
Em 2025, o embaixador estadunidense Richard Grenell se consolidou como uma das figuras mais influentes e controversas da política externa do governo Donald Trump. Conhecido por sua abordagem direta e por frases provocativas, como a dita ao podcast Self Centered, “Se quiser evitar guerras, você deve ter um filho da puta como secretário de Estado”, Grenell se tornou peça-chave em negociações internacionais que envolveram países estratégicos da América Latina, entre eles o Brasil. O comentário, feito em tom de autoelogio, refletia o estilo pragmático e agressivo com que o diplomata defende os interesses dos Estados Unidos.
Sem ocupar um cargo formal no governo, Grenell atua como “enviado presidencial para missões especiais”, segundo Mariana Sanches, do UOL, uma função híbrida criada por Trump para missões sensíveis fora dos canais diplomáticos tradicionais.
Foi nesse papel que ele liderou, em 2024 e 2025, uma série de encontros reservados com o chanceler Mauro Vieira e o assessor especial Celso Amorim, contribuindo para destravar uma crise diplomática inédita entre o Brasil e os Estados Unidos. O republicano agiu com autorização direta de Trump, mas à revelia do secretário de Estado Marco Rubio, e ajudou a preparar o encontro entre Trump e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, em setembro.

A aproximação representou uma guinada na relação entre os dois países. Até então, os EUA haviam imposto sanções severas ao Brasil: um tarifaço de 50% sobre exportações, restrições de vistos a dezenas de autoridades e medidas financeiras contra o ministro Alexandre de Moraes, motivadas por pressões de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Segundo fontes diplomáticas, Grenell operou nos bastidores para convencer Trump de que o endurecimento havia se tornado contraproducente. Ele também articulou, junto a empresários e representantes das big techs, uma nova fase de “cooperação pragmática” entre as duas nações.
A habilidade de Grenell em mediar crises já havia sido testada meses antes, quando negociou com o presidente venezuelano Nicolás Maduro a libertação de cidadãos estadunidenses presos no país. O episódio rendeu-lhe críticas de setores republicanos que o acusaram de ser “conivente com ditaduras”, mas consolidou sua imagem como negociador eficaz.
“Mais vale trazer os nossos de volta e garantir petróleo barato do que defender a democracia em outro país”, teria dito, em conversas privadas, sobre o episódio. Sua visão é alinhada ao lema trumpista “América First”: resultados concretos antes de princípios diplomáticos.
No caso brasileiro, Grenell conduziu pelo menos quatro conversas secretas com representantes do Itamaraty. O primeiro contato ocorreu em setembro de 2024, no Rio de Janeiro, em um encontro discreto com Mauro Vieira, revelado dias depois pela imprensa.
O diplomata aproveitou a viagem para reforçar a interlocução direta com Amorim, responsável pela assessoria internacional de Lula, e garantir que Trump tinha “interesse genuíno em reabrir o diálogo”. O resultado foi o abraço inesperado entre Lula e Trump nos bastidores da ONU, gesto que simbolizou o fim de meses de tensão política e econômica.
Grenell também tratou de temas sensíveis, como a regulação de plataformas digitais no Brasil. Em reunião com Vieira e seu chefe de gabinete, Ricardo Monteiro, ele expressou a preocupação da Casa Branca com o bloqueio da rede Rumble, parceira da Truth Social, plataforma de Trump.
O Itamaraty esclareceu que a operação da empresa seria liberada desde que cumprisse a legislação brasileira, o mesmo modelo aplicado à rede X, de Elon Musk. Após o encontro, Grenell comunicou a Trump que “o Brasil estava aberto para fazer negócios”.
A relação entre os dois países começou a melhorar rapidamente. Dez dias depois, Lula e Trump conversaram por telefone, e o presidente estadunidense anunciou: “Vamos começar a fazer negócios com o Brasil”. A frase marcou o início de uma nova fase bilateral, confirmada dias depois em nova reunião entre Vieira e Rubio, já em tom conciliatório. O encontro, considerado “positivo” por ambas as partes, resultou no agendamento de uma rodada de negociações comerciais em Washington.

Richard Grenell, hoje com 58 anos, é diplomata de carreira e foi o primeiro homem abertamente gay a ocupar altos cargos na administração republicana. Apesar das tensões entre Trump e movimentos de diversidade, ele se tornou uma figura simbólica na política externa estadunidense.
Crítico do establishment de Washington, Grenell se define como um “negociador livre de dogmas”. Sua trajetória inclui passagens pela Alemanha, Sérvia e ONU, além de papéis estratégicos em campanhas republicanas desde George W. Bush.
Agora, com a reaproximação entre Brasil e Estados Unidos consolidada, aliados de Trump dizem que Grenell voltará a atuar nas sombras, como costuma fazer. Um assessor da Casa Branca o descreveu como “a mão invisível” por trás de algumas das maiores reviravoltas diplomáticas do governo.
Para o próprio Grenell, como confidenciou a um colega de gabinete, o sucesso da missão no Brasil já basta: “Não é sobre discursos, é sobre resultados”.