
Aparecida (SP), conhecida por abrigar o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida e ser o maior destino de romarias católicas do país, vive uma transformação religiosa. Dados do Censo 2022 revelam que a cidade registrou queda de quase nove pontos percentuais na proporção de católicos, passando de 85,9% em 2010 para 77% da população. Enquanto isso, o número de evangélicos subiu de 11,4% para 18%, acompanhando a tendência nacional de crescimento das igrejas pentecostais.
Em números absolutos, o município passou de 26,2 mil para 22,1 mil moradores que se declaram católicos. Já os evangélicos saltaram de 3.481 para 5.175. A prefeitura estima a existência de pelo menos nove templos formalmente registrados, número que pode chegar a 20 considerando congregações sem registro. A mudança reflete um fenômeno observado em todo o Brasil, mas ganha peso simbólico por ocorrer na cidade considerada o coração da fé católica nacional.
Pastor há mais de duas décadas, Paulo Cesar Torres, da Igreja Nova Vida, atribui o crescimento evangélico à proximidade das lideranças religiosas com os fiéis. “O pastor é muito próximo das necessidades primárias do cidadão comum. Se precisa de remédio, oração ou cesta básica, bate na nossa porta”, afirmou à Folha. Ele afirma manter boa convivência com padres e até organiza ações de apoio a romeiros durante o feriado da padroeira.

O movimento é semelhante ao observado em outras regiões do país. Segundo o coordenador da pós-graduação em Ciência da Religião da PUC-Minas, Rodrigo Coppe Caldeira, o avanço das igrejas evangélicas se explica pela capilaridade e pela flexibilidade de seus espaços. “São locais acessíveis e que respondem rapidamente a questões cotidianas, como cura e crises familiares”, explica.
Caldeira lembra que o catolicismo ainda mantém forte presença cultural, com festas, romarias e devoções que seguem vivas mesmo entre ex-católicos. Muitos evangélicos, afirma, preservam hábitos devocionais ligados à tradição católica, como ouvir orações e músicas religiosas. Essa mistura de práticas, diz o pesquisador, mostra que a transição religiosa brasileira é mais complexa do que uma simples substituição de crenças.
Para o pastor Paulo, o diálogo entre religiões é essencial. “Não tem briga, não estamos numa Faixa de Gaza”, disse. “Nosso papel é contribuir com o bem-estar comum.” A fala resume um cenário em que o catolicismo continua dominante em Aparecida, mas agora divide espaço com uma comunidade evangélica crescente, que ganha visibilidade e influência em uma das cidades mais simbólicas da fé cristã no Brasil.