaves podem operar normalmente por décadas”, afirmou o especialista.
O caso reforça a preocupação com o envelhecimento da frota militar brasileira, que, segundo o próprio ministro da Defesa, é menor que a do Chile, apesar de o Brasil ter um território 11 vezes maior.