
O ministro Luís Roberto Barroso, que anunciou sua aposentadoria antecipada do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira (9), decidiu se afastar da vida pública por alguns dias em um retiro espiritual com o grupo indiano Brahma Kumaris.
Barroso disse a amigos que não tem planos imediatos e que aproveitará o período para reflexão e meditação. O local do retiro será mantido em sigilo por motivos de privacidade, mas o ministro confirmou que será fora da Índia, conforme informações da Folha de S.Paulo. Ele faz retiros espirituais anuais.
O que é a Brahma Kumaris?
Fundada em 1937, na Índia, por Lekhraj Kripalani, conhecido como Brahma Baba, a Brahma Kumaris é um movimento espiritual com liderança feminina — algo inédito na época. Os bens do fundador foram entregues a um grupo de oito mulheres que passaram a administrar a organização, princípio que se mantém até hoje.
A principal prática do grupo é a meditação Raja Yoga, que busca o equilíbrio entre o mundo interno e externo e o relaxamento mental.

Segundo o site oficial, os estudos da Brahma Kumaris envolvem quatro áreas centrais: conhecimento espiritual sobre alma, Deus e karma; assimilação consciente de virtudes; prática da meditação Raja Yoga; e compromisso de servir espiritualmente outras pessoas, promovendo autonomia e propósito de vida.
Atualmente, a Brahma Kumaris afirma ter mais de um milhão de membros em 8 mil centros distribuídos por 110 países. A sede espiritual fica em Mount Abu, na Índia, e há escritórios em cidades como Londres, Nova York, Moscou e Nairóbi.
No Brasil, o movimento chegou em 1979, trazido pelo professor australiano Ken O’Donnell, e hoje tem centros em várias cidades. A sede principal, chamada Lighthouse (“Farol”, em tradução livre), fica no bairro de Perdizes, em São Paulo, e já recebeu líderes internacionais do grupo.
Reconhecimento internacional
A Brahma Kumaris tem status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social da ONU (Ecosoc) e mantém vínculos com o Unicef e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
A organização participa de debates sobre mudanças climáticas, igualdade de gênero e direitos humanos, sendo reconhecida por sua atuação em pautas de desenvolvimento sustentável e espiritualidade aplicada à vida pública.
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Denúncias
Apesar do reconhecimento global, a Brahma Kumaris enfrenta denúncias de abusos sexuais, manipulação psicológica e lavagem cerebral.
Em 2013, uma mulher denunciou ter sido estuprada pelo coordenador da filial da Brahma Kumaris em Patna, Índia. Os abusos, segundo ela, começaram com assédio e evoluíram para relações forçadas, resultando até em aborto confirmado por laudo médico. A polícia indiana prendeu quatro suspeitos, mas a instituição negou que fossem membros oficiais, dizendo que já haviam sido afastados por má conduta.
Outro caso foi registrado em 2020, na Malásia, quando uma devota de 26 anos afirmou ter sido violentada por um guru da organização. A jovem, que vivia em um albergue da Brahma Kumaris desde os sete anos, relatou abusos constantes e omissão por parte de superiores.
Em redes sociais, há também centenas de relatos de manipulação psicológica e abandono familiar. Um dos depoimentos mais fortes é de uma ex-membro que viveu em Mount Abu entre 2011 e 2024, relatando um “relacionamento abusivo disfarçado de espiritualidade”.
Ela afirmou que era submetida a controle mental e que os alimentos sagrados (prasad) seriam adulterados com drogas dissociativas, como quetamina e benzodiazepínicos, para induzir submissão e dependência emocional.
Outros ex-integrantes denunciaram que o grupo encobriu abusos sexuais, suicídios, corrupção financeira e casamentos forçados de jovens.
O caso das irmãs Brahma Kumari
Em 2023, a polícia de Agra prendeu três pessoas após o suicídio de duas irmãs que viviam no ashram da Brahma Kumaris em Jagner, distrito de Agra. As vítimas, Shikha (32) e Ekta (38), deixaram uma carta de três páginas endereçada ao chefe de governo de Uttar Pradesh, Yogi Adityanath, denunciando uma suposta fraude financeira e exploração sexual dentro da instituição.
Segundo o documento, membros do grupo — entre eles Neeraj Singhal, Tarachand, Guddan e Poonam — teriam desviado cerca de 25 lakh de rúpias (cerca de R$ 150 mil) de doações feitas por fiéis, inclusive 7 lakh das próprias vítimas, para comprar apartamentos particulares.
As irmãs também denunciaram a exploração sexual de mulheres e o acobertamento de outros suicídios. Elas pediam que os acusados recebessem prisão perpétua “como Asaram Bapu”, um guru indiano condenado por estupro. Após o caso, a polícia prendeu três envolvidos e afirmou buscar o principal suspeito, Neeraj.
O então diretor de relações públicas da Brahma Kumaris, BK Karuna, declarou que o grupo ficou “chocado” com o caso, alegou desconhecer os fatos e informou que abriria uma investigação interna.